OS
ESTADOS UNIDOS NOS TEMPOS DA
GUERRA FRIA
Os Estados
Unidos já eram, nos anos que se seguiram à Primeira Guerra Mundial, o país mais
rico do mundo. Mas, no período entre as duas guerras mundiais, o governo
estadunidense evitou envolver-se nos problemas mundiais. A situação mudou
completamente depois de 1945. De fato, depois de sua participação decisiva na
Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos começaram a adotar uma política
agressiva no cenário internacional. A partir da década de 1940, o país
encarnaria o papel de líder na construção de uma nova ordem mundial.
O marco
inicial dessa política foi o lançamento de duas bombas atômicas sobre o Japão
em 1945, uma demonstração de força desnecessária, mas que deu ao mundo a real
dimensão do poder de destruição das armas estadunidenses.
![]() |
Estados Unidos no século: superpotência cultural, militar e econômica. |
No final da
Segunda Guerra, a conjuntura interna dos EUA deixava o país em uma situação confortável
em relação às outras nações, o que lhe permitia exercer enorme influência sobre
a política e a economia internacional. Segundo o historiador francês Maurice
Crouzet, os Estados Unidos tinham 7% da população do globo e ocupavam 7% da
superfície terrestre, mas detinham mais de um terço da riqueza mundial. Os EUA
fabricavam 60% dos artigos industrializados consumidos no mundo e suas reservas
em ouro representavam quase dois terços do total mundial.
O fim da
guerra, porém, trouxe de volta o temor de uma nova crise econômica, semelhante
à de 1929. E não era para menos: o término do conflito significou a diminuição
dos efetivos militares e a inserção de milhares de jovens no mercado de
trabalho.
Nos
primeiros anos do pós-guerra, essas preocupações se revelaram infundadas. Ao
contrário das previsões pessimistas, o que se viu foi uma espantosa expansão do
poderio econômico dos Estados Unidos.
O
crescimento da economia norte-americana após a Guerra
Várias razões
concorreram para esse crescimento:
1. Em primeiro
lugar, a capacidade produtiva do período de guerra praticamente se manteve, graças
ao aumento da população e à crescente demanda de bens de consumo, reprimida durante
os anos do conflito. Assim, se por um lado as indústrias que produziam para a guerra
reduziram as atividades, por outro isso foi compensado pelo aquecimento de
setores como o de fibras sintéticas e de eletrodomésticos.
2. Em segundo
lugar, o comércio exterior também se expandiu. Os EUA se beneficiaram do fato
de serem a única nação em condições de abastecer o mercado mundial com produtos
industrializados de alta tecnologia. A partir de 1947, o Plano Marshall
facilitaria ainda mais as exportações para países europeus.
Poucos anos
depois, porém, com a reconstrução da Europa concluída, as nações europeias não
só reduziram as importações dos EUA como voltaram a competir no mercado mundial.
Com isso, inverteu-se a tendência de crescimento da economia estadunidense, e o
fantasma da crise voltou a rondar o país. O declínio da atividade econômica
elevou o número de desempregados de 670 mil, em 1944, para mais de 4,5 milhões
no começo dos anos 1950.
Na tentativa de
reativar a economia, o governo estadunidense tomou uma série de providências: reduziu
os impostos, facilitou o crédito ao consumidor para manter a indústria de bens
de consumo aquecida e favoreceu a construção de moradias.
1. Os
sindicatos se mobilizam
As
organizações sindicais surgiram cedo nos EUA. Desde 1886 já existia a American
Federation of Labor (AFL), que foi por muito tempo a mais importante
entidade sindical do país. Mais tarde, nos tempos do New Deal – década
de 1930 –, formou-se o Congress of Industrial Organizations (CIO),
fortalecido pelo apoio do governo de Franklin Roosevelt.
Assim
organizados, pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial, os trabalhadores dos
EUA promoveram uma onda de greves, reivindicando aumento salarial e melhores condições
de trabalho. As paralisações atingiram diversos setores da economia, como o automobilístico,
o elétrico e o siderúrgico, e chegaram a durar meses.
Em 1946, os
EUA enfrentaram a crise trabalhista mais grave de sua história, quando quase dois
milhões de operários entraram em greve. Em maio desse ano, os trabalhadores
ferroviários suspenderam suas atividades e o país ficou à beira do caos. Foi
preciso o presidente Harry Truman recorrer ao Congresso Nacional para poder
intervir na situação e evitar a paralisação total dos transportes ferroviários.
Pressionados
pelo governo, os empresários concederam ajustes salariais, mas logo em seguida repassaram
as despesas para os consumidores, aumentando os preços. A elevação de preços acabou
anulando os ganhos salariais, o que levou os operários a novos movimentos
grevistas. Foi o que aconteceu de 1946 para 1947 e novamente no final de 1950.
Com o
crescimento do movimento sindical, os políticos conservadores passaram a lutar
por uma legislação que diminuísse o poder dos trabalhadores. Em junho de 1947,
conseguiram a aprovação da lei Taft-Hartley pelo Congresso. Entre outras
restrições, a lei limitava as greves em setores considerados de segurança
nacional e a contribuição sindical aos partidos políticos, além de exigir dos
sindicalistas o juramento de que não eram comunistas.
Em 1955, a
AFL e o CIO se fundiram em uma única e gigantesca associação sindical, a AFL-CIO,
que reunia 15 milhões de membros.
3. Guerra
Fria e macarthismo
Em 1947, o
presidente Harry Truman anunciou a intenção do governo dos Estados Unidos de
combater a expansão do comunismo. Era o início de uma disputa mundial com a
União Soviética, que ficou conhecida como Guerra Fria.
A Guerra
Fria não determinou apenas os rumos da política externa dos EUA. Internamente, fez-se
presente por meio de intensa campanha anticomunista que atingiu vários setores
da sociedade estadunidense.
Teve início
a investigação dos funcionários públicos federais para identificar aqueles que
fossem comunistas. Mais de três milhões de funcionários tiveram sua vida
esquadrinhada e mais de dois mil acabaram demitidos.
No início
dos anos 1950, a histeria anticomunista se transformou em verdadeira caça às bruxas.
Políticos ambiciosos se aproveitaram da situação para conquistar votos. O
senador Joseph McCarthy, político do Partido Republicano, foi nesse período a
principal voz anticomunista do país.
McCarthy
anunciou (sem ter provas) que possuía uma lista de 205 comunistas infiltrados no
Departamento de Estado. A partir dessa acusação, criou-se um comitê especial
para investigar a denúncia e o Congresso aprovou uma lei segundo a qual todos
os comunistas deveriam se registrar; a lei determinava ainda que, em caso de
emergência, os comunistas poderiam até ser isolados em campos de concentração.
Milhares de
cidadãos estadunidenses foram submetidos a investigação. Artistas e escritores passaram
a ser perseguidos. Nem o Charles Chaplin foi poupado!
Para
muitos, isso significou o fim da carreira profissional. O medo disseminado pelo
país era tão forte que, muitas vezes, para se salvar, as pessoas delatavam os
próprios colegas. Essa campanha persecutória ficou conhecida como macarthismo.
Estados Unidos nos
anos 1950:
Crescimento
econômico e contradições sociais
O historiador
Robert Sean Purdy é especialista em história dos Estados Unidos. Ele trabalhou
num projeto de comparação entre a periferia de São Paulo (Brasil) e as
periferias de Chicago (EUA) e Toronto (Canadá). No texto a seguir, ele compara
a memória coletiva dos estadunidenses com as contradições sociais do território
nos anos 1950.
“A imagem dos anos
1950, na memória coletiva, centra-se na prosperidade econômica e na
estabilidade familiar. Nessa visão, todo mundo na época tinha emprego estável e
ampla oportunidade de mobilidade social. A televisão, o cinema e a literatura de
grande público destacaram famílias harmoniosas: pai trabalhador, mãe dona de
casa e alguns filhos morando nos crescentes subúrbios em casas com quintais
próprios e suas indefectíveis cercas brancas.
Sem dúvida, essas
imagens capturam aspectos da realidade da época. O PIB dos Estados Unidos
saltou em 250% entre 1945 e 1960, com renda familiar crescente e baixas taxas
de desemprego e inflação. A classe trabalhadora obteve acesso sem precedentes à
economia de consumo de massa, sindicatos ganharam melhores salários e a
expansão de benefícios, e o estado de bem-estar garantia em alguma medida a
segurança econômica. Debaixo da superfície, porém, a sociedade afluente dos
anos 1950 testemunhou contradições e desafios marcantes.
O crescimento
econômico foi inegável, mas nem todo mundo compartilhou da prosperidade.
Em 1960, um quinto
das famílias americanas vivia abaixo do nível oficial de pobreza estabelecido
pelo governo e muitas outras sobreviveram apenas com a mínima segurança e
conforto. A distribuição da renda não mudara muito: a população 20% mais rica continuou
controlando 45% de toda renda, enquanto a 20% mais pobre controlava somente 5%.
Indígenas,
relegados às reservas no interior dos Estados Unidos, eram as pessoas mais
pobres no país.
Idosos e
trabalhadores rurais de todas as etnias e as populações afro-americana e
latino-americana estavam desproporcionalmente entre os indigentes.
Devido à
discriminação e à falta de dinheiro, esses grupos raramente desfrutavam a
‘maravilhosa vida suburbana’, concentrando-se nos centros das cidades, onde empregos,
comércios e serviços públicos tornavam-se cada vez menos acessíveis.” PURDY,
Sean. O século americano. In: KARNAL, Leandro et al. História dos Estados
Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2008. p. 230.
4. Direitos civis para os negros
A Guerra
Fria foi o tema central da campanha presidencial de 1952. O país estava
envolvido na Guerra da Coreia e vivia sob o clima de denúncias criado pelo
senador McCarthy. O general Dwight Eisenhower, do Partido Republicano, venceu
as eleições e assumiu a Presidência, cargo que exerceu durante dois mandatos
(1953-1961).
Ao longo
desses anos, apesar da resistência de setores sociais conservadores, a questão
racial começou a mobilizar a nação, pois os negros passaram a lutar de forma
mais efetiva por seus direitos. A primeira grande vitória da população negra
ocorreu em 1954, quando a Corte Suprema decretou a inconstitucionalidade das
leis que previam escolas separadas para crianças brancas e negras. A decisão enfrentou
a oposição dos estados sulistas, de forte tradição racista.
Em 1955,
Martin Luther King, um pastor protestante negro do Alabama, deu início a um
movimento para derrubar a proibição de negros viajarem sentados nos ônibus de
sua cidade, Montgomery. O que o levou a iniciar o movimento foi o gesto de Rosa
Parks, uma costureira de 42 anos, que no dia 1o de dezembro daquele ano se
recusou a ceder seu lugar no ônibus a um passageiro branco, como mandava a lei.
Foi presa e teve de pagar uma multa. Liderados por Luther King, os negros
boicotaram, durante mais de um ano, a empresa de ônibus local. Os que não
tinham carro iam a pé para a escola ou para o trabalho. Finalmente, um tribunal
aboliu, em 1956, a segregação nos ônibus de Montgomery. Vitórias como essa
foram conquistadas, depois, em outras cidades e em outros setores da sociedade
estadunidense.
Luther
King, ao propor o movimento, inspirava-se na doutrina da resistência pacífica
preconizada com sucesso por Gandhi na luta contra o domínio britânico na Índia.
Nas
eleições presidenciais de 1960, os estadunidenses deram uma apertada vitória ao
democrata John Kennedy, o mais jovem presidente da história do país. Kennedy
não chegou a cumprir todo o mandato. No dia 22 de novembro de 1963, foi morto
em um atentado, quando desfilava em carro aberto na cidade de Dallas, no Texas.
O vice-presidente, Lindon Johnson, concluiu o mandato e, depois, foi eleito
para um novo período.
Durante a
campanha presidencial, Kennedy havia prometido, no plano interno, reformas na legislação
sobre direitos civis, habitação e assistência social. E, no plano externo,
ações para melhorar a imagem dos Estados Unidos, abalada pelo avanço científico
da União Soviética. A preocupação com o bem-estar social e a política externa
teve continuidade no governo Johnson, que desenvolveu o próprio programa,
conhecido como Grande Sociedade.
Nesse
período, ganharam impulso os movimentos reivindicativos dos estudantes, das
mulheres e de várias minorias. A luta contra o preconceito e a discriminação
racial alcançou projeção internacional. Várias organizações estavam engajadas
nesse movimento, que mobilizou milhares de militantes em todo o país.
Em 1963,
Martin Luther King reuniu mais de 250 mil pessoas na Marcha sobre Washington,
em apoio aos direitos civis dos negros. Como resultado das mobilizações, o
Congresso acabou aprovando projetos de lei que proibiam oficialmente a
discriminação racial, transformando-a em crime.
Em 1965,
Luther King liderou outra manifestação, também no Alabama, pela extensão do
direito de voto aos negros. Os manifestantes foram violentamente reprimidos.
Para contornar o impasse, o governo federal, como já havia ocorrido antes,
precisou intervir na questão. O Congresso aprovou a Lei dos Direitos Civis,
garantindo proteção federal, em todo o país, para os negros poderem votar.
O movimento
negro pela igualdade social enfrentou forte oposição, e muitos, como Malcom X (1965)
e Martin Luther King (1968), foram assassinados ao longo dessa luta.
5. Vietnã,
Cuba e outras crises
A
penetração comunista na Ásia era uma das inquietações permanentes dos
estadunidenses.
Depois da
Segunda Guerra Mundial, os EUA investiram pesado na recuperação econômica do
Japão, tentando conseguir um poderoso aliado no continente, capaz de fazer
frente ao avanço comunista. Em 1949, porém, a China se tornou comunista, sob a
liderança de Mao Tse-tung, e, um ano depois, a Coreia entrou numa guerra que
acabou dividindo o país em duas partes, uma delas controlada pelos comunistas.
Por isso,
quando os EUA perceberam que o Vietnã poderia seguir caminho semelhante, decidiram
intervir diretamente no conflito que tomou conta do país.
Cuba, uma pedra no sapato
Na América
Latina, como vimos, a situação começou a se complicar em 1959, com a Revolução Cubana.
Até então, quando os governos latino-americanos confrontavam os EUA, eram
coagidos a mudar de ideia sem dificuldade.
A vitória
de Fidel Castro em Cuba, porém, abalou a hegemonia estadunidense no continente.
Além de se
tornar parte do bloco soviético, Cuba deu ao mundo um exemplo de revolução
bem-sucedida, o que acabou influenciando o restante da América Latina e do Terceiro
Mundo.
6. Reagan:
Guerra nas Estrelas e neoliberalismo
Foi nesse
quadro que, em janeiro de 1981, Ronald Reagan, do Partido Republicano, assumiu
o governo do país. No plano externo, Reagan abandonou a política dos direitos
humanos e endureceu as relações com a URSS; financiou os opositores do governo
sandinista na Nicarágua, e anunciou um gigantesco programa militar de defesa
dos EUA, denominado Guerra nas Estrelas. O programa não chegou a ser
implementado por ser muito caro.
No plano
interno, Reagan implantou o neoliberalismo, realizando profundos cortes nos
gastos públicos, reduzindo o papel do Estado na economia e combatendo o poder
dos sindicatos, ao mesmo tempo que, na Inglaterra, Margareth Tatcher implantava
o mesmo sistema. Em 1984, Reagan foi reeleito presidente. Um ano depois,
Mikhail Gorbachev assumiu o poder na URSS, iniciando as reformas que levariam à
desintegração do Estado soviético e pregando o diálogo com os EUA.
Em 1987,
Reagan e Gorbachev assinaram o primeiro acordo de redução das armas nucleares.
O sucessor
de Reagan foi seu vice, George Bush, eleito em 1988. Bush prosseguiu a
reaproximação com os soviéticos até a dissolução do bloco comunista, em 1991.
Nesse mesmo ano, os EUA comandaram uma aliança militar de 28 países contra o
Iraque, que havia invadido o Kuwait seis meses antes. Mesmo obtendo êxito nas questões
externas, Bush teve sua popularidade comprometida, pois, internamente, aumentou
os impostos e reduziu os gastos a fim de diminuir o déficit público, porém sem
sucesso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário