GOVERNO DE ERNESTO GEISEL
(1974-1979)
Ernesto Geisel (pronuncia-se
“Gaisel”) tomou posse no dia 15 de março de 1974. O novo presidente tinha um
perfil muito diferente de seu antecessor. Era centralizador, tinha um estilo
autoritário e fazia questão exercer pessoalmente o controle da administração.
Havia adquirido grande experiência nos cargos públicos que ocupara nos governos
militares anteriores, inclusive como presidente da Petrobrás. Geisel pertencia
ao grupo castelista, e sua eleição significava o retorno ao poder da linha mais
moderada entre os militares. Era de esperar que o regime adotasse o caminho da
abertura política.
1.
A abertura política
De fato, o novo presidente anunciou que
pretendia avançar na direção de um regime democrático, mas iria fazê-lo aos
poucos, segundo um processo que ficou conhecido pela expressão abertura
lenta, gradual e segura. Na sua concepção, era preciso manter a linha-dura
afastada do poder e, ao mesmo tempo, retardar o máximo possível o retorno da
oposição ao governo.
Não ia ser uma tarefa fácil, pois a
oposição estava se fortalecendo mais rapidamente do que Geisel imaginava e a
linha-dura ainda ocupava importantes posições nos órgãos de repressão.
O primeiro teste para a política de
abertura do presidente foram as eleições parlamentares de novembro de 1974, em
que os candidatos oposicionistas obtiveram uma expressiva votação. Esse
resultado foi mais flagrante no Senado, onde a oposição preencheu 16 das 22
vagas que estavam sendo disputadas. Um dos novos campeões de voto foi Orestes
Quércia, ex-prefeito de Campinas, que, na disputa por uma vaga no Senado,
derrotou o candidato do governo, o veterano Carvalho Pinto.
O crescimento da oposição era um
evidente sinal de que o descontentamento com o regime militar estava
aumentando. Isso vinha acontecendo justamente nos estados mais desenvolvidos e
mais populosos, localizados no Sul-Sudeste, e nas maiores cidades. O reduto
eleitoral do governo ia restringindo-se aos estados mais atrasados e às cidades
menores. O beneficiado foi o MDB, que havia se convertido numa frente que
reunia os diversos setores políticos da oposição.
Outro teste difícil para o processo de
abertura política, que Geisel vinha conduzindo, deu-se quando o jornalista
Vladimir Herzog, diretor de jornalismo da TV Cultura, apareceu morto nas
dependências do DOI/Codi, vinculado ao II Exército, em São Paulo, no dia 25 de
outubro de 1975 (Foto). As autoridades alegaram que ele cometera suicídio com o cinto
do macacão, mas na verdade – e isso seria confirmado depois - ele havia sido
morto durante uma sessão de tortura.
Poucos meses depois, no mesmo local,
registrou-se a morte do operário José Manuel Fiel Filho. Novamente, a polícia
divulgou a versão do suicídio. Ele teria se enforcado com a própria... meia! A
repercussão internacional desses assassinatos foi muito grande, pois não havia
mais como negar que no Brasil havia tortura e morte de prisioneiros políticos.
Diante desses fatos, o presidente Geisel agiu com firmeza e determinou o
afastamento do comandante do poderoso II Exército, sediado em São Paulo. A
linha-dura havia sofrido uma derrota, mas ainda iria continuar dificultando o
processo de abertura.
2.
O “Pacote de Abril”
Nas eleições municipais de 1976,
novamente os resultados apontaram para um forte crescimento do MDB. Se as
coisas continuassem assim, chegaria o dia em que a oposição teria maioria no
Congresso Nacional. Para evitar que isso acontecesse, o governo mudou as regras
do jogo. Recorrendo aos poderes arbitrários que lhe dava o AI-5, Geisel
decretou o fechamento do Congresso e promulgou, em abril de 1977, o chamado
“Pacote de Abril”, que alterava a Constituição em vários pontos:
- Um terço do Senado seria preenchido pelos
“senadores biônicos”, isto é, senadores que passavam a ser eleitos,
indiretamente, pelas Assembleias Legislativas estaduais, que podiam mais
facilmente ser controladas pelo partido do governo.
- Foi alterado o critério da proporcionalidade
entre os estados quanto à representação na Câmara dos Deputados,
aumentando-se a representação dos pequenos estados, justamente os mais
atrasados, onde a ARENA era mais forte.
- O mandato do presidente da República foi
ampliado, passando de 5 para 6 anos.
Graças a esses artifícios - chamados de
“casuísmos” -, nas eleições parlamentares de 1978, apesar de a oposição ter
tido mais votos, o governo manteve a maioria do Congresso Nacional.
Nesse momento, o presidente Geisel deu
um passo importante no processo de abertura. Fez aprovar no Congresso Nacional
a emenda constitucional no. 11, que revogava o AI-5, e entrou em vigor em
janeiro de 1979. A partir dessa data, o governo já não poderia decretar o fechamento
do Congresso, nem cassar mandatos, nem suspender os direitos políticos dos
cidadãos. O Habeas-Corpus foi restaurado em sua plenitude e a
imprensa ficou livre dos controles da censura.
Eram passos importantes no rumo da
democratização do regime. Mas o governo havia mantido as condições que lhe
garantiam o controle da eleição do novo presidente, e não havia dúvida de que
este seria um general.
3.
A evolução econômica no governo Geisel
Ao
iniciar-se o mandato de Geisel, o país começava a sofrer os primeiros efeitos
da elevação dos preços internacionais do petróleo, que começara em outubro do
ano anterior (1973). Para o Brasil, que importava 80 % do petróleo que
consumia, foi um duro golpe. Bruscamente, a conta do petróleo importado
duplicou.
O choque do petróleo A brusca elevação dos preços do
petróleo, que ficou conhecido como o choque do petróleo, resultou
de uma decisão OPEP (Organização dos Países Produtores de
Petróleo), de diminuir a produção de petróleo, provocando a elevação dos preços
do produto. Os preços saltaram de US$ 1,50, o barril, em 1972, para US$ 3,50,
em 1973, e para US$ 10,00, em 1974.
Esforço
pela industrialização.
Era hora de reduzir o ritmo de crescimento da economia, para diminuir as
importações de petróleo. Mas em vez disso, o governo preferiu insistir no
avanço da industrialização, levando o PIB a apresentar, entre 1974 e 1978, a
uma taxa média anual de 6,7% de crescimento, uma taxa considerada alta.
Recorrendo a empréstimos externos,
contando com recursos das empresas privadas (nacionais e estrangeiras) e
principalmente das empresas estatais, lançou o II Plano Nacional de
Desenvolvimento (O I PND fora lançado no governo anterior). O plano previa
grandes investimentos, em vários setores básicos da economia. Os objetivos eram
alcançar a autonomia na produção dos chamados bens de capital (máquinas
e ferramentas) e de insumos básicos (tais como petróleo,
fertilizante, alumínio, aço).
Esse enorme esforço para industrializar
o país exigia igualmente um crescimento na produção de eletricidade, o que
levou à construção da usina hidrelétrica de Ipaipu (PR) e ao início das obras
das usinas nucleares, em Angra dos Reis (RJ). Alguns projetos de grande porte,
entre eles a Ferrovia do Aço, resultaram em fracasso, após consumir muito
dinheiro, em parte tomado emprestado no Exterior. Investimentos também foram
feitos na produção de álcool para substituir a gasolina, visando a tornar o
país menos dependente do petróleo importado.
Surgem problemas na economia. Havia, porém, alguns indicadores
preocupantes. Um deles era o crescimento da inflação, que chegou a 40%, em
1978. O outro, e mais grave, era o extraordinário crescimento da dívida
externa, que se devia a empréstimos novos, ao aumento da conta de petróleo
importado e à elevação das taxas internacionais de juros. Era preciso fazer
sempre mais dívidas, e assim o endividamento externo não parava de crescer,
como uma bola de neve.
A substituição de importações não era mais um bom caminho (se é que em elbum momento tenha sido).
É interessante registrar que o antigo modelo de desenvolvimento por meio da
substituição de importações estava sendo conduzido a um estágio mais adiantado
do processo. Mas o que ficou claro é que por mais que o país avançasse por esse
caminho - a substituição de importações -, ele sempre estaria caminhando atrás
dos países mais avançados tecnologicamente. Por isso, o prolongamento do modelo
teve como consequência inevitável a desatualização tecnológica da indústria brasileira.
Por quê? Porque o fechamento da
economia, para proteger a indústria nacional da concorrência dos produtos
estrangeiros, levava a uma constante acomodação do empresariado brasileiro, que
não se sentia pressionado a investir no desenvolvimento tecnológico (e,
portanto, no aumento da produtividade), para alcançar os países que estavam na
frente.
4.
O nascimento de um novo sindicalismo
O movimento sindical, que estivera
amordaçado durante muitos anos, começou a ressurgir no final do governo Geisel.
O crescimento da industrialização, puxado pela indústria automobilística, havia
criado grandes concentrações de trabalhadores, em vários pontos do país,
principalmente na Grande São Paulo. Apenas a região do ABC reunia
125 mil operários. Essa concentração possibilitou o aparecimento, no final de
1978, de um novo sindicalismo, diferente daquele criado nos tempos do getulismo
que se mantinha subordinado ao Ministério do Trabalho. O novo sindicalismo
adotou uma postura independente e atuou com grande combatividade.
Com base em dados do DIEESE
(Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sociais e Econômicos), que
comprovavam a manipulação dos dados da inflação nos anos de 1973 e 1974, os
sindicalistas iniciaram uma campanha para recuperar as perdas salariais. Essa
campanha conduziu a grandes greves em 1978 e 1979, contando com a participação
efetiva de milhares de trabalhadores. Os sindicalistas inauguraram um novo
estilo de negociação entre patrões e empregados, marcando uma ruptura com o
sindicalismo getulista, atrelado ao Ministério do Trabalho.
Essas lutas permitiram o aparecimento
de novas lideranças sindicais, com destaque para a figura de Luís Inácio da
Silva, o Lula, que era o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São
Bernardo e Diadema.
5.
A eleição do sucessor
No final de 1978, já se desenvolviam os
preparativos para a eleição do novo presidente. Nos meios militares, surgiram
os nomes de alguns pretendentes. O mais forte era o ministro da Guerra, o
general Silvio Frota. Mas Geisel, demonstrando total controle da sucessão,
conseguiu afastar Frota da disputa e obteve o apoio militar para o nome de sua
preferência, o general João Baptista Figueiredo, que ficou sendo o candidato do
governo, e, portanto da ARENA, tendo um civil como candidato a vice-presidente,
o mineiro Aureliano Chaves.
O MDB também lançou seus candidatos,
embora não tivessem nenhuma chance, pois a eleição continuava sendo feita de
forma indireta. Eram eles: o general Euler Bentes Monteiro, para a presidência,
e o senador gaúcho Paulo Brossard, para a vice-presidência. Como era
previsível, Figueiredo foi formalmente eleito e tomou posse em março de 1979.
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