É COISA DO DIABO!
Minha primeira
experiência com a religião
Eu estudei numa escolinha rural
até o terceiro ano. Era uma construção de madeira com apenas duas salas,
separadas por um espaço de circulação. Numa delas estudavam os alunos do
primeiro ano. Na outra, os do segundo e do terceiro,
juntos.
Não entrei na escola aos sete anos
como todas as crianças, mas sim quando já tinha oito anos, e nunca entendi por
que isso aconteceu. A única explicação que me ocorre é que me achavam muito
burrinho e precisava esperar um pouquinho mais. Mas, uma vez matriculado, não
fiz feio. Passei fácil pelo primeiro ano e no segundo passei em primeiro lugar.
Até ganhei da professora um livro, “Mowgli, o menino lobo”, o primeiro que li
na vida. E no terceiro ano passei em segundo lugar. Não fiquei em primeiro
porque estava com o braço direito engessado e tive de fazer provas orais, e a
professora achou um jeito de me tirar uns pontos.
Quando passei para o quarto ano,
fui obrigado a me transferir para o Grupo Escolar, que ficava na cidade.
Estranhei muito a nova escola; era enorme, com muitos alunos e tinha práticas
bem diferentes.
Uma dessas práticas é que na
quarta-feira a classe toda tinha de ir à Igreja. Eu podia não ter ido, pois
minha família nem era católica. Meu pai não ligava a mínima para religião, e
minha mãe tinha um pé no espiritismo. Mas fui, e foi a primeira vez que entrei
numa igreja.
Na primeira semana, correu tudo
bem, embora eu não tenha lembrança de nada que tenha ocorrido ou do que me
tenha sido ensinado. Mas na segunda semana, tudo foi diferente. Fomos recebidos
pelo frei Henrique, tido como um sacerdote muito severo. Ah, amigos, que sorte
vocês tiveram por não ter de enfrentar o frei Henrique! Era uma figura
assustadora: sanguíneo, gordo e totalmente coberto por uma batina vermelha, e
falava com um forte sotaque estrangeiro, talvez alemão.
Para começar ele chamou um de nós
para ir até a presença dele. E chamou justamente o menino que estava sentado ao
meu lado. Uma vez lá na frente, o frei ordenou: “faça o sinal da cruz!”. Mas aí
aconteceu uma coisa muito estranha: em vez de fazer o que o padre pediu, o
menino teve uma crise incontrolável de riso - talvez por nervosismo, talvez por
ignorância. O frei ficou muito brabo, mas tão brabo, que deu uma bofetada na
cara do garoto! O pobrezinho rodopiou e só não caiu por que era um menino muito
forte.
O frei, então, perguntou qual era
a religião da família dele. O menino respondeu que era espírita. Bem, aí o frei
ficou realmente possesso. Parecia que ia explodir. Ele falou que para os
espíritas o sinal da cruz era o sinal do diabo! E fez outras acusações
terríveis contra os espíritas.
Imaginai, amigos, a minha
situação. Se o padre tivesse me chamado é provável que também tivesse levado um
bofetão, pois também não saberia fazer o sinal da cruz. De tanto medo, me
enterrei na carteira e procurei ficar invisível para que o padre não me
chamasse. Felizmente, ele não me chamou e escapei do vexame. Nunca mais voltei
à igreja, a não ser como turista quando já era adulto.
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