GRANDES
NAVEGAÇÕES
De
forma geral, podemos dizer que os europeus foram impelidos a empreender as
Grandes Navegações por duas razões econômicas: as necessidades de expandir o
comércio e de obter grandes quantidades de metais preciosos.
Entretanto,
nem só de causas econômicas se faz a história. Havia também naquelas
circunstâncias uma confluência de outros estímulos: ambições pessoais, espírito
de aventura e fervor religioso. Na Península Ibérica, por exemplo,
disseminou-se a ideia de que, uma vez expulsos os muçulmanos do território,
seria preciso propagar a fé cristã por todas as regiões do mundo.
Reunidos
esses anseios, o Estado moderno, com sua monarquia fortalecida e seu território
unificado, surgiu como instrumento capaz de concretizá-los. Graças ao apoio da
burguesia, aos impostos cobrados da população e aos empréstimos contraídos
junto aos banqueiros, o rei pôde reunir o capital necessário para financiar as
viagens marítimas.
O Atlântico como
solução
O
comércio, tendo ressurgido na Europa a partir do século XI, vinha crescendo
rapidamente, estimulado em grande parte pela reabertura do Mar Mediterrâneo e
pelo restabelecimento dos contatos com o Oriente após as Cruzadas. Esse
crescimento, interrompido em virtude da crise do século XIV, foi retomado em
seguida, com mais vigor ainda.
No
início do século XV, era intenso o comércio de produtos vindos do Oriente: as
chamadas especiarias – cravo, canela, pimenta –, seda e outros artigos. Esses
produtos eram trazidos pelos árabes até os portos do Mediterrâneo, onde eram
comprados, principalmente, pelos mercadores da Península Itálica, que os
revendiam na Europa. Esse quase monopólio encarecia muito os artigos orientais.
Impedidos de efetuar negócios mais lucrativos, os comerciantes de outras regiões
começaram a procurar no Atlântico a saída para esse entrave.
A queda de
Constantinopla
Por
muito tempo, um grande número de historiadores considerou decisiva para a
expansão marítima a tomada de Constantinopla pelos turcos, em 1453. Com a queda
da cidade, acreditava-se que o comércio entre o Ocidente e o Oriente teria sido
interrompido na região do Mediterrâneo.
Entretanto,
é importante ressaltar que esse acontecimento, embora tenha dificultado o
comércio das especiarias, não o impediu: ele passou a ser monopolizado ainda
mais pelas cidades da Península Itálica. Além disso, quando os turcos tomaram
Constantinopla, os portugueses já haviam dado início às suas viagens marítimas
e à exploração da costa africana.
À procura de metais
preciosos
Outro
motivo que levou os europeus a realizar as navegações foi a busca de metais
preciosos, pois a expansão do comércio acarretava uma necessidade crescente
desses metais para a cunhagem de moedas. Ora, boa parte do ouro e da prata
existentes na Europa era destinada ao pagamento de mercadorias no comércio com
o Oriente. Por isso, os dois metais se tornaram escassos no continente,
forçando a procura por novas fontes fora da Europa.
Progressos técnicos e
científicos
As
Grandes Navegações não teriam sido possíveis sem os avanços já alcançados nas
técnicas de navegação em alto-mar e o aprofundamento dos conhecimentos
científicos alcançados pelos europeus no século XV.
Entre
os progressos técnicos estavam instrumentos como a bússola e o astrolábio,
além, é claro, da caravela. Muitos desses equipamentos já eram utilizados por
outros povos e foram aperfeiçoados e adaptados pelos portugueses à navegação
marítima.
Duas
outras novidades estavam no campo bélico e foram decisivas para o domínio
europeu sobre outros povos: a pólvora e o canhão, trazidos do Oriente. De posse
da bússola, do astrolábio e da caravela, os europeus puderam ir muito longe com
suas expedições marítimas. Os canhões e a pólvora, por sua vez, possibilitaram
a conquista de terras em outros continentes.
2. Portugal
e o desafio do Atlântico
A
que se deveu o papel pioneiro desempenhado por Portugal no processo das Grandes
Navegações?
Por
que foi possível a esse país tão pequeno lançar-se ao Atlântico e construir um
império transoceânico muito antes que o fizessem reinos maiores e mais
poderosos?
Até
meados do século XV, a principal rota comercial do mundo europeu era a que
ligava por terra as cidades da costa do Mediterrâneo às do norte da Europa. Com
a Guerra dos Cem Anos (1337-1453), essa via entrou em decadência. O comércio
passou a ser realizado por uma rota marítima que partia do Mar Báltico e do Mar
do Norte e chegava ao Mediterrâneo e vice-versa. Essa troca de rotas foi
possível graças aos progressos obtidos na arte de navegar e nas técnicas de construção
naval.
Com
a mudança, as regiões centrais do continente europeu acabaram perdendo
importância comercial. As regiões costeiras ao Atlântico, ao contrário, foram
beneficiadas, tornando-se passagem obrigatória dos mercadores que transitavam
entre o norte e o sul do continente em busca de negócios lucrativos.
Assim,
a nova rota marítima deu a Portugal, no século XIV, a oportunidade de
integrar-se às atividades mercantis efetuadas entre as regiões mais prósperas
do continente europeu. As consequências imediatas para os portugueses foram o
crescimento de cidades portuárias, como Lisboa e Porto, e a realização de
contatos comerciais regulares com as cidades da Península Itálica e com a
França, a Inglaterra, Flandres e as cidades do Sacro Império.
Mas
efetuar as navegações costeiras entre o norte da Europa e o Mediterrâneo
constituía um empreendimento inteiramente diferente de enfrentar o Oceano
Atlântico, desconhecido para além dos limites da costa.
A
atividade pesqueira, prática largamente difundida no litoral português, sem
dúvida contribuiu para que os portugueses se familiarizassem com o Oceano
Atlântico e aprendessem a enfrentar o mar aberto.
Além
disso, as cidades portuárias de Portugal funcionavam como uma espécie de
entreposto para o abastecimento das embarcações que utilizavam a rota marítima
do Atlântico. Como consequência, Portugal acabou transformando-se em um
importante centro onde circulavam as ideias mais avançadas a respeito de
navegação.
Nessa
época, Dom Henrique, o Navegador – filho do rei Dom João I –, reuniu inúmeros cartógrafos,
navegadores e astrônomos para desenvolver em Sagres estudos e experiências
náuticas. Mais tarde, o conjunto de ideias ali gerado foi denominado Escola
de Sagres.
A opção pelas
navegações
Diversos
setores da sociedade portuguesa estavam interessados nos benefícios propiciados
pelas navegações. Os motivos eram os mais variados e compreendiam, entre
outros, aspectos políticos, econômicos e religiosos.
A
monarquia portuguesa desejava fortalecer seu poder e construir um império. Para
isso, fazia-se necessário conquistar novas terras e controlar uma vasta rede
comercial. Os motivos da nobreza não eram muito diferentes. Os nobres
vislumbravam na expansão territorial uma oportunidade para conquistar terras,
riqueza, títulos e, claro, mais prestígio. A Igreja, por sua vez, estava interessada
em expandir a fé católica e aumentar o número de fiéis.
Para
a burguesia, os motivos eram bastante evidentes: a expansão territorial e o
contato com outros povos só fariam aumentar as atividades comerciais e os
lucros. Finalmente, para o chamado “povo miúdo”, as navegações abriam
possibilidades de trabalho, de ascensão social, de aventuras e de
enriquecimento rápido.
Pela costa africana
A
expansão portuguesa começou em 1415, com a tomada de Ceuta, importante centro
comercial dominado pelos muçulmanos no norte da África.
Em
seguida, Portugal ocupou as ilhas Madeira, Açores e Cabo Verde, no Oceano
Atlântico. Ali, a Coroa portuguesa realizou uma experiência de colonização,
implantando o cultivo de cana-de-açúcar. Essa experiência serviria mais tarde
de modelo para a ocupação das terras americanas.
A
expansão estendeu-se ao longo do litoral africano, onde os portugueses obtinham
produtos como pimenta, ouro e marfim. Em 1434, venceram o desafio da
ultrapassagem do Cabo Bojador, onde vários navegadores já haviam naufragado.
Nessa mesma época, deram início ao tráfico de escravos africanos, levando-os
para as colônias nas ilhas do Atlântico ou comercializando-os na Europa.
Somente
várias décadas mais tarde, entre 1487 e 1488, Bartolomeu Dias alcançou o Cabo
da Boa Esperança, no extremo sul da África.
Este
último feito abriria caminho para a realização de um projeto mais ambicioso,
esboçado após a conquista do Cabo Bojador: chegar às Índias contornando a
África.
Em
1497, dez anos após a viagem de Bartolomeu Dias, o rei Dom Manuel, o Venturoso
(entre 1495 e 1521), entregou a Vasco da Gama o comando de uma expedição que
deveria estabelecer relações comerciais com as Índias. Ela contava com cerca de
170 homens, incluindo marinheiros, militares e religiosos, ocupando quatro
navios. Dez meses depois da partida, em maio de 1498, Vasco da Gama chegava a
Calicute, próspera cidade do litoral indiano. Seu retorno a Lisboa ocorreu em
setembro de 1499. De sua expedição restaram apenas dois navios e 55 homens e a
certeza de poder estabelecer uma rota comercial entre a Europa e o Oriente
contornando o litoral da África.
Vera Cruz
Animado
com as possibilidades de lucros que a rota recém-aberta oferecia, o rei Dom
Manuel organizou uma nova expedição. Seu objetivo principal era impor o domínio
português sobre o comércio dos produtos orientais.
Comandada
por Pedro Álvares Cabral, a frota partiu em março de 1500, mas não tomou
diretamente o rumo para as Índias. Provavelmente, tinha outro objetivo não
declarado: tomar posse de uma enorme porção de terras no Atlântico sul. Assim,
abandonou o litoral africano em direção ao mar aberto e, em 22 de abril, chegou
às terras que denominou Ilha de Vera Cruz e que, mais tarde, passariam a se
chamar Brasil.
Depois
de formalizar a posse das terras em nome de Portugal, Cabral enviou a Lisboa um
navio com informações sobre a conquista e prosseguiu viagem em direção ao
Oriente.
Os
europeus ainda não sabiam, mas a porção de terras encontrada nessa outra margem
do Atlântico fazia parte de um enorme continente, mais tarde batizado com o
nome de América e que desde 1492 era explorado, na porção norte, pelos
espanhóis.
Portugal comanda o
comércio
Com
a descoberta do caminho marítimo para as Índias, intensificou-se o comércio de
especiarias. O aumento da oferta desses produtos levou à queda dos preços no
mercado. À medida que mais pessoas podiam comprá-los, ampliavam-se as
atividades comerciais na Europa.
A
partir desse momento, a rota do Mediterrâneo entraria lentamente em decadência,
provocando o enfraquecimento das cidades mercantes da Península Itálica.
Portugal
alçou-se ao primeiro plano entre os Estados mais poderosos da Europa. Essa
condição, todavia, duraria pouco tempo, pois logo a rota das Índias começou a
ser disputada por outras potências europeias. Portugal voltou-se então para a
exploração das terras americanas.
3.
Colombo chega à América
Embora
os espanhóis já tivessem, no início do século XV, tomado posse das Ilhas
Canárias, no Oceano Atlântico, a noroeste da África, sua expansão marítima e
comercial só começou efetivamente no final do século XV, após a expulsão definitiva
dos muçulmanos da Península Ibérica.
De
fato, em 1492, uma expedição comandada pelo piloto genovês Cristóvão Colombo
fez algo que até então parecia impossível: atravessou o Atlântico e tomou
posse, em nome dos reis espanhóis, de terras localizadas na região central de
um novo continente, que veio a se chamar América.
Colombo
tinha a intenção de atingir o Oriente navegando em direção ao Ocidente. Naquele
tempo, a maior parte da população acreditava que a Terra era plana. Mas entre
as pessoas mais esclarecidas, entre elas Colombo, já era bastante difundida a
ideia de que a Terra fosse redonda. Navegando conforme seus planos, Colombo
encontrou a atual Ilha de São Domingos, na América Central. Imaginou ter
chegado às Índias. Por essa razão, chamou de índios os habitantes do lugar.
O
feito de Colombo criou um problema diplomático com Portugal. Motivo: em 1479,
os dois países haviam firmado o Tratado de Alcáçovas. Esse tratado previa uma linha
horizontal (um paralelo) passando na altura das Ilhas Canárias como divisória
das terras descobertas ou por descobrir entre os dois países. Tudo o que ficasse
acima dessa linha seria espanhol; o que estivesse ao sul seria português. Ao
ser informado das descobertas de Colombo, o governo português alegou que elas
estavam na área portuguesa prevista no Tratado de Alcáçovas.
Vários
acordos foram feitos para tentar solucionar as disputas entre os dois reinos
ibéricos. Contudo, somente em 1494 celebrou-se um acordo definitivo: o Tratado
de Tordesilhas.
Nele ficava estabelecida uma divisão de territórios entre
portugueses e espanhóis.
O Tratado de Tordesilhas
O estabelecimento dos domínios no Atlântico
gerou uma longa batalha diplomática entre Espanha e Portugal.
Pouco depois da volta de Colombo para a
Europa, o papa expediu, em maio de 1493, a bula Inter Coetera, que
reconhecia ao Reino de Castela o domínio sobre todas as terras que se
encontrassem a oeste de um meridiano localizado a 100 léguas a oeste das ilhas
de Açores e Cabo Verde.
Portugal, sentindo-se prejudicado, não
aceitou a bula papal e exigiu uma negociação direta. O resultado foi o Tratado
de Tordesilhas, assinado em 1494, em que os reinos ibéricos estabeleceram uma
divisão do mundo.
Segundo esse tratado, terras e mares
encontrados ou por encontrar (desde que não pertencentes a nenhum rei cristão)
seriam divididos entre Espanha e Portugal. O meridiano que passa a 370 léguas a
oeste das ilhas de Cabo Verde foi tomado como linha divisória. As terras
localizadas a leste pertenceriam a Portugal. As restantes seriam da Espanha.
4.
Inglaterra, França e Holanda
Descontentes
com a divisão do mundo entre Espanha e Portugal pelo Tratado de Tordesilhas,
Inglaterra, França e Holanda não reconheceram o acordo e atuaram por diversos
meios contra as colônias e os navios ibéricos. Um desses meios foi a pirataria.
Mais tarde, iniciaram a conquista de áreas não colonizadas pelos espanhóis na
América do Norte e nas Antilhas. E foram, aos poucos, tomando pela força terras
já ocupadas pelos dois reinos ibéricos.
5.
Navegações e mercado mundial
As
Grandes Navegações deram ao comércio europeu um impulso extraordinário. Para se
ter uma ideia desse crescimento, basta lembrar que, em sua viagem às Índias,
Vasco da Gama trouxe de lá especiarias que renderam a Portugal um lucro de 6
000%.
Além
de colocar no mercado europeu quantidades inusitadas de mercadorias, o novo
comércio estabeleceu um intercâmbio sem precedentes entre os diversos
continentes. O mundo todo começava a ser unificado pelo comércio.
Essas
mudanças operaram uma verdadeira revolução nas relações internacionais, nos
hábitos de consumo, nas mentalidades, na organização das sociedades europeias e
não europeias. Além disso, consolidaram o poder absolutista dos reis e fizeram
da burguesia o grande agente das transformações sociais. Esse processo ficaria
conhecido mais tarde como revolução Comercial
Nenhum comentário:
Postar um comentário