No início dos anos cinquenta, entrou na pauta das discussões dos
brasileiros um assunto que até então havia sido ignorado. A questão consistia
em saber qual o melhor modelo de desenvolvimento para o país, entre os dois que
se apresentavam: neoliberalismo ou nacional-desenvolvimentismo.
Poder-se-ia pensar que era uma
simples questão de escolha técnica. É claro que a escolha envolvia elementos
dessa natureza, mas o que parecia prevalecer nessa discussão, muito mais do que
os elementos técnicos, era o componente ideológico, o que se constituía num
fator de complicação.
Essa discussão tendeu a se tornar
cada vez mais apaixonada nos anos seguintes, persistindo, em boa medida, até
nossos dias. Apesar de não ser uma tarefa fácil, vamos tentar apresentar, de
forma simplificada, esses dois modelos.
1. O
neoliberalismo
O Neoliberalismo é uma adaptação
ao capitalismo contemporâneo do antigo Liberalismo Econômico. Este surgiu no
sec. XVIII e teve como principal
formulador Adam Smith, autor de A
Riqueza das Nações (1776). Foi o pensamento econômico que orientou os
governantes brasileiros, na maior parte do tempo.
O modelo neoliberal era
representado pela fórmula do neoliberalismo, herdeiro do velho pensamento
liberal. Esse modelo recomendava (e ainda recomenda):
- o mínimo de intervenção estatal na economia, a qual deveria ser
deixada, de preferência, para as forças livres do mercado;
- total abertura para o capital estrangeiro, integrando o país na
economia capitalista mundial;controle orçamentário rígido, gastando apenas o que fosse
arrecadado, para evitar o déficit público e, consequentemente, a inflação;
- mínima tolerância para com os movimentos reivindicatórios dos
trabalhadores;
- apoio aos Estados Unidos nas relações internacionais.
Esta concepção era apoiada pela
grande imprensa, pela UDN e por uma parte dos militares. Como estratégia de
desenvolvimento, o neoliberalismo era defendido pelos economistas Eugênio Gudin
e Otávio Gouveia de Bulhões. As medidas econômicas propostas pelos neoliberais
são chamadas monetaristas ou ortodoxas.
2. O
nacional-desenvolvimentismo
O nacional-desenvolvimentismo começou
a ser formulado a partir de estudos elaborados pela CEPAL (Comissão Econômica
para a América Latina), órgão da ONU, com sede em Santiago do Chile. A CEPAL
foi criada, em 1948, para coordenar políticas de desenvolvimento econômico na
região latino-americana. Hoje, seu trabalho inclui também os países do Caribe.
O segundo modelo era representado
pela fórmula do nacional-desenvolvimentismo (também chamada apenas de
desenvolvimentista ou nacionalista). Seus seguidores defendiam (e ainda
defendem):
- a intervenção do governo na economia, através do planejamento
econômico, da criação de empresas estatais e do auxílio às empresas privadas
nacionais;
- a ideia de que a industrialização era o caminho do
desenvolvimento, que devia ser buscado mesmo com inflação;
- concepção econômica nacionalista, encarando com restrições a
entrada de capital estrangeiro, bem como entendendo que a exploração de setores
considerados estratégicos (minérios, petróleo, energia) não deveria ser aberta
a empresas estrangeiras;
- maior tolerância para com as reivindicações dos trabalhadores
(dando margem para a prática do populismo);
- restrições ao apoio dado aos Estados Unidos na política
internacional, tendendo para o não-alinhamento - ou seja, neutralidade em relação
às duas potências da época.
Esta concepção - do
nacional-desenvolvimentismo - era apoiada por uma parte dos empresários e dos
militares, por políticos do PSD e, principalmente, do PTB. Os comunistas
(embora o PCB fosse clandestino) aos poucos foram assumindo a defesa dessa
fórmula, por achar que ela estava mais próxima do modelo socialista.
Entre os jornais de expressão,
apenas o Última Hora, dirigido por um
amigo de Vargas, o jornalista Samuel Weiner, apoiava essa concepção. Dois
importantes teóricos do desenvolvimentismo foram Rômulo de Almeida e Celso
Furtado.
Os defensores do
nacional-desenvolvimentismo, seguidores dos ideais formulados pela CEPAL, são
também chamados estruturalistas, porque defendiam a necessidade de reformas
estruturais - por exemplo, a reforma agrária - que eliminariam os obstáculos
que impedem o desenvolvimento econômico do país.
É preciso advertir, entretanto,
que essa é uma esquematização simplificada do problema. Essas fórmulas
raramente foram adotadas em sua forma pura, extremada, ocorrendo, com mais frequência,
posições intermediárias, embora com ênfase em uma delas.
Nesta posição intermediária,
encontrava-se, por exemplo, o conhecido economista Roberto Campos, que, como
veremos mais adiante, foi um dos fundadores do BNDE (1952) e um dos formuladores
do Plano de Metas do governo Juscelino Kubitschek. Posteriormente, foi um dos
responsáveis pela política econômica do governo Castello Branco. Roberto Campos
preferia definir-se como liberal-desenvolvimentista.
A defesa de um ou de outro desses
projetos, completamente diferentes, no decorrer dos anos cinquenta, ganhou mais
e mais repercussão junto aos partidos, à grande imprensa e à opinião pública.
A discussão chegou até os
quartéis, o que era particularmente grave, pois no início da década de 50, a
Guerra Fria sofreu um “aquecimento”, em virtude da Guerra da Coréia. E o apoio
ou não aos Estados Unidos dividiu os militares brasileiros, e se tornou fator
de complicação para Getúlio Vargas, que voltara ao governo em 1951.
Os defensores do desenvolvimentismo
chamavam-se, a si próprios, de progressistas e de nacionalistas, e, para
depreciar os adversários chamavam-nos de conservadores e de “entreguistas”.
Também se usam os termos direita, como designativo para estes, e esquerda, para
aqueles.
Reforçando, convém registrar que,
ainda hoje, esses dois modelos continuam sendo defendidos, e que, com mais frequência,
houve os que assumiram posições intermediárias, combinando medidas de um e de
outro dos modelos.
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