WATERLOO
O Epílogo da Era Napoleônica
O texto a seguir
descreve a atmosfera política na França logo após a volta de
Napoleão de seu
exílio em 1815. Um país dividido e cansado é preparado para uma nova guerra por
uma liderança — Napoleão — que pretendia representar
a nação e unificar todas
as vontades.
Ainda que vista por
todos como um flagelo, a guerra que assomava tinha a utilidade de unir um país
dividido atrás de Napoleão, ao mesmo tempo que lhe permitia impor-se a seus
aliados políticos e a seus numerosos adversários domésticos. Os conflitos
internos franceses eram tão grandes e tão óbvios nesse período que o Duque de
Wellington pôde expressar para um compatriota a seguinte esperança: “Mesmo sem a ajuda dos aliados, o poder [de
Napoleão] não durará muito”. O imperador nunca enfrentara um desafio maior.
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Após fugir da Ilha de Elba, Napoleão retorna à França, recebe
grande apoio e retoma o
poder, mas nele permanece
por apenas "Cem Dias".
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Foi preciso sacudir o gigante francês para reanimá-lo, mobilizá-lo à força de
pancadas. Foi preciso exorcizar a lassidão, o attentisme, o medo e a
divisão civil e cuidar da defesa militar do país. Exércitos, dinheiro e
espíritos tiveram de ser levantados, mas embora os recursos da França em
dinheiro, sangue e espírito fossem infindáveis, a nação passou a se sentir
prostrada, deprimida e exangue depois que o entusiasmo pelo retorno da “Águia”
[Napoleão Bonaparte — Nota do autor] se dissipou. Costuma-se enfatizar a
tristeza, o derrotismo, a fadiga e os acessos esporádicos de torpor de Napoleão
nos Cem Dias (ao rememorá--los, ele mesmo o confessaria), mas na verdade ele se
mostrou, com a costumeira eficiência, à altura do desafio, não se deixando
abalar pela consciência da exiguidade de suas chances de sucesso. A façanha do
imperador e de seu governo na primavera de 1815 foi, mais uma vez, prodigiosa.
O instrumento da
estratégia política de Napoleão foi a própria “cruzada nacional” que mobilizou,
muito pouco e muito tarde, na primavera de 1814. A força do “discurso nacional”
é que ao mesmo tempo que parece ser um chamado à unidade, designa também — e
com grande eficiência — inimigos internos (bem como, é claro, estrangeiros). O
sagrado apelo revolucionário a “la patrie en danger” emergiu, então, na
forma de súplica: “Todos os franceses
devem se unir para evitar a guerra civil e repelir o estrangeiro”, deixando
de lado todas as lealdades e considerações que não a “nacional” — não deve
haver nenhuma política, nenhum partido, nenhuma opinião, simplesmente “nós”
contra “eles”, onde “eles” incluía não apenas os aliados mas os franceses
monarquistas, jacobinos não alinhados e padres refratários.
Englund, Steven. Napoleão: uma biografia política.
Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005. p. 475-6.
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