OS BÁRBAROS GERMÂNICOS NA EUROPA
A
chegada dos povos germânicos
Os
gregos foram os primeiros a empregar a palavra bárbaros para denominar
os povos diferentes, situados fora de sua cultura. Mais tarde, já bastante influenciados
pela cultura grega, os romanos também passaram a chamar de bárbaros os
povos que não pertenciam à cultura greco-romana. A denominação se aplicava
principalmente aos germânicos, hunos e celtas.
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Por
vários séculos, a paz e a guerra marcaram as relações entre romanos e
germânicos. Mas houve um momento em que o equilíbrio se rompeu em favor dos
germânicos. Eles ocuparam o lado ocidental do Império Romano e nele fundaram
seus Estados.
2. Como
viviam os germânicos
Há
diversos registros escritos por romanos sobre os germânicos. Um deles foi
elaborado por Júlio César, que teve contato com esses povos no século I a.C.,
quando combatia os gauleses (no território que hoje corresponde à França).
Outro foi produzido por Cornélio Tácito, autor da obra Germânia,
publicada em 98 d.C., em que o historiador romano escreve sobre moradia,
vestuário, casamento, guerra e diversos outros aspectos da sociedade germânica.
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Guerreiros bárbaros germânicos. Note o uso da calça. Essa foi uma das contribuições dos germânicos para o vestuário europeu. |
Segundo
o relato de Tácito, os germânicos misturavam a vida nômade com o sedentarismo. Embora
vivessem basicamente da criação de gado e da caça, a agricultura ganhava
importância cada vez maior, com base no cultivo do trigo e da cevada. Também
praticavam a cerâmica, a tecelagem e, principalmente, a metalurgia. Seus
instrumentos e armas de ferro eram de excelente qualidade.
Isso
não impedia que, de tempos em tempos, transferissem sua morada para outro
local.
Organização social
dos germânicos
Ainda
de acordo com o relato de Tácito, os germânicos viviam em tribos,
compostas por vários clãs. Esses clãs eram grupos de famílias
aparentadas entre si – uma espécie de grande família. Também eram
considerados membros do clã indivíduos que, mesmo não fazendo parte da família,
dependiam dela. O mesmo acontecia com os escravos, geralmente prisioneiros de guerra.
Cada clã dominava um território com limites bem definidos. Os bosques e as
áreas de pastagens eram de uso coletivo. Eram bens da família apenas o rebanho
e a moradia, considerada templo dos deuses domésticos e local de veneração dos
antepassados.
Os
germânicos davam grande importância à família. Era considerada a base da
sociedade e fora dela o indivíduo perdia sua identidade. Na família, o pai
tinha total autoridade sobre a esposa e os filhos. Em caso de infidelidade da
esposa, ela podia ser repudiada e até morta pelo marido.
Os
filhos só se livravam do poder do pai quando se tornavam guerreiros, por volta
dos 15 anos de idade. As filhas permaneciam sob a autoridade do pai até o
casamento, quando então passavam a obedecer ao marido. Entretanto, as mulheres
tinham o direito de tomar parte, com os irmãos, na partilha da herança dos
pais.
Tudo
isso funcionava de acordo com os costumes, pois os germânicos não possuíam leis
escritas.
A
isso se denomina direito costumeiro ou direito consuetudinário –
sistema jurídico com base no n. Uma das características do direito germânico
era o ordálio, uma forma de julgamento que consistia em submeter o
acusado a uma prova dolorosa, por meio do fogo ou da água. Se o acusado
resistisse, era considerado inocente, pois isso era interpretado como a vontade
dos deuses. Após o fim do Império Romano e o início da Idade Média, o direito
costumeiro germânico permaneceu como parte da cultura europeia.
Importância da guerra
A
principal instituição política entre os germânicos era a assembleia dos
Guerreiros, que reunia os chefes de família e os demais homens livres da
tribo. Ela deliberava sobre as questões mais
importantes (a guerra, por exemplo) e escolhia o rei, cujo poder dependia de
sua capacidade de comando nas guerras.
Os
germânicos guerreavam com frequência. As guerras tinham claro objetivo
econômico, pois era uma forma de obter riquezas, terras e escravos.
Os
guerreiros que tomavam parte nas expedições faziam um juramento de lealdade ao
rei. Caso este morresse em combate, os membros do grupo deviam vingá-lo ou
sucumbir. Assim, a lealdade ao grupo e a morte em combate se revestiam de um
caráter sagrado.
Tácito
usou a palavra latina comitatus para designar esse relacionamento entre
guerreiros, baseado na lealdade. Tornou-se posteriormente um dos elementos que
caracterizaram as relações entre suserano e vassalo no feudalismo.
3. Religião
e mitologia dos povos germânicos
Como
tantos outros povos da Antiguidade, os germânicos praticavam uma religião
politeísta. Não tinham templos: o culto era celebrado a céu aberto. Adoravam
muitos deuses, que em geral representavam elementos da natureza (trovão, Sol,
raio, mar, fertilidade etc.). A divindade mais importante era Odin. Considerado
o protetor dos guerreiros e dos poetas, estava associado ao conhecimento, à
sabedoria e à magia. Montado num cavalo de oito patas, levava sempre consigo uma
lança infalível. Morava numa fortaleza. Nela ficava o valhala, uma
espécie de paraíso, para aonde eram levados os guerreiros mortos em combate.
Segundo as crenças germânicas, ele e racasado com Frigga, deusa do lar e da
fertilidade. Odin e Frigga tinham um filho, Thor, deus da tempestade e do
trovão, que simbolizava a força da natureza. Era representado com cabelos
vermelhos e barba. Como arma, portava um martelo mágico, que, quando lançado,
nunca errava o alvo e retornava às suas mãos. Os anglo-saxões deram o nome de
Thor ao quinto dia da semana, thursday – ou seja, dia de thor. Thor
tinha um irmão, Loki, uma figura de índole maligna, traiçoeira. Seu destino
seria liderar o exército do mal na batalha final contra os deuses, na qual ele
seria morto.
As
crenças germânicas admitiam diversas outras divindades. Sendo uma sociedade
guerreira, um lugar de destaque cabia às valquírias. Eram divindades
menores, representadas por mulheres jovens, armadas de lança e escudo, que
sobrevoavam os campos de batalha montadas em cavalos brilhantes. Recolhiam os
guerreiros mortos em combate e os levavam para o Valhala, onde eles eram
recompensados por sua coragem.
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Deuses germânicos. |
Essa
religião tradicional dos povos germânicos começou a desaparecer no século IV,
dando foi substituída pelo cristianismo.
4. Fronteira:
local de encontro entre civilizações
Os
romanos fizeram várias tentativas para conquistar a Germânia, e todas resultaram
em fracasso. Uma dessas tentativas, ocorrida no ano 9 da Era Cristã, três
legiões romanas foram aniquiladas por uma aliança de povos germânicos na
Batalha da Floresta de Teutoburgo, em que foi morto o próprio comandante
romano. Depois disso, os romanos desistiram de conquistar a Germânia e adotaram
a seguinte estratégia: fortalecer a fronteira (limes) do Império na
Europa, fixada nos rios Reno e Danúbio, e ali concentrar poderosos exércitos
que pudessem conter as investidas dos germânicos.
Por
muito tempo, a estratégia funcionou: salvo uma ou outra incursão, esses povos
foram mantidos à distância. Isso, entretanto, não quer dizer que romanos e
germânicos fizessem guerras entre si todo o tempo. Ao contrário: os contatos
amistosos entre os dois lados intensificaram-se com o passar do tempo.
O
governo de Roma reconhecia o valor guerreiro dos germânicos. E, desde
Diocleciano, que reinou de 284 a 305, o governo romano passou a admiti-los com
frequência cada vez maior no exército imperial. Diversos chefes germânicos
ocuparam elevados cargos no exército romano.
Além
disso, algumas tribos foram autorizadas a se estabelecer no interior das
fronteiras. Tornavam-se então “federados”, quer dizer, “associados” de Roma,
com direito a preservar sua organização social e política. Recebiam terras para
cultivo e criação de gado. Em troca, deviam ajudar na defesa do Império. O
resultado desse intercâmbio foi a gradativa “germanização” do exército romano.
5. Os
germânicos também mudam seu modo de vida
Muita
coisa mudou também na vida dos germânicos. De fato, os arqueólogos têm encontrado nos assentamentos
germânicos moedas e muitos outros objetos de origem romana. Isso comprova que o
comércio devia ser algo comum na fronteira que separava os dois povos. Com as mercadorias,
seguiam também influências culturais. No campo religioso, o cristianismo estava
rapidamente fazendo seguidores entre os germânicos e chegou a ser adotado por
vândalos, visigodos, ostrogodos, suevos, burgúndios e lombardos. Eles, porém,
seguiam uma versão do cristianismo chamada arianismo, que era combatida
pela Igreja Católica. Mas o fato de serem cristãos já os tornava mais próximos
da cultura romana.
6. Causas
das invasões germânicas
No
século IV, uma combinação de fatores favoreceu a invasão do Império Romano
pelos germânicos. Sabemos que esse desejo de ocupar as terras do Império Romano
já era antigo, e aumentava à medida que crescia a população entre as tribos
germânicas. Essa pretensão foi contida enquanto o Estado romano se manteve
forte. Porém, a defesa das fronteiras ficou cada vez mais difícil, em virtude da
crise que enfraquecia o Império.
A
situação se agravou rapidamente a partir do século IV com a chegada dos hunos
à Europa. Os hunos eram notáveis cavaleiros e pastores provenientes de uma
região da Ásia localizada ao norte da China.
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Guerreiros hunos. |
No
caminho, encontraram os godos, povo germânico dividido em duas grandes tribos:
ostrogodos e visigodos. Os primeiros a enfrentar os hunos foram os ostrogodos.
Derrotados, bateram em retirada e invadiram o território de seus vizinhos e
parentes, os visigodos. Estes, então, pediram e obtiveram autorização do
Império Romano para atravessar a fronteira e se estabelecer ao sul do Rio
Danúbio.
O
relacionamento entre os romanos e os visigodos, porém, não foi nada pacífico.
Estes reclamavam que eram maltratados pelos funcionários romanos. A situação
acabou provocando uma revolta dos visigodos. Em 378, eles derrotaram o exército
romano na Batalha de Adrianópolis, na qual o próprio imperador Valente perdeu a
vida. Apesar dessa vitória, os visigodos ainda permaneceram na região por
alguns anos. Depois, sob a liderança de Alarico, avançaram em direção à
Península Itálica.
Em
410, tomaram e saquearam Roma, de onde seguiram para a Gália e a Espanha. Ali
se fixaram e, mediante um acordo, tornaram-se aliados de Roma.
7. A
ocupação do Império pelos germânicos
Na
mesma época em que os visigodos tomavam o rumo da Itália, outras tribos
germânicas atravessavam as fronteiras romanas, às vezes, sem encontrar
resistência, em virtude do enfraquecimento geral do Império.
Os
vândalos, acompanhados dos alanos e suevos, passaram pela Gália e ocuparam a
Espanha (antes da chegada dos visigodos). Os suevos estabeleceram-se na
Lusitânia (parte do atual território de Portugal).
Os
alanos se dividiram: alguns ficaram na Península Ibérica e outros seguiram os
vândalos na invasão do norte da África. Nas imediações da antiga Cartago, os
vândalos fundaram um grande reino. Nos anos seguintes, conquistaram a Sicília e
outras ilhas do Mediterrâneo. Em 455, tomaram Roma. A cidade foi submetida a um
saque que durou 14 dias seguidos. Da ação destruidora desse povo derivou a
palavra vandalismo, usada para designar atos de destruição.
Alamanos
e burgúndios estabeleceram-se na Gália. Também os francos escolheram a Gália
para morar e ali se fixaram. Os francos foram aliados dos romanos, e por algum
tempo ajudaram Roma a combater seus inimigos. A expansão de seus domínios
permitiu que o reino fundado pelos francos viesse a ter grande importância nos
séculos iniciais da Idade Média.
Em
meados do século V, anglos e saxões desembarcaram na Grã-Bretanha, que havia
sido abandonada alguns anos antes pelos romanos. Venceram a resistência da
população local, formada por celtas e bretões, e ocuparam a ilha: os saxões
estabeleceram seu reino no sul da ilha e os anglos se fixaram no centro e no
norte. Os idiomas falados por esses invasores iriam dar origem ao inglês.
8. O fim do Império Romano do Ocidente
8. O fim do Império Romano do Ocidente
O
Império Romano, que se julgava invencível e eterno, ia rapidamente sendo
dominado pelos povos germânicos. Diversos imperadores se sucederam no poder em
Roma, mas nenhum conseguia reunir forças sufi cientes para impedir o declínio
do Império.
Por fim, em 476, Odoacro, um chefe germânico que tinha se tornado general do exército romano, destronou o último dos imperadores: era um menino de apenas 12 anos que carregava o pomposo nome de Rômulo Augusto. Odoacro enviou os símbolos do poder imperial (coroa e cetro) ao imperador do Oriente e se proclamou rei. Seu reinado durou até 493, quando todo o Império Romano no Ocidente caiu em poder de outro povo germânico, os ostrogodos.
Por fim, em 476, Odoacro, um chefe germânico que tinha se tornado general do exército romano, destronou o último dos imperadores: era um menino de apenas 12 anos que carregava o pomposo nome de Rômulo Augusto. Odoacro enviou os símbolos do poder imperial (coroa e cetro) ao imperador do Oriente e se proclamou rei. Seu reinado durou até 493, quando todo o Império Romano no Ocidente caiu em poder de outro povo germânico, os ostrogodos.
Quando
o século V terminou, toda a parte ocidental do Império Romano estava tomada
pelos reinos germânicos. Entre eles, os mais importantes eram o dos vândalos,
no norte da África; o dos visigodos, na Espanha; os reinos dos anglos e dos
saxões, na Grã-Bretanha; o dos francos, na Gália; e o dos ostrogodos, na
Itália.
A
queda do último imperador, em 476, assinalou o fim do Império Romano do
Ocidente. Posteriormente, os historiadores escolheram essa data para marcar o
fim da Antiguidade e o começo da Idade Média.
O nascimento da Europa medieval
A queda do Império Romano do Ocidente ocorreu menos pela
força dos invasores do que pelo enfraquecimento das forças romanas, provocado
por uma crise que já durava mais de dois séculos.
Essa crise levou ao declínio do trabalho escravo, das
cidades, da economia mercantil e monetária, e também ao colapso da proteção que
o Estado romano devia oferecer à população.
A chegada dos germânicos acentuou essas tendências e
ainda acrescentou novos elementos à realidade europeia. Entre eles estava, por
exemplo, a ideia de obrigações recíprocas entre o chefe e seus guerreiros.
Nesse universo em transformação, um papel especial coube
à Igreja Católica, praticamente a única instituição que conseguiu sobreviver
intacta. Ela preservou um importante aspecto da cultura romana, a língua
latina, que os germânicos aprenderam a falar; e conseguiu, em meio a muitas dificuldades,
converter os germânicos à versão oficial do cristianismo.
Em síntese, as tendências da sociedade romana, somadas às
instituições trazidas pelos germânicos e ao papel desempenhado pela Igreja,
lançaram as bases de uma nova sociedade que se formou na Europa da Idade Média
– a sociedade feudal.
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