GUERRA DO PARAGUAI
I – Primeira parte: a intervenção brasileira no Uruguai
Ao
se tornar independente, em 1822, o Brasil herdou da antiga metrópole a política
de intervenção nos assuntos internos dos países da região do Prata. A primeira
foi durante a Guerra da Cisplatina (1825-1828), quando se deu a independência
do Uruguai, até então pertencente ao Brasil – era chamada de Província
Cisplatina (Cisplatina significa “do lado de cá do Rio da Prata”). A segunda
intervenção se deu novamente nos anos 1851 e 1852, para combater o presidente
Manuel Oribe e seu aliado, Juan Manuel Rosas, governador de Buenos Aires. Ambos foram derrotados por uma coalizão de forças de que o Brasil fez parte , na batalha de Monte Caseros. A
partir de então o governo de D. Pedro II, imperador do Brasil, procurou manter-se
neutro em relação aos problemas internos dos vizinhos platinos.
Pintura reproduzindo a batalha de Monte Caseros - fevereiro de 1852 |
Passados
12 anos, entretanto, uma trama de intrigas e desacertos levou o governo
brasileiro a romper a neutralidade e imiscuir-se novamente no Uruguai. Essa
intervenção constituiu-se no estopim da Guerra do Paraguai, que se prolongou do
final de 1864 até 1º. de março de 1870. Uma guerra longa, portanto, que exigiu
do Brasil e dos demais protagonistas o máximo de seus recursos.
Em
1864, o Uruguai era presidido por Atanásio Aguirre, do partido Blanco, que tinha como adversário
Venâcio Flores, chefe do partido Colorado.
Os dois travavam uma renhida luta pelo controle do poder no país. Nessa luta,
envolveram-se numerosos brasileiros que eram proprietários de terra naquele
país e simpatizavam com a causa dos colorados.
Muitos combatiam nas fileiras de Flores e, em consequência, sofriam represálias
dos blancos.
No
início daquele ano, veio ao Rio de Janeiro o general Antônio de Souza Neto,
fazendeiro gaúcho, veterano de muitas guerras e aliado dos colorados uruguaios. Ele trazia uma lista de reclamações dos
brasileiros afetados pela luta no país vizinho, e cobrou providências do
governo brasileiro. Tal foi o apoio que receberam suas queixas na corte (sede
do governo imperial no Rio de Janeiro), que a resposta do governo não se fez
esperar. Imediatamente, enviou ao Uruguai, em missão especial, o experiente
político José Antônio Saraiva, levando aquele que era “o nosso último apelo amigável”, dirigido ao governo uruguaio. O “último apelo” continha pesadas
exigências, entre elas o pagamento dos prejuízos reclamados pelos brasileiros e
a punição dos responsáveis pelas violências. Se as exigências não fossem
atendidas, o Brasil iniciaria imediatamente represálias contra o governo
daquele país.
O
enviado brasileiro chegou a Montevidéu no dia 6 de maio de 1864, apresentando
em seguida suas credenciais ao governo de Aguirre. Mas, escreveu ele mais tarde,
“depois de estudar a situação política da
República Oriental [Uruguai] e reconhecer
que não podia o seu governo, na permanência da guerra civil, satisfazer as
reclamações brasileiras”, preferiu transformar sua missão de guerra em uma
missão conciliadora. Em correspondência ao governo brasileiro, datada de 18 de
maio, ele escreveu “[...] a paz é a única
saída que ao governo oriental se oferece para dominar suas dificuldades internas
e reabilitar-se para resolver as suas questões internacionais.”
Saraiva
não era o único a pensar assim. Coincidentemente, com a mesma intenção dele,
haviam chegado a Montevidéu o ministro das Relações Exteriores da Argentina,
Rufino Elizalde, e o embaixador inglês na Argentina, Edward Thornton. A
intervenção desses diplomatas, aos quais se juntou o uruguaio Andrés Lamas,
tornou possível um princípio de acordo entre Aguirre e Flores, o qual todavia
não se consolidou, e no dia 7 de julho os negociadores deram sua missão por
encerrada.
Saraiva,
então, deixou Montevidéu e partiu para Buenos Aires, à espera de novas
instruções do governo brasileiro. No Rio de Janeiro, continuava prevalecendo a ideia
de exigir do governo uruguaio a satisfação das reclamações formuladas inicialmente.
Efetivamente,
o governo imperial orientou Saraiva a entregar a Aguirre o ultimato brasileiro
e dar um prazo para o atendimento delas. Finalmente, no dia 14 de agosto,
Saraiva entregou ao governo uruguaio, com três meses de atraso, o ultimato que
devia ter apresentado em maio.
Aguirre,
provavelmente confiando no apoio de Solano López, presidente do Paraguai,
negou-se a aceitar as exigências brasileiras, alegando que aquele era um
documento indigno de permanecer nos arquivos de sua nação. Diante disso,
Saraiva ordenou o início das hostilidades contra o Uruguai. Essa atitude
colocava o Brasil e a Argentina no mesmo barco, pois o governo de Buenos Aires,
presidido por Bartolomeu Mitre, já vinha apoiando, embora não oficialmente, o
líder colorado Venâncio Flores. Essa
concordância de interesses permitiu o entendimento entre Saraiva e Mitre para
agirem de comum acordo em relação ao governo de Montevidéu. Poucos dias depois,
no começo de setembro, Saraiva deixou a missão diplomática de que fora
incumbido no Prata e retornou ao Rio de Janeiro.
Barão de Tamandaré |
Com
a partida de Saraiva, os interesses brasileiros ficaram a cargo do comandante das
forças navais brasileiras no Prata, o vice-almirante barão de Tamandaré (Joaquim
Marques Lisboa). A partir desse momento, foi ele o executor das represálias
contra o governo de Aguirre, agindo em conjunto com flores, com quem assinou um
acordo de cooperação. A armada de Tamandaré tomou o porto de Salto e assediou o
porto de Paissandu, ambos no rio Uruguai. Em dezembro, entraram em território
oriental as tropas comandadas pelo general João Propício Mena Barreto, que
colaboraram na tomada de Paissandu. Em seguidas, forças de terra e mar sitiaram
Montevidéu. A partir desse momento, a causa de Aguirre estava perdida.
Nessa
mesma ocasião (dezembro de 1864), chegava à capital argentina José da Silva
Paranhos (futuro visconde de Rio Branco), o novo encarregado de dirigir os interesses
diplomáticos do Brasil no Prata. Simultaneamente, Aguirre deixou o poder em
Montevidéu, sendo substituído pelo presidente do Senado. Com este negociou
Paranhos um acordo de paz, que permitiu uma solução pacífica para o conflito:
as forças aliadas entraram em Montevidéu sem violência; o poder foi entregue a
Venâncio Flores e este concordou em atender as exigências brasileiras. Com
isso, o Uruguai deixou de ser inimigo do Brasil para se tornar aliado, justamente
quando começava um novo conflito, muito mais grave – a guerra contra
Francisco Solano López, presidente do Paraguai.
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