O ISLÃ
Surge uma nova religião
Enquanto na Europa ocidental, a sociedade se estruturava com base nos feudos, na Península
Arábica ocorria um processo político-religioso que iria afetar não só o destino
dos árabes, mas também o dos povos europeus.
Esse
processo teve início com a criação da religião muçulmana (ou islã) pelo profeta
Maomé. A nova crença ganhou rapidamente adeptos entre os povos árabes. Unificados
política e religiosamente pelo islã, eles empreenderam um movimento
expansionista cujo objetivo era converter os povos vizinhos.
A
expansão árabe alterou radicalmente o mapa político da região do Mar
Mediterrâneo. Desde essa época, a influência muçulmana não parou de crescer e
hoje se faz sentir em cerca de um quinto da população mundial.
2. Os
árabes do deserto
A
Arábia é uma grande península localizada no Oriente Médio. A maior parte de seu
território é constituída de desertos. Inúmeros oásis, porém, tornavam possível a
vida dos beduínos, como eram chamadas as populações árabes que viviam no
deserto.
Ao
sul, na região fértil do atual Iêmen, e ao longo da costa ocidental da
península, acompanhando o Mar Vermelho, ficavam as rotas percorridas pelas
caravanas de comércio que iam até Bizâncio, a oeste, e rumavam para a Índia, no
leste.
Como
consequência da atividade dessas rotas de comércio, surgiram na península
alguns centros urbanos, sendo os mais importantes Meca e Yatreb.
Meca,
centro comercial e religioso
Situada
num estreito vale em meio a uma região árida, Meca tornou-se importante centro
de peregrinações religiosas dos beduínos. Em Meca ficava a Caaba, santuário que
abrigava inúmeros ídolos, além da Pedra Negra — provavelmente um pedaço de
meteorito —, considerada sagrada. Além desse, existiam outros locais na cidade
considerados importantes para os cultos politeístas dos povos árabes antigos.
3. Maomé,
o profeta
A
vida dos árabes passou por uma completa transformação com o advento de uma nova
religião. Seu fundador foi Maomé, nascido em Meca, provavelmente em 570. Órfão
desde pequeno, Maomé foi adotado por um tio e se integrou às atividades
comerciais da família. Duran te grande parte da vida, foi condutor de
caravanas, o que lhe permitiu entrar em contato com outros povos e conhecer
outras culturas e religiões.
Segundo
a tradição, quando Maomé estava com cerca de 40 anos, começou a ter revelações.
Em uma delas, o anjo Gabriel teria lhe dito: “Há um só Deus, Alá, e Maomé é seu
profeta”. A partir dessas revelações, ele passou a pregar uma nova religião, o islã,
que significa submissão a Deus. Seus principais fundamentos incorporavam
crenças árabes tradicionais, judaicas e cristãs.
Após
converter a própria família, Maomé passou a pregar o islã aos beduínos, em
Meca. Os comerciantes da cidade, entretanto, receavam que o monoteísmo pregado
pelo islã afastasse os peregrinos e prejudicasse seus negócios. Hostilizado e
perseguido, Maomé fugiu de Meca, refugiando-se na cidade de Yatreb (hoje
conhecida como Medina, isto é, cidade do profeta). O ano da fuga de
Maomé (Hégira, em árabe), ocorrida em 622, é considerado o primeiro do
calendário muçulmano.
Em
Medina, Maomé continuou pregando a nova religião, transformando-se em líder
religioso, mas também político. Conseguiu reunir muitos aliados entre os
comerciantes e os beduínos convertidos e, em pouco tempo, o islamismo
conquistou muitos seguidores, impondo-se por toda a Arábia por meio da pregação
e da força.
Em
630, Maomé retornou vitorioso à cidade sagrada. Retirou da Caaba todas as
imagens de deuses do culto politeísta, dedicando o templo unicamente à adoração
de Alá.
Maomé
faleceu pouco depois. Tinha então organizado um Estado teocrático e lançado os fundamentos
ideológicos de um grande império. Foi sucedido por califas (palavra que significa
“substituto”), tendo os quatro primeiros sido escolhidos entre os familiares do
profeta, começando por um de seus sogros, Abu Beker.
4. Preceitos
religiosos
A
prática do islã se chama islamismo, e aos fiéis se dá o nome de muçulmanos,
maometanos ou islamitas. Os ensinamentos de Maomé foram reunidos no Corão,
o principal livro sagrado dos muçulmanos. Há também a Suna, texto
sagrado que reúne tradições, isto é, atitudes adotadas em vida por Maomé que
devem ser praticadas pelos fiéis.
O seguidor
do islã deve submeter-se às seguintes práticas:
• afirmar
publicamente que “só há um Deus, Alá, e Maomé é seu profeta”;
• orar
cinco vezes por dia, voltado para Meca;
• praticar
a caridade: quem tem muito deve dar a quem nada tem;
• jejuar no
mês do ramadã (o nono mês do ano islâmico) todos os dias, do alvorecer até o
começo da noite;
• peregrinar a Meca pelo
menos uma vez na vida e orar na Caaba.
Entre os
preceitos do islamismo está a ideia da jihad (guerra santa),
ou seja, da propagação do islã pela força. Segundo Maomé, se um muçulmano
morresse na luta pela expansão da religião, alcançaria o paraíso. Hoje, a
interpretação da guerra santa é tema controverso entre os muçulmanos. O Corão,
segundo alguns intérpretes, afirma não ser válida a conversão ao islamismo pela
força.
Na verdade,
o islã é mais do que uma religião, pois estabelece regras que orientam a vida
de cada um e de toda a sociedade, mesmo quanto à organização política. Esse
tipo de orientação faz com que, no islamismo, não se dissocie o poder do Estado
do da religião.
No Corão
(também chamado Alcorão) encontram-se recomendações que regem o
funcionamento das instituições públicas e da vida privada. Entre os princípios
registrados no livro sagrado estão normas para o trabalho, para o poder militar,
para o casamento etc.
5. Uma
expansão fulminante
Até
sua morte, Maomé havia unificado os povos árabes sob uma mesma religião e
regime político. O empenho com que os árabes se entregaram à tarefa de expandir
o islã – cumprindo o preceito da guerra santa – traduziu-se na extraordinária
rapidez de suas vitórias. Sucessivamente, caíram sob seu domínio as regiões
conhecidas atualmente como Síria (636), Iraque (637), Egito (642) e Irã (651).
Pouco depois, a conquista chegava até a Índia. Em 660, a capital do Império
passou a ser Damasco e, no século seguinte, Bagdá, às margens do Rio Tigre.
Essa
rápida expansão foi favorecida pelo esgotamento em que se encontravam os
impérios Bizantino e Persa, que haviam guerreado longamente entre si. O
descontentamento com a política de exploração e de perseguições religiosas,
praticadas por bizantinos e persas, levou muitos povos a ver os árabes como
libertadores. Além disso, os árabes adotavam uma atitude relativamente tolerante
em relação aos povos dominados, os quais podiam manter a própria religião,
devendo, porém, reconhecer a supremacia do islã e pagar certos impostos.
Do
Egito, os muçulmanos avançaram pelo norte da África. Em 711, atravessaram o
Estreito de Gibraltar e, aproveitando-se da fragmentação dos visigodos, conquistaram
a Península Ibérica.
Convém
esclarecer que os invasores da Península Ibérica não foram exatamente os
árabes, mas os mouros. Esse era o nome dado ao povo berbere, do noroeste da
África, convertido ao islamismo.
O
avanço dos muçulmanos foi detido em 732 pelos francos, comandados por Carlos
Martel, na Batalha de Poitiers. Apesar da derrota, os muçulmanos árabes
assegurariam o controle do Mediterrâneo durante boa parte da Idade Média.
Nos
séculos seguintes, o Império Islâmico sofreria numerosas divisões, embora a
língua e a religião tenham sido fatores que preservaram a identidade cultural
entre os povos árabes.
6. Xiitas
e sunitas
Não
muito tempo depois do surgimento do islã, os muçulmanos dividiram-se em três
grandes seitas. As duas mais importantes, do ponto de vista político e
religioso, são a xiita e a sunita. A seita dos xiitas surgiu após a morte de
Ali Ibn Abu Talib, casado com Fátima, filha do profeta Maomé.
Seus
adeptos não aceitavam como sucessor nenhum homem que não fosse da família de
Maomé.
Por
sua vez, os sunitas se originaram daqueles que apoiaram Moawiya Ibn Abi Sufi
yan, que se tornou califa depois da morte de Ali. Desde então, eles constituem
a maioria do mundo muçulmano – são hoje cerca de 80% dos adeptos do islamismo.
Do ponto de vista religioso, os sunitas diferem dos xiitas – que não aceitam
nenhuma fonte de ensinamento além do Corão –, pois dão grande
importância aos ensinamentos contidos na Suna.
Existe
uma terceira seita, a dos sufistas. São adeptos de um ideal místico e ascético,
que preconiza o distanciamento do mundo material e das preocupações mundanas.
Seus integrantes praticam a meditação e o isolamento e valorizam a prática de
cânticos, música e dança.
6. Consequências
da expansão
A
expansão do islamismo trouxe significativas mudanças na vida europeia durante a
Idade Média. O domínio árabe na Península Ibérica e o bloqueio do Mediterrâneo
acentuaram a decadência do comércio e o processo de ruralização da economia na
Europa, contribuindo para a consolidação do feudalismo.
Por
intermédio dos árabes, foi introduzido na Europa o cultivo do arroz, da
cana-de-açúcar, do algodão, da laranja, do limão, da alface e da amora.
No
que diz respeito aos conhecimentos científicos, os árabes trouxeram importantes
contribuições, especialmente no campo da álgebra, e introduziram os algarismos
arábicos. De suas experiências com a alquimia, resultaram produtos como
o ácido sulfúrico e o álcool, além do próprio estudo da química. Muitas obras
de Aristóteles foram traduzidas para o árabe e divulgadas na Península Ibérica
e na Europa, incorporando-se, mais tarde, à doutrina cristã graças a São Tomás
de Aquino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário