quinta-feira, 9 de setembro de 2021

 Cabanagem (1835-1840)

A história brasileira não tem nada de pacífica, nem o povo brasileiro é passivo, como às vezes se diz. Tome-se como exemplo a Cabanagem, a mais violenta das revoltas brasileiras. [Atenção: não confundir com a Cabanada, que ocorreu em Pernambuco quase na mesma época.]
Contexto histórico
O palco da Cabanagem foi a antiga província do Grão-Pará, formada pelos atuais estados de Pará, Amazonas, Amapá, Roraima e Rondônia. Sua capital era a cidade de Belém.
Essa província era um foco de tensões desde a época da independência. Vamos lembrar que, desde 1831, o Brasil era governado pela Regência, que substituía D. Pedro II, ainda criança. E também que, no tempo do Império, os presidentes de províncias (hoje chamados governadores de estado) eram nomeados pelo governo central, sediado no Rio de Janeiro.
A província do Grão-Pará tinha cerca de 100 mil habitantes. Grande parte dela era composta de negros (escravos ou não), mestiços e índios. Viviam da extração de produtos da floresta. Tinham como moradias cabanas de pau-a-pique, erguidas nas margens dos rios e igapós da Amazônia; daí veio termo cabanos. E, por constituírem a maioria dos revoltosos, a revolta ficou conhecida com o nome de Cabanagem.
Por conta da situação de miséria a que grande parte da população estava submetida, volta e meia ocorriam pequenas revoltas. Os problemas se agravaram quando o presidente da província, Bernardo Lobo de Sousa, em 1834, tentou colocar em vigor algumas medidas repressivas. Uma delas determinava que os suspeitos de participarem de agitações e revoltas seriam recrutados à força para servir nas tropas governamentais.
Início da revolta
A Cabanagem começou na noite de 6 para 7 de janeiro de 1835. Um grupo de rebeldes ocupou Belém, depois de muitos tiroteios. O governador foi preso e executado, e o poder passou para as mãos dos cabanos.
Entre seus líderes estavam Eduardo Angelim, os irmãos Francisco Pedro e Antônio Vinagre (ambos lavradores), o fazendeiro Clemente Malcher, o jornalista Vicente Ferreira Lavor e o padre Batista Campos.
A tomada do poder não foi a parte mais difícil. A maior dificuldade era manter o poder e estabelecer um governo estável. Não havia projetos e sobravam enormes divergências entre os próprios líderes do movimento. E essa foi a principal causa do fracasso da rebelião.
Clemente Malcher, que assumiu a chefia do governo cabano, jurou fidelidade ao imperador e declarou que permaneceria no poder até a maioridade do herdeiro do trono.
Outros líderes, como Eduardo Angelim e Antônio Vinagre, porém, mais ligados às camadas populares, discordavam de Malcher, e pregavam a ruptura de todos os laços com o poder imperial.
Malcher tentou um golpe, mandando prender os opositores. Estes reagiram, prenderam Malcher, que foi executado. Foi substituído por Francisco Vinagre. Porém, Vinagre insistiu no erro de se declarar fiel ao governo imperial. Negociou uma anistia com o novo governador nomeado pela Regência e entregou o poder. O novo governador, porém, não cumpriu a promessa de anistia, e mandou prender os rebeldes, que tiveram de abandonar Belém e buscar refúgio no interior.
República dos Cabanos
No mês seguinte, em agosto de 1835, cerca de 3 mil cabanos retomaram a capital. Desta vez, proclamaram a República, desligada do Império. O governo republicano chegou a tomar medidas importantes, tais como a introdução de uma moeda, a legalização do porte de armas e o confisco de terras. Mas traições e conflitos entre os líderes enfraqueceram a República dos Cabanos no momento em que precisou lutar para sobreviver.
Isso aconteceu em março de 1836, quando chegaram forças enviadas pelo governo imperial para tomar controle da província. Quatro navios de guerra se posicionaram diante de Belém e bombardearam a cidade. O governo dos cabanos não resistiu. O comandante das forças imperiais, brigadeiro Francisco José de Sousa Soares, assumiu como novo presidente do Grão-Pará, com poderes para exterminar a revolta.
Os rebeldes fugiram e esconderam-se no interior da província. Eduardo Angelim, o último presidente da República cabana, foi preso e enviado para julgamento no Rio de Janeiro.
Apesar de perseguidos, os cabanos continuaram a resistir até 1840, quando os últimos focos foram definitivamente eliminados. Os livros de História registram que, durante todo o conflito, morreram cerca de 40 mil pessoas, ou seja, 40% de uma população de cerca de 100 mil habitantes!
Como lembrança resta, agora, o Memorial da Cabanagem, uma tardia homenagem ao movimento. Em 1985, foi inaugurado, em Belém, um monumento projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário