EVOLUÇÃO POLÍTICA DA REPÚBLICA VELHA
O primeiro período republicano, entre 1889 e 1930, ficou
conhecido em nossa história com a designação de República Velha. Nos primeiros
cinco anos, ela foi governada por militares (os marechais Deodoro da Fonseca e
Floriano Peixoto), e por isso essa fase é conhecida por República da Espada
(devido ao fato de que naquele tempo os militares portavam uma espada). A
partir de 1894, com a posse do primeiro presidente civil, o fazendeiro paulista
Prudente de Morais, teve início a segunda fase, batizada com o nome de
República Oligárquica.
1. A
formação e a atuação do Governo Provisório.
Sabemos que no próprio dia 15 de novembro de 1889,
formou-se, às pressas, o Governo Provisório da República, proclamada
solenemente na tarde daquele dia, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Esse
governo deveria dirigir o país até que se pudesse organizar um governo
definitivo. Os líderes do movimento escolheram o próprio marechal Deodoro da
Fonseca para chefiar o novo governo. Para ocupar os sete ministérios então
existentes, foram nomeados Quintino Bocaiúva (Relações Exteriores), Demétrio Ribeiro (Agricultura, Comércio e Obras Públicas), Benjamim Constant (Guerra), Rui Barbosa (Fazenda), Eduardo Wandenkolk (Marinha), Campos Sales (Justiça) e Aristides Lobo (Interior).
Constituído o Governo Provisório, este adotou, nos
primeiros dias, entre outras, as seguintes medidas:
a)
a decretação, em caráter provisório, da República
federativa como forma de governo (até que esse assunto fosse decidido por uma Assembleia
Constituinte).
b)
a transformação das antigas províncias em estados,[1]
e a, consequente, nomeação dos novos governadores (na República Velha,
continuando uma tradição do Império, os governadores, muitas vezes, eram
chamados de presidentes).
c)
a instituição da nova bandeira, a mesma que temos
hoje.
d)
a convocação da Assembleia Nacional Constituinte,
para elaborar a nova Constituição para o país.
e)
A expulsão da Família Imperial do Brasil.
A queda da Monarquia, de imediato, não teve oposição.
Mas os republicanos temiam que pudesse haver alguma reação dos monarquistas (o
que de fato ocorreria alguns anos mais tarde). Por isso, uma das primeiras
medidas do Governo Provisório foi o decreto do dia 16 de novembro, estipulando
o prazo de vinte e quatro horas para que D. Pedro II e sua família deixassem o
Brasil. Sem oferecer nenhuma resistência, na madrugada do dia 17, a família
imperial acatou a ordem de expulsão e partiu para a Europa. D. Pedro II faleceu
em Paris, no dia 5 de dezembro de 1891, aos 66 anos de idade.
Outras medidas importantes do governo republicano foram a separação
entre a Igreja e o Estado e a Grande Naturalização, decretada em dezembro de 1889. Pela primeira,
instituíam-se a liberdade de religião e o casamento civil. Pela segunda,
concedia-se a cidadania brasileira a todos os estrangeiros residentes no Brasil
(a não ser para aqueles que se manifestassem em contrário).
Ambas as medida vinham facilitar a vida dos imigrantes no
Brasil, bem como permitir sua integração como membros da nação. Constituíam,
por isso mesmo, antigas reivindicações dos fazendeiros paulistas, os mais
interessados em favorecer a vinda de imigrantes para o Brasil.
2. O Encilhamento
Um dos fatos de maior repercussão, ocorrido na época, foi o
Encilhamento. Esse foi o nome dado a uma reforma financeira,
iniciada por um decreto de 17 de janeiro de 1890, assinado por Rui Barbosa,
ministro da Fazenda do Governo Provisório. A reforma consistiu basicamente em
aumentar a quantidade de dinheiro em circulação, por meio do estabelecimento
dos bancos de emissão. A maior quantidade de dinheiro se devia à necessidade de
financiar a imigração, aumentar a oferta de crédito e permitir o pagamento de
salários (cujo volume aumentara com o fim da escravidão).
Rui Barbosa via na expansão do crédito uma forma de
estimular o crescimento industrial. De fato, o aumento do volume de moeda em
circulação possibilitou um maior volume de negócios e consequentemente a
abertura de novas empresas. Apenas no ano de 1890, fundaram-se 313 empresas, o
que era um número expressivo, tendo em vista o atraso do país, na época. Muitas
dessas empresas chegaram a funcionar. Porém, foram numerosos os espertalhões
que, explorando a boa fé das pessoas, ganharam dinheiro, vendendo ações de
empresas que nunca saíram do papel. Mas, enquanto a confiança durou, houve uma grande
procura pelas ações e a especulação cresceu na Bolsa de Valores, do Rio de
Janeiro. Essa euforia especulativa recebeu o nome de Encilhamento
(de encilhar = preparar o cavalo para a corrida),
talvez porque tivesse semelhança com a agitação dos apostadores no jóquei.
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Tumulto em frente à Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, durante a crise do Encilhamento |
A reforma financeira, porém, resultou em crise. O que
aconteceu foi o seguinte: de um lado, a maior quantidade de dinheiro em
circulação provocou o aumento do custo de vida (inflação). De outro lado,
ocorreu a queda do preço das ações e falências, causando prejuízos aos
investidores. A política de emissão de dinheiro e do crédito que caracterizou o
Encilhamento durou dois anos e meio. Ela acabou ao se iniciar o governo de
Floriano Peixoto, que prometeu adotar uma política de estabilização da moeda.
3. A Constituinte, a Constituição e a eleição presidencial
A mudança da forma de governo tornava necessária a
elaboração de uma nova Constituição para o país. E para isso o Governo
Provisório já havia convocado a Assembleia Constituinte.
“O significado
jurídico-político maior da convocação de uma Assembleia nacional constituinte é
a restauração da legalidade e da legitimidade do poder, fazendo-o passar de um
poder de fato, de um regime de força, a um poder de direito, a um regime legal”.[2]
O projeto da nova Constituição foi elaborado por uma
comissão e revisado por Rui Barbosa, um dos grandes juristas brasileiros
daquele tempo. Depois de alguns meses de discussão, foi aprovado pela Assembleia
Constituinte, e entrou em vigor em 24 de fevereiro de 1891. No dia seguinte, a Assembleia
realizou a eleição do presidente da República, saindo vencedor o marechal
Deodoro da Fonseca. O candidato derrotado era Prudente de Morais. Em seguida,
houve a escolha do vice-presidente, sendo eleito outro militar, o marechal
Floriano Peixoto. O mandato deles ia durar até 1894.
Promulgada a Constituição e eleitos o presidente e o
vice-presidente, a Assembleia Constituinte transformou-se em Congresso
Nacional, constituído do Senado Federal e da Câmara dos Deputados.
4. Os governos Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto (1891- 1894)
A proclamação da República acabou desencadeando intensas
lutas, provocadas por ambições pessoais, interesses econômicos ou por
diferentes concepções políticas. Por isso, Deodoro enfrentou forte oposição. O
problema mais grave foi o choque com o Congresso. O presidente queria
fortalecer seu poder e os congressistas queriam fazer exatamente o contrário:
limitar o poder do presidente.
Esses desentendimentos levaram Deodoro da Fonseca a
decretar o fechamento do Congresso Nacional. Era uma medida ilegal, já que a
Constituição não lhe dava esse poder. Essa atitude autoritária do presidente
despertou forte oposição e provocou, contra Deodoro, uma revolta da Marinha,
liderada pelo almirante Custódio de Melo. Com os navios de guerra apontando os
canhões para a cidade do Rio de Janeiro, os revoltosos exigiram a renúncia do
presidente. Este, sem suficiente apoio e sem a necessária disposição para
reagir, não teve outra alternativa senão renunciar e deixar o governo
(23/11/1891).
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Marechal Floriano Peixoto |
Assumiu o vice-presidente, o marechal Floriano Peixoto. Seu
governo também iria enfrentar muita oposição. Em primeiro lugar, havia aqueles
que exigiam novas eleições, alegando que Deodoro não cumprira a metade de seu
mandato. Floriano considerou que essa exigência não valia para ele, e
manteve-se no cargo, reprimindo duramente os adversários.
A situação política do país se agravou em virtude de uma
nova revolta da Marinha (setembro de 1893), liderada pelo mesmo Custódio de
Melo, que ia tentar contra Floriano o mesmo golpe que usara contra Deodoro. Mas
desta vez o golpe não deu certo. Floriano demonstrou que estava decidido a
enfrentar a revolta. Comprou no Exterior outros navios de guerra e quando eles
chegaram os revoltosos abandonaram o Rio de Janeiro, rumando para o Sul do
país.
Revolução
Federalista
Alguns meses antes havia se iniciado no Rio Grande do Sul
uma guerra civil, conhecida pelo nome de Revolução Federalista (1893-1895). O
conflito começou como uma luta pelo poder entre grupos rivais gaúchos. De um
lado, estavam o governador do estado, Júlio de Castilhos, e seus aliados,
reunidos no Partido Republicano Gaúcho; tinham o apelido de “chimangos”. De
outro lado, estavam os adversários, reunidos no Partido Federalista; eram
chamados “maragatos”. O governo estadual contou com o apoio de Floriano, o que
fez ampliar o conflito. Os federalistas invadiram o vizinho Estado de Santa
Catarina, onde se juntaram aos revoltosos da Marinha, que se haviam deslocado
do Rio de Janeiro para o Sul. Juntos avançaram sobre o Estado do Paraná, de
onde lançaram um manifesto exigindo a renúncia de Floriano Peixoto.
Os rebeldes, que lutavam contra as forças dos governos
gaúcho e federal, representavam também uma ameaça para o próprio regime
republicano, já que havia monarquistas entre seus líderes. De maneira que, ao
defender seu governo, Floriano acabava defendendo a própria República. No
final, ele venceu, contando com o importante apoio dos cafeicultores paulistas,
que forneceram a Floriano dinheiro e homens para enfrentar as revoltas.
Organizados no poderoso PRP, os paulistas esperavam eleger o próximo
presidente.
O papel
dos “jacobinos”
Outro fator decisivo para a vitória de Floriano foi apoio
dos “jacobinos”.[3]
Era assim chamado um grupo de pessoas (civis e militares) que atuou no Brasil
nos anos seguintes à Proclamação da República, mais exatamente entre 1893 e
1897. Defendiam um programa vagamente nacionalista, favorável à indústria e
contrário ao domínio político das oligarquias. Viram em Floriano o defensor
desse programa e lhe deram decidido apoio, sendo por isso chamados também de florianistas.
Apesar da popularidade de que gozava, Floriano Peixoto,
apelidado o “Marechal de Ferro”, ao final de seu governo retirou-se da vida
política. Seu sucessor foi Prudente de Morais, eleito em 1894. Concorrendo com outros candidatos,
obteve mais de 80% dos votos. Ele era um legítimo representante da cafeicultura
paulista, o ramo mais importante da economia do país. Sua eleição significava,
na luta pelo poder, uma vitória dos cafeicultores e, portanto, dos políticos
civis sobre o grupo militar.
5. Os
presidentes da República Oligárquica
A partir de 1894, conforme
mandava a Constituição, a cada 4 anos realizava-se a eleição de um novo
presidente, geralmente escolhido entre mineiros e paulistas. Uma vez
formalizado o nome do escolhido, este se dirigia ao Rio de Janeiro e, num
banquete, expunha seu programa de governo. A eleição se fazia no dia 1 de março
e a posse, no dia 15 de novembro subsequente.
Os presidentes da República
Oligárquica foram:
1. Prudente de Morais (1894-1898)
2. Campos Sales (1898-1902)
3. Rodrigues Alves (1902-1906)
4. Afonso Pena (1906-1909) - Nilo
Peçanha (1909-1910)
5. Hermes da Fonseca (1910-1914)
6. Venceslau Brás (1914-1918)
7. Delfim Moreira (1918-1919)
(Era o vice-presidente de
Rodrigues Alves, eleito em 1918, que, por motivo de doença, não pôde tomar
posse, vindo a falecer em janeiro de 1819. Nesse mesmo ano, realizou-se nova
eleição.)
8. Epitácio Pessoa (1919-1922)
9. Artur Bernardes (1922-1926)
10. Washington Luís (1926-1930)
[1] A palavra estado (grafada com
minúscula) designa o estado-membro da Federação (ou da União), enquanto que a
palavra Estado (grafada com maiúscula) refere-se à própria Federação (ou
União). Veja glossário no final do
livro.
[2] Gomes, Ângela Maria de C. O
Brasil Republicano. Sociedade e Política. São Paulo, Difel, 1983, p. 9 (História Geral da Civilização Brasileira,
tomo III, volume 3.)
[3] O nome “jacobino” se originou
durante a Revolução Francesa e designava um partido popular, revolucionário,
que teve em Robespierre seu principal líder.
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