REVOLUÇÃO FRANCESA
No século
XVIII, a economia
francesa se conservava predominantemente agrícola e estima-se que 80% da
população do país vivia no campo. Isso não impediu que a França vivesse um longo
período de ande prosperidade.
A
prosperidade, porém, chegou ao fim por volta de 1778, quando uma crise começou
a tornar evidente a precariedade da organização administrativa, política, financeira,
econômica e social do país.
Enfim,
ficou claro que a França encontrava-se em um impasse decorrente de tudo o que
constituía o Antigo Regime representado pela monarquia absolutista de direito
divino, governada pela dinastia dos Bourbon.
Desde
1774, a França era governada por Luís XVI. Distante dos interesses da maioria
da população, que vivia na miséria, o rei governava o país de longe, do Palácio
de Versalhes, nos arredores de Paris. Para sustentar o luxo de sua corte –
formada por numeroso séquito de nobres ociosos –, Luís XVI dependia dos
tributos pagos pela população mais pobre. Para essa camada menos favorecida, a
situação era insustentável e a insatisfação, crescente.
A
desorganização do governo era total. Proliferavam leis e instituições diversas
em várias províncias, as contas do rei se confundiam com as contas do governo e
constantes déficits eram provocados por gastos excessivos.
1. As
desigualdades
As
desigualdades sociais e políticas tinham como causa um conjunto de fatores.
Primeiro, a sociedade estava dividida em três estados: o clero, a nobreza e o
povo.
Os
dois primeiros estados ainda mantinham vários privilégios do que sobreviveram
do sistema feudal, como o direito de cobrar impostos. Além disso, eram isentos
do pagamento de diversos tributos, ao contrário do que ocorria com o povo, que
não possuía direito algum.
Outro
fator que aprofundava as diferenças era a grande dificuldade de romper com a
economia agrária e de implementar o desenvolvimento industrial no país.
Essa
situação causava enorme descontentamento à maioria da população, que formava o
terceiro estado. Desse estamento também fazia parte a burguesia (formada por
comerciantes, banqueiros, industriais), que enriquecera na época da
prosperidade. Tendo consciência de sua força, a burguesia passou a lutar por
mudanças que lhe permitissem exercer maior controle sobre o governo e o Estado.
As
dificuldades do país intensificaram-se a partir de 1785, em razão de problemas
que podem ser considerados as causas imediatas da revolução.
O
primeiro deles foi a falência financeira do governo, principalmente depois dos
gastos realizados com a participação francesa na guerra de independência das
Treze Colônias inglesas da América do Norte. Outro aspecto que acabou agravando
a situação foi o tratado de comércio estabelecido com a Inglaterra, em 1786. A
medida favorecia a importação de manufaturados, o que provocou o fechamento de
empresas francesas, gerando uma onda de desemprego.
Além
disso, um rigoroso inverno prejudicou as colheitas de 1788, causando escassez
de alimentos e alta de preços. A população, que já enfrentava sérias
dificuldades de subsistência, não tinha como comprar pão, produto que
constituía a base da alimentação. Faminta e revoltada, estava prestes a se
sublevar.
Tentativas de reformas
Algumas tentativas de reformas foram feitas
pelos ministros de Luís XVI para alterar esse estado de coisas. Vejamos os
principais entre eles:
Jacques Turgot era um economista
fisiocrata que procurou controlar as finanças cortando gastos públicos e
propondo a redução de privilégios da nobreza e do clero. Suas medidas, porém,
atraíram contra si a ira desses setores e ele acabou demitido.
Jacques Necker, banqueiro,
influenciado pelos filósofos iluministas, deu continuidade ao processo
reformista. Embora menos radical que Turgot, o ministro Necker, na tentativa de
sanear as dívidas do Estado francês, colecionou inúmeros desafetos e também foi
demitido pelo rei Luís XVI.
Charles de Calonne, nomeado ministro em
1781 e afastado do cargo, em 1787, após levar a público a relação das despesas
da corte, que escandalizou e agitou a população.
Jacques Necker foi chamado de volta
para o cargo. Diante da gravidade da crise, Necker convenceu Luís XVI a
convocar a Assembleia dos Estados Gerais, ou seja, a reunião dos representantes
dos três estados (clero, nobreza e povo), o que não acontecia desde 1614.
O
terceiro estado
No período imediatamente anterior à
revolução, circulou entre os franceses um folheto escrito pelo abade Sieyés, que,
embora do clero, era simpatizante do terceiro estado e acabou participando das
grandes decisões de 1789. No folheto, assim Sieyés sintetizou os anseios e a
importância desse grupo social:
“O que é o terceiro estado? Tudo. O que ele
tem sido na política francesa até hoje? Nada. O que pede ele? Tornar-se alguma
coisa.”
2. Antes
da tempestade
Os
Estados Gerais reuniram-se no Palácio de Versalhes em maio de 1789. O terceiro
estado era representado em sua maioria por burgueses. De imediato, porém,
surgiu o problema de como se fariam as votações. Isso porque, de acordo com a
tradição, cada estado tinha direito a um voto.
Se
as votações continuassem a ser feitas dessa forma, o clero e a nobreza votariam
juntos e nada mudaria – ainda que alguns nobres e clérigos apoiassem as
reformas.
O
que fez toda a diferença, entretanto, foi que o terceiro estado teve o número
de representantes duplicado por imposição de Necker e acatado pela nobreza.
Sendo a maioria, exigiu que a votação fosse realizada por representantes, e não
por estado. Mesmo assim, as discussões se arrastaram por um mês, e não se
chegou a acordo algum.
Foi
então que o terceiro estado decidiu separar-se dos Estados Gerais e
proclamar-se Assembleia Nacional, com o objetivo de extinguir os privilégios da
nobreza e do clero e dar à França uma Constituição conforme os ideais do
Iluminismo.
Luís
XVI tentou impedir a iniciativa, proibindo o encontro. Mesmo assim, os
representantes se reuniram e, por fim, os outros dois estados se aliaram ao
terceiro estado para formar a assembleia nacional Constituinte. O
terceiro estado havia triunfado.
3. O
início da revolução
Enquanto
a Assembleia estava reunida, uma agitação crescente tomava conta das ruas. Luís
XVI, temeroso da revolta popular, concentrou tropas às portas de Paris e de
Versalhes.
A
população, por sua vez, procurava se armar a fim de defender a Assembleia
Nacional Constituinte de uma possível agressão. Nesse clima, começaram a
ocorrer os primeiros conflitos nas ruas de Paris. A revolução tinha começado.
Em
14 de julho de 1789, uma grande massa popular tomou de assalto a Bastilha, uma
fortaleza utilizada como depósito e presídio, em busca de armas e munição. A
Bastilha era um símbolo da opressão, pois em seu interior ficavam trancafiados
os prisioneiros políticos.
A
revolução espalhou-se por todo o país. Os sangrentos episódios que se seguiram
forçaram o rei a retirar as tropas, mostraram a força da população e levaram à
formação de um conselho de cidadãos para administrar Paris. Conduziram,
finalmente, à organização de um corpo de voluntários armados que se intitulou Guarda
nacional, cuja chefia foi entregue ao marquês La Fayette, o mesmo que havia
lutado pela independência nas Treze Colônias inglesas da América do Norte.
As
mudanças estavam em curso. Numerosos nobres começaram a deixar a França,
temendo as represálias dos revolucionários. Refugiados nos países vizinhos,
procuravam convencer os governantes europeus do perigo que o movimento
revolucionário francês representava para as demais monarquias absolutistas da
Europa.
Na
França, as antigas estruturas começaram a ser alteradas pela ação dos
revolucionários.
Na
reunião de 4 de agosto de 1789, a Assembleia Nacional Constituinte decidiu
extinguir todo o ordenamento jurídico do Antigo Regime. Isso levou a nobreza e
o clero a perder muitos de seus privilégios, por exemplo, o de não pagarem
impostos.
Inspirada
nos ideais iluministas, nesse mesmo ano foi proclamada a declaração dos
direitos do Homem e do Cidadão.
Em
1790, com a aprovação da Constituição Civil do Clero, os bens da Igreja
foram confiscados e os membros do clero passaram a ser funcionários do governo.
Ainda
em 1791, passou a vigorar a nova Constituição, que transformava a França
em monarquia constitucional e a reorganizava, de acordo com a teoria da tríplice
divisão dos poderes do Estado.
A fuga do rei
Percebendo que a situação ficava cada vez
mais difícil para a monarquia, o rei Luís XVI tentou fugir da França. Pretendia
juntar-se a simpatizantes na Áustria, que se preparavam para invadir a França.
Na noite de 20 de junho de 1791, disfarçado de criado, deixou o palácio ao lado
da família. Infelizmente, para ele, a tentativa fracassou. Foi reconhecido na
cocheira de uma localidade ao parar para a troca de cavalos. Foi dado o alarme.
Na noite seguinte, quando sua carruagem encontrava-se em Varennes, na divisa
com a Áustria, o rei foi impedido de seguir viagem.
Luís XVI foi obrigado a voltar a Paris. A
partir desse momento, o monarca foi ficando cada vez mais desmoralizado e
passou a ser mantido sob vigilância.
4. O
rei e a revolução
Apesar
da tentativa de fuga, o rei continuou no governo, embora fosse tratado como
prisioneiro. Em setembro, o rei aceitou a Constituição Francesa, mesmo porque
não tinha alternativa.
Segundo
a Constituição, os novos deputados seriam eleitos pelo voto censitário (segundo
a renda de cada um) e eles constituiriam a Assembleia Legislativa, ou seja, o
Poder Legislativo. Por sua vez, o Poder Executivo ficou nas mãos do rei,
responsável pela nomeação dos ministros. O terceiro poder – o Judiciário – foi
formado por juízes eleitos.
Vários
problemas, entretanto, já ameaçavam a estabilidade do novo governo. Em certas
regiões, o clero insuflava os camponeses contra a revolução.
Em
abril de 1792, o governo francês, receando que os exilados organizassem a contrarrevolução,
declarou guerra à Áustria e à Prússia, países que abrigavam a maioria desses
refugiados.
Os
austríacos, com o apoio da Prússia, iniciaram a invasão da França. A Assembleia
Legislativa, então, convocou todos os franceses a pegar em armas e defender o
país.
5. A
revolução radicaliza
A
partir de então, as ações revolucionárias tornaram-se mais radicais. Luís XVI
foi considerado suspeito de traição com base em correspondência que ele tinha
trocado com os invasores. Teve seus poderes suspensos pela Assembleia e foi
recolhido prisioneiro. Foram convocadas eleições para uma nova assembleia, que
adotou o nome de Convenção – dessa vez, os deputados foram eleitos por
sufrágio universal masculino, isto é, os homens puderam voltar, sem exigência
de renda.
Na
Convenção, os grupos políticos ficariam assim posicionados: do lado direito da
sala de sessões, sentavam-se os girondinos, políticos moderados que
defendiam uma República liberal que garantisse a propriedade privada; do lado esquerdo,
ficavam os deputados mais radicais, que lutavam por uma República democrática e
igualitária – entre estes, destacavam-se os jacobinos (liderados por
Maximilien Robespierre) e os cordeliers (chefiados por Georges Danton e Jean-Paul
Marat). No meio dos dois grupos, sentavam- se os centristas (também
chamados de
pântano), políticos indecisos que votavam ora com os girondinos, ora
com os jacobinos.
Jacobinos e Girondinos
Com a Queda da Bastilha, surgiram em Paris
inúmeros clubes revolucionários. Parte desses clubes reunia-se no convento dos
monges jacobinos. Daí se originou a expressão “clube dos jacobinos” para
designar um dos grupos mais radicais da Convenção.
O termo “girondino”, por sua vez, era
aplicado inicialmente a alguns deputados eleitos pela província de Gironda,
localizada no sudoeste da França. Depois, a palavra passou a ser empregada para
designar um grupo político mais amplo, que incluía a burguesia.
6. A
época do Terror
A
Convenção tomou posse no mesmo dia em que os franceses venceram os exércitos
austríaco e prussiano e detiveram a invasão do território. Seu primeiro ato foi
a proclamação da República, seguido da adoção de um novo calendário e de uma
nova contagem do tempo: o ano de 1792 passava a ser considerado o Ano I da
Revolução. Com isso, os revolucionários queriam marcar o início de um novo tempo,
diferente do passado.
Os
partidos se reorganizaram. A direita continuava sendo representada pelos
girondinos, grupo mais conservador e identificado com os interesses da alta
burguesia.
A
esquerda seguia reunindo os jacobinos e outros grupos políticos radicais,
representando a pequena burguesia e os sans-culottes – pessoas
pertencentes às camadas populares. Ambas as tendências eram republicanas e
revolucionárias, mas os jacobinos pregavam a radicalização e queriam aprofundar
as mudanças revolucionárias.
Confirmadas
as suspeitas de traição de Luís XVI, ele foi condenado à morte e guilhotinado em
janeiro de 1793. Sua execução só fez aumentar a oposição interna e externa ao
regime revolucionário e levou à formação da Primeira Coalizão contra a
França, na qual Áustria, Prússia, Inglaterra, Rússia, Espanha e Portugal
investiam contra a revolução.
Diante
de tantas dificuldades, a Convenção teve de tomar medidas mais duras. Convocou
a população para a defesa do país e instituiu a Lei dos suspeitos, pela
qual qualquer pessoa denunciada como contrarrevolucionária podia ser condenada à
guilhotina.
A cada dia aumentavam as divergências entre
girondinos e jacobinos sobre o encaminhamento da revolução. Em junho de 1793,
os jacobinos, o grupo mais forte da Convenção, fizeram uma demonstração de
força: com o apoio de aproximadamente 80 mil homens e sessenta canhões, obrigaram
a Convenção a decretar a prisão dos principais líderes girondinos. A partir
desse momento, os jacobinos instalaram a ditadura na França e estabeleceram o
regime do Terror.
7. Sob
a tirania de Robespierre
À
frente desse movimento estava o jacobino Robespierre, que levou ao extremo os
ideais de Rousseau. Para se fortalecer, a Convenção reuniu um grupo de
ferrenhos defensores da revolução e formou o Comitê de salvação Pública,
que tinha como atribuições cuidar da administração do país e promover a defesa
externa. O novo órgão era dirigido por Robespierre.
Após
se voltar contra os girondinos, Robespierre perseguiu os mais exaltados e os
políticos moderados, como o ex-aliado Danton, condenado por ele à morte na
guilhotina. Com essa política radical, Robespierre acabou perdendo o apoio de
setores importantes para manter seu poder. Em julho de 1794, foi destituído e,
a exemplo de muitos de seus adversários, também morreu na guilhotina. O Terror ameaçava
tantas pessoas que não foi difícil formar-se uma aliança dos oposicionistas ao
regime.
Com
a queda de Robespierre, os girondinos voltaram ao poder e deram início à Reação
Termidoriana, como ficou conhecida a perseguição aos jacobinos. O retorno dos
girondinos significava a retomada de um caráter mais moderado no processo
revolucionário. Em 1795, a Convenção finalmente concluiu a nova Constituição,
conhecida como Constituição do Ano III, por ser o terceiro ano no novo
calendário criado pela Convenção.
8. O
Diretório (1795-1799)
Com
a nova Constituição, o país passou a ser governado pelo diretório,
controlado pelos girondinos.
Entre
os principais acontecimentos dessa fase, destacam-se o cancelamento de muitas das
medidas aprovadas no tempo da Convenção, como o sufrágio universal masculino; a
continuidade da guerra contra diversos países, liderados pela Inglaterra; e o
agravamento da crise interna, em virtude da desorganização da economia, da inflação
e da corrupção por parte de setores do governo.
Em
meio a essa crise generalizada, os líderes burgueses recorreram a Napoleão
Bonaparte, na época um general de prestígio. Apoiado pelo exército e pela
burguesia, Bonaparte deu um golpe de Estado contra o Diretório e assumiu o
poder.
Esse
fato, conhecido como Golpe do 18 Brumário de 1799, assinala o início de
uma nova etapa da Revolução Francesa, na qual seus princípios se expandiriam
por toda a Europa e várias regiões do mundo.
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