O IMPÉRIO INCA
As razões do expansionismo
Inicialmente, ao chegar à região de Cuzco,
os incas ingressaram
numa aliança de tribos que viviam ali – a
confederação cuzquenha.
Posteriormente, dominaram a confederação e
deram início à formação do
Império. Veja a seguir os motivos da
expansão inca.
"Em menos de um século, a
confederação cuzquenha [de Cuzco] liderada pelos incas chegou a fundar o mais
vasto império da América pré-colombiana. [...] Ele se estendia do norte para o
sul, segundo o eixo das cordilheiras, sobre mais de 4 mil quilômetros [...].
A população compreendida nos
limites do Império tem sido objeto de estimativas vagas e contraditórias,
fundadas em bases ainda incertas, mas é duvidoso que tivesse ultrapassado 10
milhões de habitantes às vésperas da chegada dos europeus. Compunha-se de uma
centena de grupos étnicos de importância desigual, que se diferenciavam uns dos
outros pela língua e pela cultura. Por mais ligadas que tivessem sido por uma
“contradição” forjada no alvorecer de sua história, [...] essas etnias
reagrupadas pelos incas não constituíam mais que um conjunto político
notoriamente heterodoxo.
Que imperiosa necessidade
impulsionava Cuzco a reunir em torno de si tantas terras e tantos povos? Que
significava essa sede de conquistas? Os incas justificavam seu imperialismo
aproximadamente nos mesmos termos em que os espanhóis procurariam legitimar o
seu. Diziam-se investidos de uma missão civilizadora junto às populações dos
Andes que ainda estavam mergulhadas na barbárie. [...] e iriam ensinar-lhes as
relações de parentesco, o cultivo do milho e a arte de viver em paz que
distinguia o “civilizado” do “bárbaro”.
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Cidade sagrada de Machu Picchu.
Construída no alto
de uma montanha a 2400 m de altitude. Foi o norte-americano
Hiram Bingham quem a descobriu,
em 1911.
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Aparentemente, nada predispunha
Cuzco a cumprir essa missão [...]. Vistos através de nossos atuais
conhecimentos sobre sua cultura, os incas não parecem um povo excepcionalmente
agressivo. Diversamente de seus contemporâneos astecas no México central, que
cercavam a guerra de um verdadeiro culto, os incas não parecem ter exaltado em
demasia as funções militares. Nos textos revelados no século XVI por Cristobal
de Molina [um padre que viveu em Cuzco], a guerra é designada como um flagelo e
a paz, como o bem supremo concedido pela benevolência dos deuses. É verdade que
essa paz resultava de combates e se instaurava em consequência de episódios
sangrentos e atos de real ferocidade. [...]
A vocação imperialista dos incas
originou-se do sucesso que obtiveram nas guerras que lhes foram largamente
impostas pelas populações circundantes. A inesperada vitória de Pachakuti sobre
os invasores chanka rompera o precário equilíbrio político dos Andes. De um
lado, essa vitória colocara Cuzco em
posição hegemônica. De outro lado, porém, devia também cristalizar contra tal
hegemonia a hostilidade das etnias vizinhas que se julgavam ameaçadas e cujas
sucessivas derrotas só fariam ampliar cada vez mais o poder cuzquenho.
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Os construtores incas tinham grande habilidade no manejo das pedas para fazer edificações que estão de pé ainda hoje |
Toda conquista provocava, assim,
uma nova guerra que desembocava em outras conquistas. Os incas jamais escaparam
dessa engrenagem na qual sua feroz resistência à invasão chanka os fizera
entrar. Pois, à medida que seu Estado se expandia, a guerra externa se fazia
cada vez mais necessária à estabilidade da ordem interna – ela se tornaria, de
fato, a mola principal do regime. Como toda paz imperial, a paz inca implicava
um estado de tensão permanente nas fronteiras que mantinha a unidade das partes
constitutivas do Império e as fazia aceitar a supremacia de Cuzco. [...]
Desse modo, a guerra de conquista
constituía um fator essencial de integração e de mobilidade social dentro do
Império. Ela representava o projeto coletivo que confederava os povos vencidos
e subjugados. A realização de tal projeto era bastante lucrativa para tornar
tangível aos olhos destes últimos as vantagens da dependência em que seriam
mantidos. [...]
É provável que se tenha formado
logo um “partido da guerra” através do qual os chefes das etnias subjugadas – mais ainda
que os próprios membros da tribo inca – pressionassem continuamente o poder central
para se engajar em novas conquistas militares, pois isso lhes dariam ocasião de
melhorar seu status.
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Nestas plataformas construídas nas encostas das montanhas, os agricultores cultivavam feijão, milho, abóbora, pimenta, quinoa, amendorim, batata, frutas como o molle e papaia. |
Por outro
lado, as transferências de riqueza engendradas pela expansão do Império
incitavam grande número de pequenas etnias, conscientes de seu isolamento e de
sua frágil capacidade de defesa, a se colocarem deliberadamente na órbita de
Cuzco. Foi assim que os Chincha, um povo da costa meridional, se associaram aos
incas, não só para evitarem, mais cedo ou mais tarde, sofrer as consequências
de uma invasão como também para poderem participar dos benefícios do empreendimento
imperial inca. Segundo o testemunho de chefes Chincha, os soberanos incas
frequentemente se esforçavam para convencer as populações periféricas de que o
Império era o único quadro político possível, e comprovavam por meio de
presentes suntuosos as vantagens que estas teriam em se incorporar a ele."
Favre,
Henri. A civilização inca. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 2004. p. 24-7.
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