sábado, 17 de outubro de 2015

O  PERÍODO  TRANSITÓRIO  ENTRE  VARGAS  E  JUSCELINO (1954-1955)


Com a o suicídio de Vargas, assumiu o vice-presidente João Café Filho, um político do PSP (Partido Social Progressista), um partido dominado por Ademar de Barros, um político populista de São Paulo. O governo Café Filho iria apresentar muitas diferenças em relação ao de Getúlio Vargas.

Para começar, organizou um ministério com predomínio de políticos da UDN. Para o estratégico Ministério da Fazenda, nomeou Eugênio Gudin, o principal defensor da fórmula neoliberal no Brasil. Militares antigetulistas, como Eduardo Gomes e Juarez Távora, integraram o ministério. Mas o Ministério da Guerra, sempre importante no Brasil, foi entregue ao general Teixeira Lott, que tinha a fama de ser um militar de centro, não ligado a partidos. 

1. A política econômica do governo Café Filho

O novo ministro da Fazenda, fiel à linha monetarista(ou ortodoxa) (ou, pôs em prática um rigoroso programa de combate à inflação, que ele considerava a pior herança do governo Getúlio. Impôs medidas de restrição ao crédito e de contenção dos gastos públicos. As medidas reduziram a quantidade de dinheiro em circulação, criando dificuldades para as empresas, resultando em falências e desemprego. Essas medidas, como é fácil imaginar, causaram o descontentamento, tanto de trabalhadores quanto de empresários.

No início de 1955, o governo Café Filho baixou a Instrução 113, que tinha o objetivo de estimular a vinda de capital estrangeiro para o país. Tratava-se de um decreto, por meio do qual o governo permitia que empresas estrangeiras importassem máquinas e equipamentos sem a necessária cobertura cambial, quer dizer, sem que precisassem fazer o depósito equivalente em moeda estrangeira. “Por tal mecanismo impelia-se o capital nacional a associar-se às multinacionais, de modo a usufruir de vantagens equivalentes.”[1]

Essa medida estimulava, portanto, a desnacionacionalização da economia brasileira. O programa de combate à inflação e a Instrução 113 foram muito criticadas pela oposição, principalmente dos nacionalistas. Café Filho, sentindo a pressão, e sem força política para resistir, preferiu recuar, e demitiu Gudin, em abril de 1955. O sucessor de Gudin desistiu do combate à inflação e preferiu adotar uma política econômica menos recessiva. Com isso, o ziguezague na política econômica continuou.

Café Filho reconhecia que a principal tarefa de seu governo era fazer respeitar o calendário eleitoral já estabelecido, e por isso não concordou com a pretensão da UDN de adiar as eleições parlamentares, marcadas para aquele ano, que foram realizadas na data prevista. Os resultados não alteraram substancialmente a correlação de forças no Congresso Nacional, conservando o PSD a grande maioria das cadeiras, mantendo-se a UDN como o segundo partido mais importante. A eleição presidencial se realizou num clima de grande tensão.

2. As eleições presidenciais de 1955

Em fevereiro de 1955, o PSD apresentou a candidatura de Juscelino Kubitschek de Oliveira, para a presidência da República. JK, como era conhecido, havia sido prefeito de Belo Horizonte e  governador de Minas Gerais. Recebeu o apoio do PTB, que indicou Jango (apelido de João Goulart) para o cargo de vice-presidente. Essa aliança era praticamente imbatível, pois unia a força eleitoral que o PSD tinha na zona rural, com o poder do PTB nas cidades. Era tudo o que os antigetulistas não queriam. Por isso, os boatos de golpe começaram a circular.

A UDN estava desesperada, pois não dispunha de um nome capaz de derrotar a chapa JK-Jango. Por isso, apoiou o nome do general Juarez Távora, já lançado pelo pequeno Partido Democrata Cristão (PDC). Távora, antigo tenentista, identificado com a direita, também foi apoiado por Jânio Quadros, recentemente eleito para o governo de São Paulo. Outros candidatos foram Ademar de Barros e Plínio Salgado.

A diferença de discurso entre os dois principais candidatos era muito grande. Juarez Távora tinha um visão neoliberal (conservadora) da economia, falava em equilíbrio orçamentário e defendia a ideia de que a principal função do governo era fiscalizadora. Ao contrário, Juscelino fez uma campanha prometendo acelerar a industrialização e realizar grandes investimentos públicos. Enfim, ele prometia um desenvolvimento tão grande para o país, que resumiu essa promessa no slogan era: “Cinquenta anos em cinco”.

O resultado deu a vitória aos candidatos da aliança PSD-PTB. Mas a diferença era pequena. JK recebeu 36% dos votos e Juarez Távora, 30%. Ademar e Plínio Salgado obtiveram 26% e 8%, respectivamente. Vale destacar que Jango, surpreendentemente, teve mais votos que JK. É que a lei eleitoral em vigor permitia que o vice fosse votado separadamente.

Assim que os resultados foram sendo conhecidos, os udenistas, liderados por Carlos Lacerda, iniciaram uma intensa campanha contra a posse dos eleitos. A campanha, apoiada por jornais da grande imprensa, insistia em que JK e Jango não deveriam tomar posse, pois não tinham obtido a maioria absoluta dos votos. E, além disso, tinham “recebido os votos dos comunistas e de um eleitorado formado pela massa ignorante, sofredora, desiludida, ...

Era, claramente, uma manobra golpista. Tudo ia depender da posição do general Teixeira Lott, ministro da Guerra. Felizmente, para a frágil democracia brasileira, o ministro era um zeloso cumpridor do papel constitucional do Exército, que proibiu qualquer manifestação política por parte dos militares.


Teixeira Lott foi ministro da Guerra e candidato a presidente
nas eleições presidenciais de 1960.

3. A crônica dos golpes

No começo de novembro, surgiu a chance que os golpistas esperavam. Havia falecido um general antigetulista e na oração fúnebre falou o coronel Mamede, membro da Escola Superior de Guerra (ESG) e um dos signatários do famoso “Manifesto dos Coronéis”, de fevereiro de 1954, que havia resultado, como vimos, na demissão de João Goulart do Ministério do Trabalho.

No discurso, Mamede criticou o resultado das eleições, considerando-o uma “mentira democrática”. Era, pois um discurso político, e contrariava a determinação do ministro da Guerra. O general Lott entendeu que devia punir o coronel. Este, por ser era membro da Escola Superior de Guerra (criada em 1949), estava diretamente subordinado ao presidente da República. Lott, então, solicitou autorização para a puni-lo.

Mas sobreveio um fato complicador, pois Café Filho naqueles dias sofreu um ataque cardíaco e teve de ser substituído pelo presidente da Câmara, deputado Carlos Luz, aliado dos golpistas. Carlos Luz negou a autorização para punir o coronel Mamede. Lott sentiu-se desprestigiado e se demitiu. Era tudo o que os golpistas queriam. Nesse dia, Lacerda escreveu no seu jornal: “Esses homens não podem tomar posse, não devem tomar posse, nem tomarão posse”.

O golpe, porém, não se consumou, porque o general Lott, percebendo que havia caído numa armadilha, reagiu e garantiu a defesa da legalidade. No dia 11 de novembro, determinou que unidades do Exército ocupassem a cidade do Rio de Janeiro. Diante disso, Carlos Luz, Lacerda e outros golpistas fugiram. A presidência da República foi, então, ocupada pelo presidente do Senado, Nereu Ramos. Coube-lhe dar posse aos eleitos, no dia 31 de janeiro de 1956.





[1] Mendonça, Sônia Regina de. In: História Geral do Brasil. Rio de Janeiro, Campus, 1990, p. 277.

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