OS INDUSTRIAIS DE SÃO PAULO E FORD
Preço justo é o mais baixo por que possa vender-se um artigo e salário justo o mais alto que a indústria possa pagar. (Ford, 1925, p. 182)
Ford considera que o operário faz parte da
massa dos consumidores e que o poder aquisitivo das massas populares repousa
nos salários; de fato, a proporção dos salariados numa sociedade é muito maior
do que a dos que vivem de renda. Os salários, prova de trabalho, asseguram a
continuidade deste criando um poder aquisitivo que se renova incessantemente; o
salário é, portanto, o criador do trabalho. Nessas condições os salários são
tão importantes para a indústria em si como para a classe operária. (Simonsen,
1931, p. 19-20)
Necessitamos levantar o padrão de vida
brasileiro, aumentar o nosso poder aquisitivo e valorizar o homem no Brasil.
Dêem à indústria o que ela necessita: aparelhamentos financeiros de que dispõem
as nações civilizadas, leis harmônicas de defesa da produção, liberdade de
atuação dentro do mercado brasileiro pela supressão das barreiras
inter-estaduais e a indústria poderá concorrer poderosamente para o
enriquecimento do Brasil com sadios reflexos em nossos problemas sociais e na
organização política administrativa de que carecemos. (Simonsen, 1931, p.
51-52.)
Fordismo
permanece um elemento-chave no debate sobre as relações entre patrões e
operários nas décadas de vinte e trinta no Brasil. Cabe lembrar aqui as
posições de Werneck Vianna e De Decca, cujas obras, bastante divulgadas
(Vianna, 1976; Decca, 1984), ocupam lugar destacado no cenário das ciências
humanas no país.
Para Vianna, “fordismo” associa-se a uma auto-limitação dos industriais
aos “muros das fábricas” e a uma posição subordinada destes no quadro das
relações de poder no interior das camadas dominantes (Vianna, 1976, p. 71-85).
De Decca nega a reclusão dos industriais ao mundo da fábrica, mas mantém,
embora com restrições, a idéia de um “fordismo” dominante entre eles. O autor
chama atenção para o surgimento, no final dos anos vinte, de um projeto político
que extravasaria o universo fabril e que atribuía uma posição de proa aos
industriais. Ao mesmo tempo em que significaria o abandono do fordismo em sua
“ortodoxia” (já que, contrariamente à “cartilha de Ford”, se cria uma entidade
de classe – o CIESP
– e se define uma proposta política dentro de um partido – o PRP), esse projeto
representaria também uma forma de cumprir o escopo fordista – “generalizar a
paisagem industrial para o conjunto da sociedade”, para isso apresentando
indústria e economia cafeeira como complementares e apontando para a
predominância da primeira como um desdobramento natural da última (Decca, 1984,
p. 150-155).
Enquanto Vianna sublinha em “fordismo” a busca do controle sobre a vida
privada do operário e a oposição à regulamentação legal das relações de
trabalho, com a perspectiva dos “altos salários”, De Decca focaliza a idéia de
racionalização da produção, presente nesse discurso[1].
A referência básica nas discussões a respeito de fordismo no Brasil é o
memorial contra a lei de férias, enviado por entidades industriais ao Conselho
Nacional do Trabalho em junho de 1927. Além deste documento, podem servir como
referência também outros dois memoriais contra leis sociais: o Código de
Menores e a lei de seguros contra doenças. Há ainda outras referências, mais
fragmentárias. Mas o primeiro é o que mais procura se apoiar em afirmações de
Ford e o que, provavelmente por isso mesmo, é o mais citado como evidência de
fordismo[2].
E é por esse motivo que centraremos nossas considerações na análise deste
texto. O momento em que aparece é marcado pela presença proeminente, no meio
industrial, do CIFT
(Centro dos Industriais de Fiação e Tecelagem), sediado em S. Paulo, e o
discurso mais em evidência, nesse meio, é o de Otávio Pupo Nogueira, seu
secretário-geral[3].
Nesse memorial, há diversas passagens que podem servir de base para uma
atribuição de “fordismo” aos industriais.
A epígrafe é uma citação do próprio Ford: “não podereis fazer maior mal
a um homem do que permitir que folgue nas horas de trabalho”. Um pouco mais à
frente, aparece o tema dos “altos salários”. afirma-se que “a única finalidade
do proletário é o trabalho bem remunerado”. O “grande problema” do “operário
nacional” é o “salário alto”. Tanto é que “todas as paredes foram provocadas
por questões de salários e todas elas solucionadas por meio de sucessivas
elevações de salários”. Se “reivindicações de outra natureza” surgiram em
“paredes provocadas por desejos de ganho maior”, o fato pode ser explicado por
“manejos criminosos de agitadores profissionais, useiros em fazer almoeda de
ideais avançados, que a massa proletária jamais compreendeu ou adotou
conscientemente”.
Na seqüência do texto, mostra-se uma suposta preocupação com a vida
privada do operário. Para seu autor, teria ficado provado na Conferência
Internacional do Trabalho que “lazeres mal preenchidos, atuam na alma
proletária como fator dissolvente das suas qualidades mais nobres” (fls. 8 e
9). O trecho seguinte é bastante conhecido:
“Os lazeres, os ócios,
representam um perigo iminente para o homem afeito ao trabalho, e nos lazeres
ele encontra seduções extremamente perigosas, se não tiver suficiente elevação
moral para dominar os instintos subalternos que dormem em todo ser humano.”
A argumentação é reforçada apontando-se uma diferença entre empregados
de escritório e operários, recurso que, no documento, foi utilizado para
justificar a idéia de que os operários não precisavam de férias[4].
Afirmando que a “massa proletária” não se submetia a ser fotografada
(uma das exigências da lei), o texto dizia:
“O proletariado é cioso da
sua liberdade e, no mundo inteiro, rebela-se contra toda e qualquer intromissão
na sua vida privada. Como impor-se a uma classe social, tão susceptível, o
cumprimento de requisitos humilhantes de uma lei que ela jamais desejou e que
não lhe traz nenhum benefício?”
O imputado “fordismo” aqui perde um pé: num documento que representa
oficialmente a posição patronal, descarta-se a possibilidade de interferir
decisivamente na vida particular do operário. A fatal atração das ruas é peça
fundamental em sua argumentação contra as férias; perderia sua força de
convencimento se fosse admitida a possibilidade de controle ou influência
durante o tempo livre. Assim como elementos do discurso de Ford foram usados
para dar força de convencimento à argumentação, outros, inconvenientes, são
descartados.
É preciso observar, por outro lado, que, no memorial contra o projeto
Agamenon Magalhães de criação das Caixas de Assistência e Seguro Social,
enviado, também em 1927, ao presidente da Comissão de Legislação Social da
Câmara dos Deputados, seu autor[5]
manifestava uma compreensão do pensamento de Ford diversa daquela presente nas
obras dos analistas que abordaram o assunto, mencionados no presente capítulo:
“O proletariado,
em geral, adota a fórmula da American Federation of Labor, ou seja, a fórmula
mais tarde divulgada e defendida por Henry Ford: ‘salários altos’ e plena liberdade de ação do proletariado, no
que toca a sua vida íntima.”(fl. 21, grifos nossos.)
Coerentemente, o tripé atribuído
ao fordismo – salários altos, produção de massa e controle da vida particular
do operário – sofre a amputação deste último elemento.
É de se notar que a obra
propagandística do empresário norte-americano pode fornecer apoio para essa operação. É o caso do seguinte
parágrafo de “Minha vida e minha obra” (Ford, 1925, p. 174), que se refere ao
modo de pagamento na Ford:
“Podem ser feitas algumas
objeções contra os prêmios de bom comportamento, por favorecer de certo modo um
protecionismo patriarcal que não cabe na indústria. Já está fora de moda a
proteção que se intrometia na vida íntima dos empregados.”
Não podemos ignorar que textos como este, de cunho autobiográfico, de
autoria daquele industrial, têm por função não apenas divulgar seus feitos,
como também defendê-lo de acusações que circulavam na época, entre as quais a
de intromissão na vida particular dos operários.
Contudo, houve um evidente deslocamento de sentido na transposição de
fragmentos da fala de Ford para o documento contra a lei de férias. É útil
rememorar o contexto dessas passagens no discurso do industrial. O autor do
memorial utilizou a tradução de Hoje e
amanhã feita por Monteiro Lobato e publicada em 1927, mesmo ano em que foi
apresentado o documento (Ford, 1927). As citações que fazemos a seguir
pertencem a essa edição.
Vejamos a frase empregada como epígrafe no memorial:
“Não podereis fazer maior
mal a um homem do que permitir que folgue nas horas de trabalho.”
A idéia principal do texto enviado à Câmara é a de que as férias serão
prejudiciais ao próprio operário. A frase, colocada, como está, em epígrafe,
impregna-se de tal significado. No contexto da argumentação de Ford, o sentido
é inteiramente diverso.
O efeito da operação foi dissociar a prática de Ford com relação ao
processo de trabalho na fábrica de sua concepção – fundamental – a respeito de
salário. Diz ele:
“Preço justo é o mais
baixo por que possa vender-se um artigo e salário justo o mais alto que a
indústria possa pagar.”(p. 182)
Dessa forma, na concepção do industrial norte-americano, preço e
salário potencializam-se mútua e inversamente. Quanto mais baixo o preço, mais
se vende o artigo; quanto mais alto o salário, mais permite comprar; baixando o
primeiro, o segundo aumenta relativamente àquele; se o salário aumenta, o preço
baixa em relação a ele; ocorrendo ambos os processos ao mesmo tempo (a baixa do
preço e o aumento do salário), o efeito seria, para usar uma expressão
aproximada, mutuamente potenciado: aumenta “geometricamente” (o termo é nosso)
o mercado consumidor.
Mas, para Ford, a redução do preço e o crescimento do salário só podem
ocorrer se o trabalho for potenciado
ao máximo, o que acarreta a sua máxima
utilização possível. Assim como o preço deve ser o menor possível, o trabalho
deve ser o mais intenso possível, para que o processo continue num crescendo (o termo é nosso):
“(...) a
compra do trabalho equivale à compra de qualquer outra cousa: deveis receber o
correspondente ao vosso dinheiro. Cada vez que deixardes um operário dar-vos
uma soma de trabalho inequivalente ao salário que lhe pagais, estareis
contribuindo para reduzir esse salário e para tornar a vida mais difícil ao
assalariado. Não podereis, por exemplo,
fazer maior mal a um homem do que permitir-lhe que folgue nas horas de trabalho.
A razão é clara e devia evidenciar-se a todos: menos um homem trabalha, menos
cria força aquisitiva – isto é, diminui o número de pessoas que requerem seus
serviços.” (p. 183, grifos nossos.)
Ou seja: permitir que o operário folgue significa reduzir ou deixar de
aumentar a produção; com isso, aumentar ou deixar de reduzir o preço dos
artigos produzidos; com isso, reduzir ou deixar de aumentar o número de pessoas
que podem comprá-los, isto é, reduzir ou deixar de aumentar o poder aquisitivo dos
compradores; com isso, reduzir ou deixar de fazer crescer os ganhos da empresa;
e, com isso, fazer reduzir ou deixar de crescer os salários, que saem desses
ganhos.
Consideremos outro trecho, bastante longo, citado no memorial:
“Não há dúvida que caminhamos
mais depressa do que outrora. Ou, precisando, que somos movidos com mais
rapidez. Todavia, serão vinte minutos de automóvel cousa mais cômoda ou mais
penosa do que quatro horas de caminhadas a pé por caminhos poeirentos? Ao termo
da viagem, qual dos dois processos deixa em melhor estado o viajante? Qual lhe
deixa mais tempo e mais energia mental? E breve estaremos fazendo numa hora,
por via aérea, o que hoje nos rouba dias de automóvel. Seremos então ruínas
nervosas?
“Mas esta
depressão nervosa existirá na vida ou só nos livros? Muito falam livros da
depressão nervosa dos trabalhadores – mas confessam-na eles?
“Consultai os
que estão a lidar na tarefa da vida, do operário que viaja de bonde para o seu
trabalho ao homem que atravessa o continente num dia. Vereis atitudes muito
diversas. Em vez de se furtarem ao que
já veio estão a olhar com esperançosa ansiedade para o que está vindo. Sempre
boa vontade para o sacrifício do hoje em prol do amanhã. Esta é a felicidade do
homem ativo, do que não se encafua numa biblioteca, experimentando ajeitar o
novo mundo a velhos moldes. Ide ao operário que segue no seu bonde.
Consultai-o. Dir-vos-á ele que, poucos anos atrás, voltava para casa tão tarde
e exausto que nem ânimo e tempo tinha de trocar de roupa – jantava e atirava-se
à cama. Agora muda de roupa na oficina, regressa à casa inda de dia, janta mais
cedo e sai com a família a espairecer. E dizendo isso esse operário dirá que o
tempo da compressão terrível já passou. Poderá o homem hoje ser mais mercantil
no seu trabalho, mas o tempo do velho e exaustivo mourejar sem fim passou.” (p.
12-13)
Ford estava respondendo à crítica à intensificação
do trabalho:
“Murmura-se por aí do
operário sacrificado na engrenagem da tarefa, diz-se que o que se chama
progresso se faz a expensas disto ou daquilo e, ainda, que a eficiência está
destruindo todas as cousas belas da vida.” (p. 11-12)
Como se pôde notar, à crítica às mudanças no processo de trabalho
implementadas nas fábricas Ford, ele opôs aquilo que acredita ter sido o resultado
destas: o encurtamento do tempo despendido no transporte, que permitiria ao
operário uma vida mais folgada.
Porém, no memorial, o trecho serve para embasar a idéia de que o
trabalho do operário, por não ser “cerebral”, não cansa tanto que requeira férias.
Um pouco mais adiante, o autor do documento junta, numa só seqüência,
três parágrafos do livro de Ford, que, neste, estão separados, distantes entre
si por muitas páginas. Forma-se um conjunto em que adquirem significado muito
diverso daquele que tinham no texto original, servindo assim aos propósitos de
argumentação do memorial.
“Quem pensa com acerto
sabe que o trabalho vale pela salvação da raça – moral, física e socialmente.
“Há diferença entre o
trabalhar duramente e o trabalho duro. Quem trabalha duramente produz algo, ao
passo que o trabalho duro é o menos produtivo.
“Os obreiros de ganho
precário, trabalhando este mês e vadiando à força no mês seguinte, acabam
endividando-se para com os fornecedores e senhorios, o que lhes vale por
agravação do preço de tudo: quem compra a crédito não pode discutir preço.”(fl.
7-8)
Ao primeiro deles (usado também em outros
documentos patronais, enviados a autoridades, nos quais se argumentava contra o
Código de Menores) foi vinculada a idéia de que as férias, permitindo ao
operário o contato com as ruas, iriam “estragá-lo”, enquanto o trabalho, por
impedir que isso ocorra, teria o efeito contrário.
A referência de Ford, contudo, é outra. O sentido se esclarece com uma
citação mais extensa:
“A razão do descrédito da
direção política está no hábito em que caíram os povos de pedir a ela o que só
a indústria pode dar. É o que não compreendem os reformadores profissionais.
Julgam que à política é dado fazer o que só cabe à indústria, e propõem
regulamentações de preços, disto e daquilo, certos de assim conseguirem a
prosperidade.
“Há o desejo
da prosperidade decretada por leis – e é natural que seja assim, dada a idéia
geral que vê o trabalho como o castigo da vida. Quem pensa com acerto, entretanto, sabe que o trabalho vale pela
salvação da raça – moral, física e socialmente.”(p. 25, grifos nossos.)
A idéia aqui nada tem a ver com a expressa no
memorial. Ford alude à potencialidade do trabalho, aproveitado eficientemente,
para criar prosperidade. Isto é, não seria criando leis, mas buscando o aumento
sempre maior da produtividade do trabalho que se iria melhorar a vida: assim,
seria possível diminuir o preço dos bens, aumentar os salários, abrindo cada
vez mais o acesso das pessoas aos meios de melhorar sua vida.
Quanto ao segundo parágrafo dos três transcritos acima, trata-se apenas
de uma imagem usada para reforça a idéia de que nas fábricas brasileiras os
operários não se esfalfavam até o esgotamento.
O último desses parágrafos (que é também o último fragmento do livro de
Ford citado no documento) evidencia, por sua seleção, outra forma de
instrumentalizar o discurso do empresário norte-americano. Nele, Ford estava
apontando os efeitos da prática dos industriais que visavam lucro imediato,
aproveitando as circunstâncias mais favoráveis e interrompendo a atividade
quando aquelas não mais se apresentassem, isto é, aqueles que miravam o
“lucro-causa” e não o “salário-causa”, não se movendo pelo “espírito de
serviço”. Esse parágrafo completava o sentido de outro, imediatamente anterior,
em que se lê:
“(...) era tido como fora
de dúvida que as fábricas deviam localizar-se perto do ‘mercado de trabalho’,
em vista de julgar-se também fora de dúvida que a fabricação tinha de ser
intermitente. Com efeito, se uma fábrica tem de estar a abrir e fechar as
portas continuamente, ser-lhe-á vantajoso contar com um grupo de bons operários
sem serviço, prontos para ingressar na fábrica sempre que esta os chame.” (p.
168)
Ford, portanto, responsabilizava
os patrões pela ausência de trabalho
para o operário, por sua constante mudança de emprego. No memorial, a assertiva
é invertida: a responsabilidade por
esse estado é do próprio operário. Veja-se o seguinte trecho desse documento:
“O operário brasileiro é
pouco eficiente, e isso se explica.
“Ele é um
operário ocasional, que muda de profissão diferentes vezes na sua vida. É
operário, como já foi agricultor e como será comerciante. Ainda não formamos,
com caracteres estáveis, as dinastias operárias, que fazem a força das
indústrias dos velhos países industriais. O nosso operário não tem amor ao seu
ofício, pois que ele não é a finalidade de sua vida, e não põe no exercício de
seu mister aquela alma, que o operário europeu, estável, põe no seu.”(fl. 6-7)
Segundo o texto, as férias, acrescentadas aos
domingos e feriados, iriam desestimular mais ainda o “amor ao trabalho” (fl.
7).
Outra obra de Ford havia sido publicada em S. Paulo, em 1925, pela
editora de Monteiro Lobato. Trata-se de Minha
vida e minha obra. A tradução não é deste autor (aliás, o único empresário,
dentre aqueles cuja prática e discurso pude analisar, merecedor, em alguma
medida, do título de fordista), mas
de Silveira Bueno. O fato de Hoje e
amanhã ter sido preferido a Minha
vida, para a seleção de trechos usados nos documentos dos industriais
enviados a autoridades, tem interesse. Algumas das afirmações contidas no
último – cujo conteúdo, no entanto, também se nota no primeiro livro mencionado
– seriam bastante inconvenientes às necessidades de convencimento dos
industriais.
É o caso da opinião expressa por Ford a respeito do trabalho de
mulheres e crianças (Ford, 1925, p. 165):
“Nós pagamos ao operário o
seu serviço: mas que é que o trabalho deve proporcionar ao lar do operário, à
sua posição de cidadão, à sua condição de pai? O homem cumpre o seu dever
trabalhando na fábrica, mas à mulher incumbe o meneio da casa. A fábrica tem
obrigação de atender aos dois. Sobre que sistema deve calcular-se a
participação do lar na tarefa diária do operário? Deve figurar a subsistência
pessoal do homem como um gasto e a sua possibilidade de procurar a da família
como um lucro? Ou deve-se calcular unicamente o rendimento do trabalho diário
tomando por base o que sobra ao operário depois de haver satisfeito às
necessidades suas e às da família? Ou, ainda, deve-se considerar todas estas
relações exclusivamente sob o ponto de vista do gasto, calculando-se a renda
como alguma coisa inteiramente à parte? Isto quer dizer que o homem que
trabalha, depois de cumprir os seus deveres para consigo mesmo e sua família,
depois de haver vestido, agasalhado e educado a todos, deveria pretender ainda
alguma coisa, à guisa de economias? Tudo isto deve ir à conta do trabalho
diário? Creio que sim, porque do contrário veríamos o espetáculo deplorável de
mães e filhos forçados a trabalhar fora do lar.”
É tudo o que os patrões no Brasil não queriam ouvir. O trabalho do
menor era defendido como complemento aos ganhos dos pais, ambos (pai e mãe,
mas, em fábricas como as de fiação e tecelagem, principalmente a mãe) presentes
nas fábricas. Mulheres, mães ou filhas, maiores ou menores, deveriam lá ir
buscar seu ganho.
Que dizer da defesa do protecionismo e das práticas de restrição da
produção, da reivindicação de que fosse proibida a importação de maquinismos?
Estes pontos, não sendo assunto dos memoriais sobre as leis do trabalho, estão
presentes em Hoje e amanhã. Sem
comentar a defesa daquela proibição, frontalmente contrária a tudo que Ford
praticou e pregou com relação a inovação tecnológica, vale a pena, a propósito
dos dois primeiros pontos, lembrar o seguinte trecho desse livro (Ford, 1927,
p. 313):
“A força dos Estados
Unidos consiste no fato de que o auxílio prestado pelo governo à indústria e à
agricultura não se estendeu tanto que lhes chegasse a afetar a independência. A
certos respeitos foi vantajoso que o governo combatesse os negócios, porque os
enrijou. Tivemos, é certo, a tarifa aduaneira, que talvez fosse útil antes do
nascimento da verdadeira indústria; mas é fato notável que nenhuma das nossas
indústrias verdadeiramente importantes – refiro-me às que prestam serviço
social – cresceram em virtude da tarifa, nem necessitaram de proteção
alfandegária. As que necessitam de proteção alfandegária são as que se dirigem
por métodos retrógrados, fabricando maus produtos por intermédio de homens mal
pagos. Em vez de criarem mercados na massa da nação, contentam-se com
aproveitar o restrito mercado artificial dos altos preços, estabelecido no país
pelas tarifas, para vender barato no estrangeiro.”
Aliás, ninguém ignora, toda a discussão a respeito da alternativa
superprodução/subconsumo, veiculada no período, não faria o menor sentido do
ponto de vista das assertivas de Ford. A meta do “serviço social”, de acordo
com suas afirmações, impõe à indústria a produção de artigos de cada vez melhor
qualidade a preço cada vez mais baixo e a paga de salários cada vez mais altos,
para que a vida da coletividade melhore cada vez mais. Isso, como ele afirmou,
nada tem a ver com caridade; representaria, sim, a vocação da indústria, sua função na sociedade e a melhor maneira de
prosperar nos negócios.
Pode-se notar, assim, que o autor dos memoriais mencionados fez com
Ford o mesmo que com ele fizeram alguns analistas: selecionou-lhe trechos que
mais se compatibilizavam com suas necessidades de argumentação.
. . .
Uma vez criado o CIESP,
em 1928, a figura cujo discurso mais se evidencia é Roberto Simonsen, que se
apresenta como porta-voz dos industriais. Sua fala também dá margem à
atribuição de “fordismo”. Nela, racionalização
é termo axial.
Ele propõe, em discurso de 1931[6] (Simonsen, 1931):
“Deveríamos, a exemplo do
que faz a Alemanha, cobrir o país de comissões técnicas que estudassem a fundo
a racionalização do seu trabalho, de acordo com as condições locais, para que
os brasileiros aumentassem o seu bem-estar pelo aumento racional do rendimento
econômico do país.” (p. 52)
Examinemos mais de perto.
A grande pedra no caminho da indústria no Brasil é, para Simonsen, o
reduzido tamanho do mercado interno. Atentemos para o modo de descrever o
problema; nele já se percebe sua visão de como “resolvê-lo”:
“Somos um povo de fraca
produtividade. Trabalhamos pouco e com pequena eficiência, sendo aqui mínimo o
rendimento médio por cabeça. (...) O brasileiro consome, em média, por cabeça,
1/3 do que absorve o argentino. Não temos, praticamente, capitais próprios e
nem economias. É impressionante a pobreza do nosso povo. (...)”(p. 39-40)
Fraca produtividade, baixo consumo, falta de capitais, pobreza, são
mencionados como aspectos de um mesmo quadro. A explicação vem a seguir:
“Ensina a ciência
econômica que o poder aquisitivo de um povo é, praticamente, igual à sua
produção em bens sociais. (...) Se temos pequeno poder aquisitivo é porque é
mínima a produção de bens sociais em relação à nossa população.” (p. 40)
A primeira proposição é uma constatação – produz-se o que pode ser
consumido; vende-se o que pode ser comprado. A segunda é uma inversão da
primeira: aumentando a produção, aumenta-se na mesma proporção o consumo. A
ausência de mediações é evidente: como o crescimento da produção pode fazer
aumentar o consumo?
Simonsen menciona o caso americano: é “vitoriosa a opinião entre os
chefes da indústria americana que os salários altos e o número reduzido de
horas de trabalho são necessários para aumentar o poder de consumo das massas
operárias”. Foi “essa política de produção intensa e eficiente [que] permitiu
aos americanos pagarem salários de 20 a 25 dollars por semana para simples
manobristas, de 25 a 30 dollars para operários comuns e de 30 a 60 dollars para
operários especializados”. O expoente dessa “nova mentalidade”, quem “dela
fornece um verdadeiro padrão”, é Ford.
Para ampliar o mercado interno, o que os industriais têm a fazer,
então, é aumentar os salários? De acordo com Ford, sim:
“Ford considera que o
operário faz parte da massa dos consumidores e que o poder aquisitivo das
massas populares repousa nos salários; de fato, a proporção dos salariados numa
sociedade é muito maior do que a dos que vivem de renda. Os salários, prova de
trabalho, asseguram a continuidade deste criando um poder aquisitivo que se
renova incessantemente; o salário é, portanto, o criador do trabalho. Nessas
condições os salários são tão importantes para a indústria em si como para a
classe operária.”(p. 19-20)
Este Simonsen “fordista”, que já havia afirmado, no mesmo texto, a
superioridade do “fordismo” sobre o “sistema Taylor” e o método Gilbreth,
destaca, porém, para se atingir tal ideal, um elemento-chave, a eficiência:
“A política dos altos
salários só pode, porém, repousar numa prática industrial da máxima eficiência:
elevação da produtividade do operário, aumento da intensidade da produção e
máxima economia no uso da matéria-prima.”(p. 20)
Mas, se a eficiência constitui meta perene, não basta para que ocorra desenvolvimento
industrial. É necessário o protecionismo:
“O industrialismo nos
Estados Unidos encontrou condições mesológicas muito favoráveis. A política
protecionista permitiu a evolução industrial, em condições de larga
concorrência interna (...)”(p. 12)
Potencializador da eficiência, o scientific-management,
cujos iniciadores, para Simonsen, foram Taylor, Gilbreth e Ford, nesta ordem,
necessita de um meio adequado para se
desenvolver:
“A importância
do mercado nacional, seu desenvolvimento contínuo e rápido, a prática da
fabricação em série, a predominância do aparelhamento mecânico, a facilidade de
comunicações pela extensão da rede ferroviária, constituíram um conjunto de
circunstâncias particularmente favoráveis à formação de grandes empresas, nas quais a aplicação do princípio de defesa
do trabalho poderia ser levado ao extremo.” (p.13, grifos nossos.)
Essas empresas, incorporando “na mesma organização desde as primeiras
materias-primas até o acabamento último dos produtos”, deram origem aos
trustes. Tal “movimento de concentração” era “derivado da própria natureza da
evolução industrial” (p. 13-14.)
Seguiram-se outros desdobramentos:
“A orientação americana
intensificou-se no culto pelo trabalho eficiente e produtivo. Defendeu-se o
homem como fator de produção com leis sociais, entre as quais avulta, pela sua
grandeza, a lei seca. A crise pós-guerra levou as indústrias a procurarem novas
fontes de economia e de intensificação do trabalho. Surgiu a grande campanha
contra o desperdício na indústria e a favor da padronização.” (p. 14)
Como corolário é que vieram
os “altos salários”:
“Foram todos esses aperfeiçoamentos que
permitiram a política dos altos salários, estando vitoriosa a opinião entre
os chefes da indústria americana que os salários altos e o número reduzido de
horas de trabalho são necessários para aumentar o poder de consumo das massas
operárias.” (p. 15, grifos nossos.)
Como se vê, para Simonsen, a política dos “altos salários” e a
correspondente atitude dos industriais de apostar no próprio potencial da
indústria para alimentar a capacidade aquisitiva do mercado interno com os
salários de seus operários situam-se no horizonte das possibilidades; é uma imagem que pode servir de bandeira para o
projeto industrialista. É algo apresentado como possível caso se adote o protecionismo e o crédito industrial como política
econômica e seja favorecido o movimento de concentração industrial. Não
significa uma proposta para aplicação imediata:
“Necessitamos levantar o
padrão de vida brasileiro, aumentar o nosso poder aquisitivo e valorizar o
homem no Brasil. Dêem à indústria o que ela necessita: aparelhamentos
financeiros de que dispõem as nações civilizadas, leis harmônicas de defesa da
produção, liberdade de atuação dentro do mercado brasileiro pela supressão das
barreiras inter-estaduais e a indústria poderá concorrer poderosamente para o
enriquecimento do Brasil com sadios reflexos em nossos problemas sociais e na
organização política administrativa de que carecemos.” (p. 51-52.)
Vemos aí o “salário-causa” de Ford transformado em “salário-resultado”,
ou, em outras palavras, seu deslocamento em favor do “lucro-causa”. É a
reversão do discurso, usado, aparentemente, como base de argumentação, àquilo
que por ele era combatido. Os “altos salários” são, em Simonsen, uma falsa mediação entre crescimento da produção e aumento
do consumo. Representam apenas uma figura, útil pela projeção de
perspectivas prestigiadas, em medida diversa e por diversos motivos, num
círculo mais amplo que o dos industriais, refletida (como que numa confirmação
disso, aparece invertida), num
discurso que, de fato, a ela se mostra opaco, incapaz de absorvê-la. Essa
figura, ao mesmo tempo que, despojada de substância, reforça e autoriza a
argumentação de Simonsen, também dispõe, como se pôde notar, setas
despistadoras no caminho dos historiadores.
Se o “fordismo” é uma perspectiva situada num horizonte atemporal, o
mesmo não se dá com a “racionalização alemã”. “Assume excepcional importância o
estudo da reação que se opera na Alemanha”, pelos seguintes motivos:
“O mercado interno
nacional foi diminuído pelo desmembramento da Polônia. A restituição da Alsácia
fez a Alemanha perder minas de potassa e importantes indústrias algodoeiras; a
da Lorena, minas de ferro de grande valor. O distrito metalúrgico do Luxemburgo
cessou de fazer parte da concentração econômica alemã; a perda da Posnânia e de
uma parte da Silésia fê-la perder as usinas de açúcar, minas de carvão, de
zinco, de chumbo e importantes estabelecimentos metalúrgicos. Com as colônias
perdeu também um elemento importante de expansão industrial. A guerra e a
inflação posterior à guerra empobreceram ainda mais o país fazendo-o perder
seus capitais circulantes.”(p. 24)
São condições que visivelmente (embora não seja explicitado) aproximam
a situação da Alemanha da do Brasil e apontam para um outro “modelo” de mercado
interno:
1.
Concentração da produção industrial numa região e
consumo em outra. Se se afirma que a perda da Polônia diminuiu o mercado
interno, é porque se acredita que a produção
industrial desta era insuficiente para abastecer seu próprio mercado interno,
cabendo à indústria alemã fazê-lo. A perda das colônias tem mesmo sentido. É
evidente o paralelo com a relação entre os grandes centros fabris brasileiros,
por exemplo São Paulo, “sem favor o maior foco de progresso do país” (p. 49), e
outras regiões do Brasil.
2.
Falta de indústrias de base, como a metalurgia, devido
a perdas territoriais.
3.
Falta de capitais (devido à guerra e à posterior
inflação).
O primeiro ponto mencionado acima indica, pelo avesso, a concepção de mercado interno de Simonsen. Por isso,
a solução encontrada no caso alemão para resolver o problema do mercado interno
não se aplica de forma integral ao Brasil:
“Num povo que perdeu pela
guerra e pela inflação seus capitais e rendas, é na massa dos salários que
reside quase que unicamente a criação do poder aquisitivo do mercado consumidor
interno. Daí a justificação da política de salários conjuntamente com a baixa
do preço de custo, com o duplo intuito
de criar maior poder aquisitivo e intensificar o consumo incrementando o
escoamento dos produtos industriais.” (p.31)
Assim, a política dos “altos salários” é circunstanciada: não se trata
de uma medida de aplicação universal. Nos EUA, o meio permite; na Alemanha, não
há outra alternativa. No Brasil, nem uma nem outra circunstância se dão.
Já outros elementos da solução alemã seriam aplicáveis ao Brasil. É o
caso do financiamento à indústria. Na Alemanha, a descapitalização foi sanada
com empréstimos externos. Para o Brasil, Simonsen proporá a criação de bancos
para financiamento industrial (p. 48). De modo geral, apontando o exemplo
alemão, propõe resolver os problemas econômicos, sociais e administrativos
“conjuntamente, pela razão e pela técnica, esforçando-nos para racionalizar o
trabalho no Brasil sob todos os seus aspectos”. A racionalização é a via para
chegar-se ao máximo de eficiência:
“Racionalizemos o trabalho
abrangendo em seu programa desde o estudo sistemático de nossos problemas
financeiros até a melhoria do nosso homem pelo saneamento e pela cultura; desde
a racionalização agrícola até a racionalização do nosso mercado interno.” (p.
52)
O estudo “cientificamente feito sobre bases reais” por aquelas
comissões técnicas que Simonsen dizia querer ver “cobrindo o pais” formará a
base para um consenso nacional:
“No dia em que a maioria
dos brasileiros conhecer o plano integral da racionalização de todas as nossas
forças produtivas (...) nesse dia será fácil a união sagrada de todos os nossos
patrícios em torno dessa fórmula de trabalho e de ordem.” (p. 52)
É patente que “eficiência” é o critério pelo qual se vão destacando
elementos de cada uma das “experiências” observáveis no mundo, esse “grande
laboratório”. Tais elementos serão os apresentados como aplicáveis ao meio
brasileiro. A seleção de elementos e sua adaptação ao meio nacional é, aliás,
outra lição a tirar da experiência alemã:
“É de justiça assinalar,
porém, não ser a racionalização obra puramente alemã. Os alemães estudaram
profundamente a experiência de todas as nações adiantadas, principalmente o
‘scientific-management’ americano donde trouxeram idéias fundamentais para o
seu trabalho.
“Souberam,
porém, sistematizar com maestria todos esses progressos, aos quais juntaram
suas próprias idéias, dando novas fórmulas e criando, com sua meticulosidade de
observação e atuação, um espírito eminentemente científico, um verdadeiro corpo
de doutrina, cujos efeitos terão real repercussão sobre os destinos da
humanidade.” (p. 37)
Aliás, Simonsen também faz referência, mesmo que
sumária, “ao ingente esforço do povo italiano na magnífica organização do seu
trabalho e aos frutos colhidos pela França com a sua bem equilibrada política
econômica e financeira” (p. 37). A experiência da Inglaterra, “pioneira da Revolução
Industrial”, por sua vez, também é objeto de análise atenta, nesse discurso de
Simonsen.
Feitas essas considerações, a seguinte afirmação de Simonsen, em
discurso de 1928 (Simonsen, 1928), adquire plena significação e mostra toda sua
coerência com sua profissão de fé pelos “altos salários” (no trecho, o autor se
refere a sua experiência na direção da Cia. Construtora de Santos):
“Durante 20
anos, procurei por todos os meios conseguir um tipo de habitação barata, que
permitisse ao operário de menor salário, dentro de suas possibilidades, uma
moradia decente e verifiquei ser o problema por enquanto insolúvel, dadas as
modernas exigências de higiene e da segurança das construções. A solução está
no aumento do ganho médio, e esse aumento de ganho médio está ligado ao aumento
da eficiência do trabalho e, portanto, aos problemas principais da formação da
nossa nacionalidade, organização do nosso aparelhamento econômico, moeda sã e
crédito abundante, higiene e instrução.” (p. 16-17)
Em outras palavras: se os salários estão baixos, é porque o nível de
eficiência ainda é insuficiente. Mensagem óbvia: para que este aumente, é
preciso dar à indústria as condições necessárias. Providos os suportes
adequados – reforma monetária e financeira etc. – é possível atingir a
eficiência, caminho para os “altos salários”. O que se afirma como perspectiva
futura, dadas condições ideais, nega-se coerentemente, de forma explícita, no
presente, em que aquelas não estão dadas:
“O aumento do ganho precisa, porém, ser
conseguido dentro das leis econômicas, e não pelo simples arbítrio dos Governos
ou das classes patronais, sob pena de encarecermos os produtos e entravarmos a
produção. É pelo aumento da produção em geral que temos de obter o aumento do
ganho médio e, portanto, o aumento do consumo médio por habitante.” (p. 17)
O “modelo” de desenvolvimento dos industriais, vigente no país, é
indiretamente admitido pelo próprio autor, quando, para negar que a indústria
fosse responsável pelo encarecimento da vida no Brasil, apresenta um gráfico
“demonstrando” que “os salários se adaptam quase que matematicamente ao índice
do custo de vida” (Simonsen, 1931, p. 50). Ou seja, o desenvolvimento
industrial não pode se basear num mercado interno formado pela massa dos
salários. Estes não crescem, nem os preços das mercadorias baixam: as linhas
estatísticas de uns e de outros são paralelas.
De resto, o tipo de argumentação que Simonsen utiliza é – parafraseando
a expressão empregada no fim dos anos vinte pelas entidades industriais para a
crítica das tarifas – “velho de trinta anos”, pelo menos. O seguinte trecho da
apresentação do primeiro número do Boletim
do Centro Industrial do Brasil, em meados da primeira década do século XX, assinada por L.
R. Vieira Souto[7],
exemplifica o que afirmamos:
“Quanto à elevação dos
salários, nós, protecionistas, respondemos à objeção: nunca foi aspiração nossa
conduzir o Brasil ao regimen do trabalho barato; queremos, ao contrário,
salários altos, bem altos, e devem querê-los todos os brasileiros, porque o
salário alto é a felicidade, o conforto dos operários, o aumento da sua
faculdade aquisitiva, a possibilidade de satisfazerem as necessidades reais da
vida, e os operários formam a grande maioria dos produtores e consumidores, a
grande maioria da população, daquela população válida e prestimosa que mais
concorre para o progresso da nação. (...)
“Sabe-se
quanto é comum a opinião de que o Brasil está sofrendo de excesso de produção.
Há quatro anos que protesto contra esta afirmação e sustento a idéia oposta.
Não é a nossa faculdade de produzir que está exagerada; é a nossa faculdade de
consumir que está enfraquecida, e assim paralisa a faculdade de comerciar. Só
pode consumir bastante o povo que produz muito e em condições bem
remuneradoras, uma vez que o produtor, só quando aufere lucros, pode
desenvolver a sua indústria e pagar salários suficientes aos operários, que
formam a grande legião dos consumidores.”
Estaremos diante de um fordismo avant
la lettre? Parece mais razoável acreditarmos que referências a “altos salários”
não têm relação necessária com esse projeto e se vinculam, antes, como elemento
de uma argumentação, a uma necessidade de convencer-se representantes de
setores que não compartilham da visão dos industriais.
O trecho seguinte, de trabalho de 1930 (Simonsen, [1930?]), também
parece corroborar o que dissemos sobre o procedimento de Simonsen com relação
às “experiências” estrangeiras:
“Quanto ao problema proletário, ensinou-nos a
comparação da prática européia com a experiência norte-americana que é pela
individualização do valor do operário, pelo desenvolvimento de sua eficiência e
aumento de sua capacidade de ganho que se consegue integrá-lo na sociedade.”
(p. 4)
Simonsen não escolhe entre um e outro “modelo”: absorve de cada um
aquilo que julga adequado e com isso compõe um outro amálgama.
“Individualização do valor do operário” pode remeter tanto aos usos da
“psicotécnica” na “racionalização alemã” quanto à necessidade de superar a
experiência negativa da revolução industrial na Inglaterra, quando o trabalho
(nas palavras de Simonsen) foi reduzido a mercadoria, daí resultando a luta de
classes, a formação das trade unions
e a emergência do proletariado como força política independente, bem como a
aspectos do próprio “fordismo”, como a oportunidade que o operário teria de
seguir seu próprio ritmo (sic) num trabalho de equipe frente à linha de
montagem[8].
A “experiência norte-americana” é, sem dúvida, o “fordismo”, com seus “altos
salários” e sua “eficiência”, ambos instrumentos assumidos e potencializados,
refinados, pela prática da “racionalização alemã”.
A formulação desse terceiro “modelo” não significa, porém, uma proposta
de sua aplicação imediata. Busca-se o encaixe perfeito de cada uma de suas
partes; uma delas não sendo possível, ou conveniente, incorporar, as outras se
realinham e se acomodam às circunstâncias, passando o modelo a ter outro
significado, agora como força de persuasão ou justificação: se os salários são
baixos, é pela reduzida eficiência; se esta é reduzida, é pela falta de apoio dos
poderes públicos. Seja concedido o que reivindica a indústria, e teremos aqui
realizado um modelo de perfeita integração do operário à ordem capitalista e de
plena harmonia dos diversos interesses em jogo, agrícolas, comerciais ou
industriais.
“Problema proletário”, protecionismo e custo de vida encadeiam-se, mas
seu sentido é o inverso do que argumentam os “detratores da indústria nacional”
(diz Simonsen: “ouvimos, constantemente, referências ao sacrifício que fazem 40
milhões de brasileiros em benefício de meia dúzia de ‘felizes’ capitães de
indústrias”) (Simonsen, [1930?], p. 4).
Simonsen admite, “para argumentar”, que o protecionismo “acarrete a
carestia de alguns produtos”, mas não que esse encarecimento represente lucro
para os industriais, pois é “inerente ao custo da produção em países novos e
desorganizados como o nosso”. É um “estágio pelo qual todas as nações têm que
passar”. O “encalacramento” dos industriais provaria o fato (Simonsen, [1930?],
p. 4).
Simonsen havia, em As finanças e
a indústria, ridicularizado a posição dos que reivindicavam a supressão do
critério protecionista na fixação das tarifas aduaneiras, nos seguintes termos:
“acreditam esses patrícios que com essa orientação aumentariam, como por
encanto, os mercados consumidores de café em troca do aumento da nossa
importação de produtos industriais” (Simonsen, 1931, p. 43). A alternativa
proposta em As crises inverte a
mágica: uma vez que no Brasil “não existe vida cara, mas sim, ganho
insuficiente, porque o índice de produção é baixo em relação à população e
extensão do nosso território” (citação de seu próprio Orientação industrial, feita por ele mesmo em As crises), e que, portanto, “o aumento da capacidade de ganho do
brasileiro é função do aumento da sua eficiência”, “torne-se o brasileiro
eficiente e produtivo e desaparecerá, como por encanto, a preocupação de vida
cara”(Simonsen, 1931, p. 5). A utilização da mesma expressão para desqualificar
um argumento adversário e para ilustrar o seu próprio parece denunciar o
próprio caráter deste: sem explícitas mediações, o argumento do acréscimo da
capacidade de ganho como resultado do aumento da eficiência desloca a meta para
um futuro indeterminado, como um rendimento a se resgatar num investimento de
longo prazo.
A posição de Simonsen, no fundamental, informa o pensamento empresarial
brasileiro ainda hoje: no dizer emblemático atribuído a um ministro da área
econômico em governos militares, cuja atitude nada indica tenha deixado de
inspirar dirigentes da atualidade, trata-se de esperar o bolo crescer para
depois repartir. O “crescimento da economia”, num movimento “natural”, trará o
bem-estar da sociedade; não se deve tentar apressar o carro com extemporâneas
iniciativas distributivistas, porque estas só iriam atrasá-lo.
Nota-se que esta nossa crítica às visões de um “fordismo” no Brasil
está centrada na análise de textos, não no estudo do processo de trabalho. É
que o tema “fordismo”, no Brasil, não foi, como se viu, constituído a partir
desse estudo, e sim a partir de uma apreciação da atitude e comportamento dos
industriais diante principalmente das tentativas de regulamentação do mercado
de trabalho, a exemplo das leis “trabalhistas”. Aquilo que Benjamin Coriat
(Coriat, 1979, p. 75) chamou de “novas normas de produtividade e de produção”,
pelas quais “entende-se designar os ‘progressos’ que a linha de montagem
assegura no que concerne a técnicas de extorsão do sobretrabalho”, não é foco
de análise nas obras, que mencionamos, de Werneck Vianna e de De Decca. Por
isso, neste capítulo, em que nos colocamos numa perspectiva crítica a esse
tema, tivemos necessariamente de centralizar a discussão nas representações a
respeito daquela atitude e daquele comportamento.
Capítulo 4
Certamente que há homens tão pequeninos de idéia, que não chegam a
compreender que o negócio é algo que paira muito acima do interesse particular. (Ford, 1925, p. 187.)
REPETIMOS: NÃO VAMOS FAZER UM NEGÓCIO E SIM PRESTAR MAIS UM BENEFÍCIO
ÀS INDÚSTRIAS.
(Circular FIESP 632, 18.05.1935)
Na
produção historiográfica, acadêmica ou não, sobre os anos vinte e trinta, com
freqüência encontramos referências ao CIESP (FIESP,
depois de 1931[9]),
em que a organização aparece como protagonista, seu nome associado à idéia de
poder e influência. Essa imagem, que surge como um dado que prescinde de
demonstração, não resiste a um exame mais detido da documentação produzida pela
entidade, especialmente suas circulares.
A participação da
classe nas iniciativas da associação
Antes
de discutir-se o alcance das ações da entidade industrial na esfera pública,
cabe investigar qual era a ressonância de seus projetos dentro da própria
“classe”.
O dado que,
logo de início, se encontra a respeito é emblemático. A primeira assembléia
geral do Centro desde a sua fundação em abril de 1928 não obteve quorum[10].
A reunião, convocada para março de 1929, foi precedida de repetidas
convocações. A maior parte das reuniões ou assembléias, gerais, ordinárias ou
extraordinárias, exige segunda convocação, devido à falta de comparecimento à
primeira. Várias são as terceiras convocações. A segunda assembléia geral,
marcada para novembro de 1930, em plena agitação provocada pela derrubada de
Washington Luís e instauração do governo de Getúlio Vargas, quando seria de se
esperar um gesto de preocupação com a conjuntura, é simplesmente suspensa[11].
Vale registrar que a “fundação” da Federação, no ano seguinte, também exigiu
segunda convocação[12].
A entidade, como se vê, não se distingue, nesses anos, pela capacidade de mobilização
de seus associados.
Esse
quadro se confirma quando se consideram as tentativas de centralização dos atos
individuais dos filiados. Em abril de 1929, o Centro começa a manifestar
preocupação com notícias, vindas do Rio, de que o poder público passava a fazer
cumprir o Código de Menores[13].
O juiz Melo Matos, do Distrito Federal, havia indeferido uma petição pela
suspensão da lei, que lhe havia sido dirigida pelo Centro dos Industriais de
Fiação e Tecelagem de Algodão, daquela cidade. As entidades patronais de S.
Paulo e Rio opunham-se ao cumprimento dos dispositivos que, nesse texto legal,
determinavam a jornada de seis horas para menores de 18 anos e caracterizavam
como trabalho noturno o efetuado a partir das 19 horas. Em documentos por elas
enviados, desde 1927, ao Legislativo e à presidência da República[14],
alegava-se que a lei traria a desorganização da indústria, argumentando-se que
a jornada diferenciada para o trabalho do menor impediria sua coordenação com o
do adulto. O decreto seria inexeqüível. Apontavam-se também supostos efeitos
sociais negativos: a redução dos meios de sustento da família operária, devido
ao afastamento dos menores do trabalho (já que as empresas, dizia-se, teriam de
demiti-los), a agitação que isso causaria no operariado e o perigo da queda na
vadiagem, na prostituição e no crime.
O
CIESP procura
unificar a ação dos patrões frente à situação, orientando-os a não cumprir a
lei, esperar que venham as multas, não pagá-las e levar o caso à justiça, com
apoio da entidade. A finalidade era, como no Rio, obter a suspensão da execução
da lei, na parte referente às indústrias. Contudo – contrariando as alegações
de inexeqüibilidade – a diretriz não
logra a adesão esperada, como se constata pelo teor desta circular, de junho de
1929:
“Algumas
indústrias, temendo as conseqüências do não-cumprimento integral do Código,
estão tratando de reformar o seu aparelhamento, adotando o horário de seis
horas para menores e adultos. Vão assim ao encontro de grandes sacrifícios,
pois que a sua produção ficará caríssima e o seu operariado em deploráveis
condições econômicas.”[15]
O
seguinte apelo, mais de quinze dias depois, enseja idêntica inferência:
“É
preciso que as indústrias paulistas sigam a mesma orientação e que os
interesses particulares cedam o passo aos interesses gerais.”[16]
Em
circular expedida no final do mês seguinte, o secretário-geral Pupo Nogueira
desabafa:
“É
lamentável que muitas fábricas hajam pago multas, não aguardando nem ao menos
proceda o Juízo a cobrança executiva, pois este fato enfraquece a ação do
Centro a qual, para ser bem sucedida, deve assentar em norma de conduta
uniforme das indústrias paulistas.”[17]
A
partir de setembro, a estratégia do Centro é colocada à prova: inicia-se processo judicial envolvendo uma fábrica de
tecidos de seda que, seguindo sua orientação, não pagou multa. A empresa teve
bens colocados em penhora, em cobrança executiva. O caso, evidentemente, não
poderia deixar de ser divulgado pelas circulares: a fábrica era o exemplo que
se desejava fosse seguido. Era a ocasião para convencer toda a classe do acerto
da diretriz adotada. O êxito nesse episódio propiciaria à entidade prestígio
frente aos industriais, o que lhe seria útil em sua tentativa de afirmar-se
como direção. Aqui parece estar em jogo o próprio sucesso no projeto de
arregimentação da classe.
Apesar da
defesa feita por um advogado de renome, Plínio Barreto, a organização foi
derrotada. A sentença, proferida em fevereiro do ano seguinte pelo juiz Bastos
Cordeiro, reafirma as conclusões de Melo Matos no caso julgado no Distrito
Federal: a pretensão seria “ilegal, injurídica, injusta, desumana e
impatriótica”[18]
Ainda em 1929,
o CIESP
envolve-se diretamente na política partidária, declarando apoio à candidatura
de Júlio Prestes (governador de S. Paulo e integrante do Partido Republicano
Paulista) à presidência da República, contra Getúlio Vargas, candidato da
Aliança Liberal. Em agosto, a entidade anuncia um serviço de alistamento
eleitoral nas indústrias, com o objetivo declarado de formar um “corpo
eleitoral permanente”[19].
Visava-se, provavelmente, organizar uma base política para as pretensões do
Centro nessa esfera. A iniciativa, porém, não alcançou a aceitação desejada. No
mês seguinte, lamenta-se que “algumas fábricas” tenham preterido a entidade no
alistamento, recorrendo a outras pessoas, e se faz um apelo a que as empresas o
utilizem, para não dispersar o corpo de eleitores[20].
Durante essa campanha, aproveitadores fizeram-se passar por representantes do CIESP e se ofereceram
para organizar o alistamento nas fábricas, mediante pagamento. Coisa semelhante
aconteceu, nesse mesmo ano, no caso da
lei de férias: certos indivíduos encontraram um meio de ganhar dinheiro,
dizendo-se representantes do Conselho Nacional do Trabalho e cobrando multas
devidas ao seu não-cumprimento.
Em meados de
1930, o número de sócios estava decaindo. O fato é atribuído pelo
secretário-geral à crise econômica[21].
Em outubro, é lançado um “caloroso apelo” para o pagamento em dia das
mensalidades:
“A hora presente exige do
nosso Centro pesados sacrifícios de dinheiro.”[22]
O decreto
19.770, de 19.03.1931, que fixou normas para a organização das associações de
classe, pelas quais estas ficavam sujeitas ao controle do governo federal, foi
encarado, com toda evidência, como um seguro arrimo para os esforços do CIESP de arregimentar
a classe. A esse respeito, é bastante esclarecedor acompanhar os passos dados
para a formação dos sindicatos por ramo de indústria. A primeira coisa a fazer
era a organização de um comitê de representantes de cada ramo, organismo que
será a base para a formação de sindicatos, de acordo com a lei de
sindicalização. O momento da criação dessas comissões parece ter sido encarado
como ocasião frutífera para arrebanharem-se novos sócios. De fato, parece ter
havido algum aumento do quadro social a partir de junho de 1931, quando esse
movimento se inicia, a julgar-se por uma lista de recém-filiados divulgada em julho desse ano[23].
As circulares
dirigidas a possíveis interessados em integrar os comitês obedeciam a um padrão
único. Em primeiro lugar, uma explicação do que era a sindicalização – a
organização da classe dentro de parâmetros fixados por ato do governo:
“(...) o Governo Provisório
da República tomou a iniciativa de sindicalizar as classes patronal e operária,
elaborando para este fim o decreto n. 19.770, de 19 de março de 1931.
“Sindicalizar
quer dizer reunião dos membros da mesma classe dentro dos limites traçados pela
lei.”[24]
É interessante
notar a preocupação didática nas circulares que chamavam para a organização de
comitês:
“Sindicalismo na indústria é a reunião de todos os
industriais de cada ramo para a defesa de seus interesses e para a
representação oficial da indústria.
“O sindicato é o encarregado
de representar a classe perante os poderes oficiais; é o encarregado de
reclamar contra as medidas prejudiciais à classe; é o encarregado de discutir
as questões entre patrões e operários, discutir salários, discutir horas de
trabalho, etc., etc.
“Depois da citada lei [n.
19.770], a indústria que não tiver seu grupo sindical, estará sujeita a tudo o
que as outras indústrias, os operários e empregados resolverem, sem nada poder
fazer em seu favor.”[25]
É preciso
também explicar o que é a Federação:
“Além dos sindicatos, a lei previu a formação de
Federações; uma Federação é a reunião de sindicatos – quer sejam sindicatos
operários, quer sejam sindicatos patronais.
“Em São Paulo, foi formada
esta Federação. Os diferentes ramos industriais reuniram os seus membros
(patrões), formaram comitês sindicais e ligaram-se à Federação das Indústrias
do estado de São Paulo [o texto apresenta como fato o que ainda é intenção: com
mesma data, ou muito próxima, foram expedidas circulares com mesmo conteúdo
para os diversos ramos industriais].
“VV. SS. compreenderão o que
está destinada a ser esta Federação: ela será toda a indústria paulista reunida
num corpo único e, portanto, uma verdadeira potência.”[26]
Não se pode
deixar de observar que, passados exatos três anos depois da inauguração do CIESP, a entidade
ainda tinha que explicar – com todo o didatismo necessário à exposição de um
assunto totalmente novo a pessoas que nem seus pressupostos básicos possuem –
para que poderia servir a entidade geral. É claro que a organização como
federação sindical era mesmo muito nova, mas a necessidade do didatismo parece
evidenciar a falta de experiência da classe com um organismo voltado a sua
arregimentação. Este, como apontamos, já existia havia três anos.
Ainda, cabe
notar a necessidade de salientar o caráter oficial
da sindicalização – isto é, releva-se o fato de a mesma ser determinação do governo. Percebe-se que esse
procedimento indica ser a intervenção deste encarada como um forte argumento:
tanto pela respeitabilidade que confere à iniciativa, interpreto, como pelo
caráter de compulsão que faz supor ou que evoca por analogia com outras
injunções governamentais a que os industriais estavam acostumados.
Outro tópico
presente nas circulares dirigidas a ramos específicos de indústria é o
esclarecimento da utilidade mais geral de se filiar ao comitê – a de este
representar um canal aberto com os poderes públicos:
“Os ramos que não estiverem
reunidos [em sindicato ou comitê] não poderão apresentar as suas reivindicações
perante os poderes públicos.”[27]
“A fábrica que não pertencer
a um sindicato, não terá direito algum de pugnar pelos seus interesses perante
o poder público: ela viverá isolada e esquecida.”[28]
A relação com
o operariado também é focalizada:
“A classe operária está sendo sindicalizada e dentro
de pouco tempo ela terá os seus sindicatos em todos os ramos industriais,
inclusive no nosso.
“Se o patronato não se
sindicalizar, ficará em posição de inferioridade perante o operariado
sindicalizado.
“É preciso que haja
equilíbrio: a cada sindicato operário, corresponderá um sindicato patronal.”[29]
Nota-se que o
enquadramento oficial dos sindicatos operários não é encarado com
tranqüilidade, muito menos alívio. Embora devamos considerar no discurso as
injunções de uma necessidade de convencimento, é óbvio que se supõe seja o
leitor da circular sensível ao argumento, o que acarreta ter este argumento
base em preocupações efetivas.
As
convocatórias das reuniões para organização de comitês por ramo mostram grande
empenho em convencer os industriais acerca da necessidade de fortalecer aqueles
e, desse modo, a Federação. Para isso, a entidade procura “mostrar serviço”:
“Temos o prazer de comunicar a VV. SS. que mesmo
antes da organização definitiva do comitê dessa indústria, esta Federação já
encaminhou ao Sr. Ministro da Fazenda um memorial sobre a incidência do imposto
de consumo em artigos de perfumaria.
“A Federação pleiteia nova
forma de incidência e novas taxas que possam ser suportadas sem sacrifício para
essa importante indústria, que vê de ano para ano majorados os tributos que
pesam sobre a sua produção.
“Mais do que nunca, é
preciso que toda a indústria de perfumarias se inscreva na Federação.”[30]
Um dos
atrativos para a associação era o freqüente anúncio, pelas circulares, de
serviços prestados aos sócios, na maior parte, relacionados ao cumprimento das
exigências dos poderes públicos: estatística industrial, questões fiscais,
importação de máquinas, registro de marcas e patentes, câmbio, liberação de
importações, cumprimento de leis sociais etc. Em junho de 1931, a entidade se
prontificava a cobrar faturas a receber do governo por fornecimento de chapéus
durante a chamada Revolução de 1930[31].
Mobilizações operárias também forneciam ocasião para a entidade mostrar-se
útil, como em julho de 1931, quando informa ter obtido forças policiais para
guarnecer as fábricas que assim solicitarem à Federação[32].
Numa outra
circular de junho desse ano, dirigida ao ramo de artefatos de borracha,
comunicando que a constituição do comitê foi adiada para uma próxima reunião,
devido ao comparecimento insuficiente da categoria na última, ressaltavam-se as
“inúmeras vantagens” da filiação:
“(...) os fabricantes de
artefatos de borracha, em vez de continuar, como até agora, a defender os
interesses de classe isoladamente, o farão por intermédio do seu comitê, que
por sua vez se dirigirá aos poderes competentes por intermédio da Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo, cuja voz será mais acatada por representar
uma federação de classe e por estar sindicalizada, como estatui a Lei acima
referida.”[33]
Como se vê
pelo adiamento da reunião, a atitude da classe para com a entidade central
permanecia no mesmo padrão anterior. Pelo teor das circulares, já fica bastante
evidente a dificuldade em se conseguir adesão:
“Ou todos os industriais desse ramo – grandes e
pequenos – tomarão lugar no Comitê e então ele será forte e eficiente ou não
tomarão parte e tal comitê pouca cousa poderá fazer em benefício da classe [a]
que VV. SS. pertencem.”[34]
O início da
organização de comitês coincide com a abertura de um movimento de revisão das
tarifas alfandegárias, por iniciativa do governo federal. Naquele mesmo mês de
junho, três representantes da FIESP foram nomeados pelo governo para nela tomar parte. É pouco
provável que a coincidência no tempo, que apontamos, tenha sido obra do acaso.
A ocasião parece ter sido vista como oportunidade para buscar-se participação
da classe. As circulares passam a pedir informações a respeito de artigos
produzidos, matérias-primas utilizadas, além de opiniões sobre os pontos em que
a reforma deveria basear-se, acrescidas de casos ilustrativos. A necessidade de
sindicalizar-se chegava a ser exagerada com a perspectiva alternativa da
própria cessação das condições de sobrevivência da indústria:
“Esta arregimentação se impõe.
“Vai agora ser reformada a
tarifa das alfândegas. Se esta reforma for feita com o critério do
protecionismo clássico, OS PRODUTOS DE ALIMENTAÇÃO PODERÃO ENTRAR NO BRASIL SEM
PAGAMENTO DE DIREITOS ALFANDEGÁRIOS.
“Seria a morte da nossa
indústria.”[35]
Esta
alternativa de vida ou morte, associada à sempre presente questão das tarifas,
era com muita freqüência lançada como recurso de convencimento perante os
poderes públicos. É curioso observar que cumpre o mesmo papel num texto dirigido
à própria classe. Se, por um lado, isso pressupõe que a classe era sensível ao
argumento, por outro, mostra talvez uma preocupação de propalar – incutir –
esse argumento no meio patronal.
O resultado
dos esforços para se obter adesão parece
não ter correspondido ao esperado. As dificuldades de arregimentação são
patentes. Podemos apontar o caso do Comitê dos Fabricantes de Artefatos de
Borracha. Uma circular de agosto informa, a propósito de reunião chamada para
formar uma comissão para estudar a modificação das tarifas aduaneiras, que
“poucos foram os associados que atenderam ao convite da Diretoria do Comitê, e,
por falta de número”, não foi possível nomeá-la. A comissão seria composta por
cinco membros.[36]
Uma assembléia geral da Federação, convocada para outubro, com a finalidade de
formar comissões para elaborar um projeto de tarifa alfandegária, parece
igualmente não ter alcançado entusiasmo. Foi precedida por uma enfática
convocação, que se referia ao problema das tarifas como questão de vida ou morte[37]:
“Nenhum dos nossos sócios desconhece a importância
do assunto a ser tratado e nenhum deles ignora que da futura tarifa dependerá a
própria existência das indústrias e, assim sendo, estamos certos de que, mesmo
com sacrifício, todos atenderão ao presente convite.”
A mesma
circular insistia várias vezes na necessidade de comparecimento:
“Das campanhas levadas a efeito pelas indústrias, a
campanha tarifária é a mais séria e só isto é de molde a trazer Vs. Ss. para a
assembléia de quarta-feira.”
O ocorrido na
reunião é relatado em desanimada circular, dias depois. Apenas informa que “a
última assembléia (...) escolheu várias comissões para os estudos dos projetos
de reforma da tarifa em elaboração” e que “outras comissões serão organizadas”
na próxima semana[38].
É óbvio que, se tivesse havido grande afluência de sócios, o laconismo daria
lugar a comentários efusivos sobre o número de presentes, sua participação etc.
A partir daí,
o tom dos comunicados denota redução das expectativas de participação da classe.
Em novembro, uma reunião do ramo de óleos e saponáceos da capital é convocada
nos seguintes termos:
“Sendo de importância tal
reunião que, aliás, poucos minutos irá tomar dos srs. industriais, contamos com
a presença de Vs. Ss.”[39]
Em dezembro, o
trabalho que deveria conter as sugestões dos associados ainda não estava
pronto. Apenas a questão da matéria-prima foi tratada; a tarifa sobre produtos
manufaturados não chegou a ser abordada. Os organizadores desabafam:
“Por mais que nos tenhamos
esforçado para a elaboração do projeto das reformas da tarifa dentro de folgado
prazo para a sua discussão ampla, as sugestões dos interessados, entregues a
nós só à última hora, não nos permitiu proceder conforme determinamos em nossa
circular n. 223 de 2 do corrente mês [isto é, terminar os estudos sobre o
assunto].”[40]
As sugestões
da FIESP são
enviadas no início de janeiro à Comissão Revisora da Tarifa Aduaneira, no Rio.
Apesar do desabafo anterior, a entidade procura valorizar a participação dos
sócios, mencionando 16 comitês de ramos industriais que teriam “enriquecido” o
texto final. Não se deixa de afirmar, porém, que essa colaboração não foi mais
que acessória:
“O nosso trabalho assentou
sobre o importante projeto de reforma feito pelo extinto Centro das Indústrias
com a colaboração das próprias indústrias e de técnicos aduaneiros e foi
completado com as sugestões que recebemos dos comitês acima indicados.”[41]
Cabe notar que
a atitude refratária que vimos notando na classe patronal frente ao projeto
sindical não se restringia a ramos industriais de pequena expressão. A
indústria de calçados, cujas dimensões, obviamente, não tinham comparação com
as das fábricas de fiação e tecelagem, não deixavam, por isso, de constituir um
grupo patronal relativamente importante. Porém, o tom das circulares dirigidas
a esse ramo é o mesmo daquele observado nos comunicados enviados aos outros
ramos já mencionados. Em folheto de maio de 1932, enfatiza-se a importância da
reunião (cujo assunto não é declarado, mas se relaciona provavelmente à greve
que acontecia no ramo):
“Diante do que se passa neste momento na indústria
de calçados, estamos certos de que Vs. Ss. comparecerão.” [42]
Vê-se, no
reverso, que, diante de premência menor, não haveria certeza do comparecimento.
É evidente que a “certeza” encobre uma incerteza
implícita.
A indústria de
calçados é uma das que se supõe se fizesse representar por uma entidade
própria, na década de 20, já que um Centro
dos Industriais de Calçados figura no rol de organizações patronais que
assinam memoriais contra leis sociais em 1927. A dificuldade de arregimentação
desse ramo, que podemos entrever pela leitura das circulares, evidencia quão
representativo podia ser aquela e outras entidades cujos nomes apareciam em
textos dirigidos aos poderes públicos[43].
Em junho de
1932, entrando em vigor a lei de oito horas de trabalho, já se nota veemência
nas solicitações de participação da classe:
“Se todas as pendências, todas as dificuldades,
todos os incômodos e todos os prejuízos decorrentes da aplicação da lei de oito
horas forem comunicados a esta Federação, estamos certos de que poderemos agir
com eficiência em benefício de patrões, de operários e da própria organização
do trabalho.
“Portanto, é indispensável que sejamos
informados com minúcia, por escrito e no mais curto prazo possível.”[44]
A veemência da
convocação torna evidente a dificuldade que se encontrava em mobilizar a
classe.
No relatório
anual de 1933, aprovado em assembléia geral de maio – realizada em segunda
convocação, por insuficiência de número na primeira – a falta de êxito no
projeto organizativo é tornada explícita:
“Quanto à parte financeira dos nossos trabalhos,
devemos lamentar que a exigüidade das mensalidades cobradas da indústria e a
falta de alistamento em nosso quadros social de mais empresas industriais
dificultem grandemente a nossa atividade por carência de recursos pecuniários.
“A indústria paulista ainda não compreendeu
claramente a necessidade de arregimentar-se para poder viver com segurança e
desafogo e verificamos com pesar que freqüentemente os interesses pessoais
tomam o passo aos interesses gerais.
“Enquanto o patronato foge ao espírito da época, que
é o espírito de cooperação, de união estreita, de solidariedade, o operariado
segue rumo oposto, agremiando-se com notável senso das realidades.”[45]
Vale observar
que a organização operária figura como exemplo a seguir, tanto quanto como
advertência da necessidade de os patrões arregimentarem-se. Junto à circular
que traz o relatório, são enviadas propostas de admissão aos associados, para
que tentem filiar outros, “mostrando aos que se afastam dos colegas o erro em
que elaboram”. Vê-se que o problema que se enfrentava não era apenas a
participação dos associados nas campanhas da FIESP, como também a própria filiação dos
patrões à entidade. Numa circular distribuída em julho de 1931, durante o
esforço de criação dos comitês por ramo, chamava-se atenção para o pequeno
valor da contribuição mensal, de 15 mil réis:
“(...) tão insignificante dispêndio não será, por
certo, motivo para que VV. SS. privem a Federação de seu concurso e impeçam a
coesão perfeita da classe industrial de São Paulo.”
No reverso,
lê-se que a taxa podia despertar, ou havia despertado, alguma objeção. Isto é,
pode ter havido questionamento a respeito da validade em se aumentar as
despesas dos estabelecimentos em função do projeto da FIESP[46].
As menções à
atitude refratária dos industriais com relação às iniciativas da Federação são
cada vez mais diretas. Em fevereiro de 1934, já reconhecidos os sindicatos
patronais a ela filiados, um comunicado aos membros do Sindicato das Indústrias
de Produtos Químicos e Farmacêuticos, relatando o discutido numa reunião do
ramo, diz:
“O Sr. Arnaldo Lopes usou da
palavra para lamentar o descaso que a maioria dos associados vem demonstrando
para com as reuniões que periodicamente se realizam e mostrou a necessidade dos
seus membros emprestarem melhor boa vontade e interesse às mesmas reuniões
(...)”[47]
Em 1934, uma
das preocupações centrais da FIESP era a reforma do imposto de consumo, um dos tributos mais
criticados pelas entidades patronais. A entidade havia sido convidada a
colaborar com o ministério da Fazenda e para isso chamou a participação dos
industriais. Esta foi decepcionante:
“Esta Federação (...), reiteradamente, pediu
sugestões aos seus sócios em particular e às indústrias paulistas em geral.
“Devemos registrar com pesar que as sugestões
pedidas não corresponderam à expectativa e que, em vista desta estranhável
indiferença, os trabalhos da reforma prosseguem com morosidade e incertezas.”[48]
Aquele tributo
é alvo de nova mobilização da entidade no ano seguinte. Horácio Lafer,
empresário da indústria do papel, eleito, em 1933, deputado classista ao
Congresso Constituinte, elaborava, em 1935, um projeto para alterar o
regulamento do imposto. A Federação, em circular de fevereiro desse ano[49],
informa a respeito, comentando:
“Uma reforma do Regulamento se impõe desde muito.
Infelizmente, as tentativas de reforma – e elas foram numerosas – fracassaram e
fracassaram principalmente por causa da indiferença dos próprios industriais.
De cada vez que se lhes pediu sugestões, eles se desinteressaram e uma reforma
completa e bem feita não poderá ser realizada sem tais sugestões.”
A entidade
pede as sugestões para o projeto, demonstrando impaciência:
“Esperamos que, desta vez, os industriais paulistas
se interessem pelo importantíssimo assunto (...).”
Aquele estado
de ânimo mostrou-se justificado. Cerca de três semanas depois, a participação
da classe seguia no mesmo padrão:
“(...) grande foi a nossa surpresa verificando que
pouquíssimos interessados atenderam o nosso pedido. Ora isto é tanto mais
estranho quanto é bem sabido que de toda a nossa legislação o regulamento do
Imposto de Consumo é o mais intolerável e o que maiores prejuízos e
preocupações tem causado à indústria manufatureira.[50]
“Se os próprios interessados
não nos prestam o seu concurso, que elementos de estudo poderemos oferecer ao
Dr. Lafer?”[51]
O “movimento
constitucionalista” de 1932 parece ter sido encarado como uma ocasião
privilegiada para a arregimentação da classe e, portanto, para que a Federação
se firmasse como seu porta-voz. Sua adesão ao movimento parece ter guardado
relações com a preocupação em firmar seu projeto de organização da classe. Por
decreto, foi investida do mandato de organizar o cadastro industrial, que visava mobilizar as fábricas para fornecer
o necessário para o aparelhamento militar e o equipamento das forças constitucionalistas. A entidade se
escorou na autoridade do governo estadual para estreitar seus vínculos com os
industriais. Isso fica evidente nos próprios termos com que a eles se dirige.
Os pedidos de informação e as instruções baixadas pela Federação são sempre
encabeçados por sua fundamentação legal, que, destacando a conexão FIESP/governo,
transfere para ela a autoridade deste. Como numa circular distribuída logo no
início do movimento, na qual se apresenta um questionário sobre estoques:
“Usando dos poderes que nos
foram conferidos pelo decreto n. 5.595, pedimos a Vs. Ss. queiram responder
imediatamente aos seguintes quesitos: (...)”[52]
Com tal
autoridade, a Federação obtém um vínculo compulsório com o conjunto dos
industriais, como se numa cadeia de comando militar. Isto é exemplificado pelo
teor da seguinte circular:
“(...) avisamos os
industriais paulistas de que AS FÁBRICAS NÃO DEVERÃO SER FECHADAS SOB
QUALQUER PRETEXTO, SEM AVISO PRÉVIO A
ESTA FEDERAÇÃO.
“Queiram Vs. Ss. tomar nota
desta recomendação, que não deve ser infringida em nenhuma hipótese.
“As fábricas que, por motivo
de força maior absoluta e incontestável, deverem cerrar suas portas, devem
fazer uma comunicação verbal ao Sr. Octavio Pupo Nogueira, das nove
horas ao meio dia.”[53]
Associado ou
não, a iniciativa individual dos industriais passava a depender de aprovação da
entidade. Se determinações como a transcrita acima foram cumpridas, ou se o
efeito do vínculo Federação/governo foi positivo ou negativo para o
estreitamento dos laços com a classe, é algo que a insuficiência de dados
impede afirmar. Mas as circulares apresentam algumas indicações. Num comunicado
de agosto[54],
afirma-se que “a grande maioria” dos industriais e comerciantes
“espontaneamente” estavam garantindo os lugares dos seus empregados mobilizados na guerra, pagando-lhes também seus ordenados[55],
e se observa:
“Não cremos que possa haver exceção, que, além de
injusta, é dissonante e antipática.
“Alguns industriais, no
entanto, não se manifestaram até hoje sobre quais as garantias que podem
oferecer aos seus empregados.”
O texto fecha
com um apelo:
“Para a absoluta harmonia de ação, como medida
equitativa, como providência de amparo e como gesto de solidariedade com a
grande classe industrial, apelamos para os que ainda não se manifestaram a este
respeito, a fim de que adotem quanto antes as providências já tomadas pela
grande maioria, quanto às garantias e amparo aos empregados mobilizados.”
Apesar de “não
crerem” na dissonância, a lembrança da falta de manifestação a respeito indica
a possibilidade do contrário. A referência à “grande maioria” repete um padrão
de convencimento utilizado já no movimento de “sindicalização”, quando se
procurava mitigar o receio de estar-se agindo isoladamente.
Durante o
conflito, a entidade tomou a ombros a produção de café desnaturado com pixe,
como sucedâneo do óleo combustível em falta, e sua distribuição às fábricas. O
episódio pode ser visto como mais uma tentativa de mostrar a importância de
fortalecer o projeto organizativo da Federação, o que parece indicado pela
ampla divulgação da iniciativa. De resto, o dinheiro obtido com a venda desse
combustível ajudou a equilibrar o orçamento da entidade[56].
No início de
setembro, a Federação resolve criar um serviço de assistência médica e
farmacêutica aos operários e suas famílias, justificando-o pela obrigação de
“amparar o operariado paulista que tão nobremente vem contribuindo para a
vitória da causa constitucionalista”. Argumenta-se ainda que as grandes
fábricas teriam serviço médico gratuito, mas as pequenas e médias não. Pede-se
informar se o estabelecimento vai contribuir com “uma pequena taxa mensal” e
qual seria esse valor[57].
Dias depois, a entidade esclarece, num comunicado, com ênfase garantida por
maiúsculas, que a taxa “CESSARÁ IMEDIATAMENTE DEPOIS DE NORMALIZADA A VIDA
PAULISTA”[58].
O
serviço teria sido colocado em prática, segundo anunciam as circulares. Teriam
sido instalados postos médicos no Centro, Brás e Mooca; serviços de
especialidades, “inclusive de moléstias de senhoras”, e de assistência
dentária; um laboratório de análises; e uma “drogaria de emergência”. As
especialidades incluíam “olhos”, “nariz-garganta e ouvidos”, “crianças”,
“pulmões”, “ortopedia”, “ginecologia”, “moléstias da pele”, “cirurgia” e
“clínica geral”.[59]
Findo
o movimento, a Federação propõe a continuidade do serviço, argumentando que
“muitas fábricas” teriam pedido que este adquirisse caráter definitivo. Adverte
que, para tanto, seria preciso que todo o patronato se interessasse.[60]
Isto esteve longe de acontecer. Menos de um mês depois, informava-se o malogro
do empreendimento:
“Como só
uma pequena parte da indústria tenha concordado em nos auxiliar no
prosseguimento do nosso serviço de assistência medica-farmacêutica e
odontológica ao operariado paulista, fomos obrigados a dar por finda a nossa
tão interessante e útil iniciativa.”[61]
Fracassada
a tentativa de organizar um serviço de assistência diretamente subordinado à
Federação, opta-se por criar uma sociedade civil com o mesmo fim. Um ano e meio
depois, em maio de 1934, surge a
Assistência Clínica Comercial e Industrial de São Paulo. À sua frente estava
Arnaldo Lopes, farmacêutico e industrial, que havia dirigido o serviço de
assistência durante o movimento de 32.[62]
Uma circular esclarece que a idéia é “prestar serviços sociais, ficando em
segunda plana qualquer intuito de proventos materiais”. A Federação parecia
estar antevendo problemas:
“Se a
maioria das indústrias paulistas prestar o seu apoio à Assistência, ela vingará
e alargará a sua esfera de ação em proporções realmente notáveis; se porém as
indústrias se desinteressarem de tão útil cometimento, a Assistência talvez
conheça insuperáveis dificuldades para vingar.”[63]
Devemos
observar que os constantes esclarecimentos a respeito da ausência de fins
lucrativos, prestados em todos os casos de iniciativas propostas pela
Federação, dão o que pensar acerca da confiança de que gozava a entidade entre
o conjunto dos industriais.
O
decreto 24.637, de 10.07.1934, que modifica as obrigações resultantes de
acidentes de trabalho, dá azo a nova iniciativa da Federação: criar-se uma
empresa de seguros operários. A idéia é anunciada à classe em agosto. No
comunicado que a divulga[64],
um item do texto legal foi destacado: o que estabelecia a obrigação, para os
patrões que não mantivessem contrato de seguro contra acidentes, de fazer um
depósito de 20 contos, para cada grupo de 50 trabalhadores, em instituições
arrecadadoras ou bancárias oficiais. O depósito poderia ser elevado até o
triplo, em caso de “risco excepcional ou coletivamente perigoso”. Avisa-se que
o Departamento do Trabalho é que fiscalizará, lançando mão de multas. A menção
parece cumprir não apenas o papel de esclarecer sobre a lei: a experiência dos
industriais com a fiscalização do Departamento pouco teve de agradável até esse
momento.
Como
vantagem do empreendimento, apontava-se a perspectiva de módicas taxas de
seguros e de “um perfeito serviço de ambulatório e de hospitalização”,
impedindo-se abusos na aplicação da lei. Além disso, os patrões seriam
acionistas da empresa. Empregando a forma habitual de persuasão, pela qual se
procurava mostrar que não se iria agir isoladamente, a circular lembrava que o
sindicato patronal têxtil do Rio já estava havia alguns anos fazendo o seguro
dos operários de seus associados.
Pouco
mais de um mês depois, em outra circular a respeito do tema, vem o desabafo:
“Pois
bem, do inquérito feito por nós no seio das indústrias paulistas resultaram 10
respostas apenas.
“Repetimos:
10 respostas sobre assunto do mais alto interesse para os industriais.”
– / –
“Sem maiores comentários a
respeito do caso, reiteramos o aviso de que, no próximo dia 12 de outubro a lei
entrará em vigor, devendo os nossos associados segurar os seus operários contra
acidentes de trabalho ou então fazer o depósito (...)”[65]
Vale
observar que há quarenta membros
ocupando cargos eletivos na
Federação.
“O
desinteresse da indústria pelo nosso projeto foi completo. Mesmo assim,
voltamos ao assunto, com a vaga esperança de vencer tão estranho desinteresse.”
Já
se descarta a participação massiva. Dado o desinteresse da classe, opta-se por
uma estratégia baseada na iniciativa de um núcleo de patrões:
“Se
conseguirmos o interesse de tantos industriais quantos sejam necessários para
perfazer o capital inicial, lançaremos as bases da organização, certos do seu
sucesso. Com o decorrer dos tempos o restante dos industriais virá para o nosso
lado.”
A
idéia não trouxe resultados. Em maio do ano seguinte, retoma-se a iniciativa.
Argumenta-se que “a parte mais trabalhosa” na organização da companhia – o que
diz respeito a ambulatórios, médicos, enfermeiros, hospitais – já estava feita:
“Ora o
núcleo destes importantes serviços está organizado e bem organizado na
Assistência Clínica Comercial e Industrial que as indústrias não quiseram até
hoje apoiar, prestigiar e aproveitar em seu beneficio.”[67]
Como
se vê, é bastante provável que o projeto atual já estivesse previsto quando o
anterior foi lançado. Seguindo o padrão de persuasão habitualmente empregado, a
circular enfatiza a ausência de finalidade lucrativa:
“(...)
REPETIMOS: NÃO VAMOS FAZER UM NEGÓCIO E SIM PRESTAR MAIS UM BENEFÍCIO
ÀS INDÚSTRIAS.”[68]
Desta
vez, a Federação optou por não esperar a manifestação espontânea da classe.
Emissários visitariam os patrões:
“Se,
depois desta última tentativa, não conseguirmos organizar a nossa cooperativa
de seguros, lamentaremos que as indústrias de São Paulo não tenham querido
aceitar um serviço de enorme importância que lhes oferecemos.”
Questionários
a respeito foram enviados, mas o assunto acabou morrendo.
Os pequenos
industriais e sua relação com a entidade de classe
Os
pequenos fabricantes não demonstravam pelo projeto organizativo da FIESP o interesse
esperado. Suas circulares, durante a tentativa de sindicalizar a classe, a
partir de junho de 1931, enfatizam sempre a necessidade de “grandes e pequenos”
entrarem para os comitês por ramo. O relatório do sindicato patronal têxtil
referente ao período 1931-1932 lamenta, paralelamente, a falta de adesão das
pequenas empresas[69].
Nos anos 1935-1936, formou-se uma entidade integrada sobretudo por pequenos
patrões, a Federação dos Sindicatos Patronais da Indústria, em contraposição à FIESP. Essa
organização foi absorvida pela Federação das Indústrias Paulistas, fundada em
março de 1937. A FIP
era o “órgão sindical” da FIESP, que congregava exclusivamente os sindicatos. Segundo um
antigo funcionário da FIESP,
que compilou dados sobre a história da entidade num pequeno texto não
publicado, o fato se deveu às divergências provocadas pela participação das
entidades de classe na política[70]
(Scartezini, 1967). Era a época das eleições para a representação classista na
Assembléia Legislativa de S. Paulo.
Os
dados confirmam, pois, a suposição de De Decca de que os pequenos e médios eram
um desafio ao projeto de arregimentação da classe[71].
Mas os “grandes”, se se filiavam com menos hesitação, nem por isso deixavam de
se mostrar refratários aos diversos empreendimentos do Centro ou Federação.
Desde as solicitações de dados para fundamentar memoriais até os projetos de
investimento coletivo, como a citada tentativa de se formar uma companhia de
seguros contra acidentes, sua participação é frustrante para os responsáveis
pelas entidades de classe.
De
resto, a intenção de abranger os pequenos e médios tinha limites, dados pela
preocupação de selecionar os
aderentes. Os organizadores do Sindicato dos Fabricantes de Calçados à Mão de
São Paulo adotaram uma peculiar estratégia para, ao mesmo tempo em que
recrutavam associados, evitar acolher “elementos indesejáveis”. Circular de
setembro de 1935, dirigida aos comerciantes de couros, pedia-lhes que, quando
recebessem fabricantes, lhes informassem da existência do sindicato e os
incentivassem a nele filiar-se. Haveria vantagens para os negociantes:
“Se se
tratar de um fabricante com os requisitos exigidos pelo Sindicato, a inscrição
será feita. Se se tratar de elemento que não corresponde à finalidade do
Sindicato a inscrição não será feita e daí um trabalho de perfeita seleção, do
qual Vv. Ss. também serão beneficiados, pois oportunamente o Sindicato lhes
comunicará o nome dos seus membros e a garantia que cada um oferece como comprador de couros.”
Sendo
esta uma indústria que não exigia senão reduzidas instalações[72],
é provável que agregasse grande número de “pequenos” e “médios”. É possível que
os “indesejáveis” fossem aqueles fabricantes de “fundo de quintal”, que não
pagavam impostos, portanto faziam “concorrência desleal”.
De
forma análoga, o CIFT
levou à frente, nos anos vinte, intensa campanha contra as inúmeras pequenas
fábricas que funcionavam à margem da legislação vigente[73]
(Ferrari, 1988).
Movimento de
secretaria
Poderíamos
supor que, se a participação em reuniões e outras atividades e a adesão às
propostas de empreendimentos coletivos lançadas pela Federação eram em geral
decepcionantes para os que as propunham, pelo menos os serviços prestados pela
secretaria da entidade fossem bastante procurados. Não é o que faz supor o
seguinte apelo, de 1937. Referindo-se a “departamentos especializados” (Fiscal, de Trabalho, de Marcas e
Patentes, de Impostos, de Similares, de Importação, Burocrático, de informações, Sindical, de Biblioteca e
Alfandegário), o texto diz:
“Para que esses departamentos se tornem, entretanto,
realmente úteis, é mister que nossos associados sempre aproveitem os serviços
que, com real boa vontade, esta Entidade lhes oferece. Sobre realizarem, assim,
apreciável economia – pois, tais serviços, quando feitos por outrem, são caros,
enquanto que a Federação nada cobra – os Srs. Associados concorrerão para maior
prestígio da sua sociedade de classe.”
Esses
departamentos existiam havia pelo menos um ano e meio[74].
O enigma: a dupla identidade
Neste
momento, é necessário relatar alguns detalhes de nosso trabalho com as fontes,
que nos levaram a colocar em questão aspectos ligados à identidade das
organizações de classe industriais paulistas. Ao iniciarmos nossa pesquisa,
supusemos que o CIESP
tivesse sido formado a partir de diversas associações patronais que houvessem
unido forças para compô-lo. Saímos à procura de algum sucedâneo, ainda
existente, das entidades que subscreviam memoriais no período anterior à
fundação do Centro. Seriam por elas representados os ramos de fiação e
tecelagem, indústria gráfica, metalurgia, calçados, couros e madeiras. Os
arquivos do CIFT
foram encontrados facilmente no atual sindicato do ramo, o Sinditêxtil.
Documentação de outras entidades, porém, não conseguimos localizar nos diversos
sindicatos patronais que abrangiam os setores acima mencionados. Essa foi, para
nós, uma primeira constatação da importância daquele Centro têxtil: a memória
que podemos ter da atuação dos industriais paulistas foi, em proporção muito
grande, marcada pelos registros daquela entidade. Pareceu-nos, por isso,
surpreendente a ausência completa de referências a esta nas circulares do CIESP (ou FIESP).
Pela
relevância de suas implicações, devemos registrar aqui minudências de nossa
pesquisa, insignificantes, à primeira vista. Abordando as circulares do CIFT, um fato
chamou-nos atenção: as iniciais dos nomes dos funcionários que redigiram ou
datilografaram cada folheto eram as mesmas que havíamos encontrado nas
circulares do CIESP.
Constatamos também que diversas circulares, dos anos de 1928 e 1929, eram
numeradas ou a carimbo, ou com datilografia direta, ou a bico de pena ou a
lápis. Era estranho. Por que o indivíduo que datilografou a chapa para a
mimeografia não bateu também o número do folheto?
Lembramos
então que muitas circulares do CIESP do ano de 1929 (a Biblioteca R. Simonsen não tem todas;
faltam as anteriores à de número 17, que é de 15.01.1929) também não tinham seu
número mimeografado. A numeração tinha sido feita com carimbo ou à mão – a bico
de pena ou a lápis. Comparamos os folhetos de uma e outra entidade. Constatamos
que seu conteúdo era idêntico. Não
apenas o conteúdo, mas a forma. Tudo igual, até os erros de datilografia. A
dedução foi imediata: a mesma circular que era distribuída em nome do CIFT era-o também em
nome do CIESP.
Já
que a mesma circular seria distribuída aos associados de uma e de outra
entidade, era mais prático, concluímos, em vez de datilografar duas vezes a
mesma chapa com numeração diferente, bater apenas uma, deixando em branco o
espaço reservado ao número. A conclusão se confirma pelo seguinte dado: a
prática de deixar esse espaço em branco para ser preenchido depois de impresso
o folheto constata-se apenas a partir da circular nº 775, de 30.04.1928. Nas anteriores, o
número vai mimeografado. Ou seja, a prática começa apenas depois da fundação do
CIESP.
O
sistema foi abandonado depois da circular nº 842, de 24.05.1929, do CIFT. A partir daí,
não se encontra mais carimbo ou outro tipo de registro manual da numeração.
Porém, o padrão observado continua: a maior parte das circulares ou são
absolutamente idênticas nas duas entidades ou variam apenas em algumas
palavras. Nesses comunicados, é muito comum a expressão “este Centro”, já que
válida para ambas as entidades. Quando há a mudança do nome para “Federação” e
“Sindicato”, passa a ser preciso substituir a denominação, conforme se destine
o folheto aos filiados (ou “filiáveis”) de uma ou de outro.
A
identidade não se limita aos folhetos: os dois centros utilizavam o mesmo
prédio, o mesmo telefone, os mesmos funcionários.
Até
1928, ano da fundação do CIESP,
o CIFT dividia
o mesmo local com a Associação Comercial. As duas entidades ficaram na Praça da
Sé até 1926, quando se mudam para o terceiro andar de um prédio na rua José
Bonifácio. Jorge Street, presidente do Centro têxtil de 1926 a 1929, lamentava
a falta de espaço causada pela ausência de sede própria.[75]
Grandes assembléias tinham que ser realizadas em outros locais, como o Clube
Comercial, na rua São Bento[76].
O aluguel do primeiro andar de um prédio, nessa mesma rua, pelo CIESP, vem a calhar,
fornecendo, com seu “salão nobre”, amplo espaço para reuniões e atividades em
geral, ligadas à organização dos industriais. Foi para esse endereço que a sede
do CIFT se
transferiu. É provável que a intenção fosse essa desde a instalação do CIESP ali. O telefone
continuaria a ser o mesmo dos dois endereços anteriores. O número era o mesmo
para CIFT e CIESP.
Em comunicado
do Centro têxtil, mencionam-se “os outros centros industriais de São Paulo”,
que também passariam a funcionar no local[77].
Como vimos afirmando, porém, não foram encontradas evidências de que estes de
fato funcionassem com maior alcance
que para subscrever documentos dirigidos aos poderes públicos.
Embora em junho de 1928 tenha sido inaugurado
o CIESP e em
outubro desse ano tenha sido convocada para sua sede na rua S. Bento uma
reunião do centro têxtil[78],
esta não veio a funcionar como tal, efetivamente, senão a partir de fevereiro
de 1929. No mês anterior, havia sido distribuída uma circular anunciando que os
serviços do Centro (que tanto pode
ser o CIESP
como o CIFT)
estavam sendo organizados[79].
Em comunicado de fevereiro, avisava-se do início das atividades[80].
Confrontando-se
esta última circular com sua contraparte do CIFT, vimos a saber que não apenas o endereço
das duas entidades era o mesmo: o próprio “programa” de ambas era idêntico. A
única diferença é que, no texto do CIESP, há uma passagem em que se diz que o Centro defende os
interesses “das indústrias e do comércio em geral” enquanto, no do CIFT, o trecho
correspondente menciona “indústrias têxteis em geral”[81].
Os serviços oferecidos são obviamente os mesmos, realizados pelas mesmas
pessoas. No relatório do SPITESP
referente aos anos de 1931-1932, Pupo Nogueira lamenta que a secretaria do sindicato
se compõe de apenas três funcionários. Dada a identidade de estrutura entre as
duas associações, segue-se que a FIESP não dispunha de pessoal mais numeroso. Indício disto é a
reduzida quantidade de iniciais (do empregado encarregado da datilografia) que
freqüentam suas circulares, nunca superando aquele número ao longo de cada
período de um ano, até a data do relatório.
Em
1933, a agora FIESP
já havia mudado de endereço. O agora SPITESP foi para o mesmo local: o segundo andar de um edifício
na rua Quintino Bocaiúva.[82]
A
separação de estrutura entre CIFT e CIESP
(ou FIESP e SPITESP) só começa em
março de 1936, quando Otávio Pupo Nogueira, que acompanhou as atividades das
associações industriais desde a criação do CIFT, em 1919, é substituído na secretaria-geral
da Federação por Ciro Berlinck[83].
Até aí, Pupo Nogueira havia acumulado o cargo nas duas entidades; ficou então
com o cargo de secretário-geral apenas no SPITESP. Contudo, permanece como
consultor-técnico da FIESP.
Nesse mês de março, o SPITESP
deixa de compartilhar a mesma sede que a FIESP, mudando-se para outro número da mesma
rua (a Casa das Arcadas). Aí passaria a funcionar também uma sociedade
cooperativa de seguros contra acidentes, “A Textil”, e seu ambulatório. A
empresa, cuja tentativa de constituição no âmbito da entidade têxtil e da FIESP seguimos
durante anos por meio das circulares intercambiáveis das duas organizações, tão
indissoluvelmente ligadas, agora é finalmente formada, mas patrocinada apenas
pelo SPITESP.
Pupo nela trabalhou até o final da década de quarenta.
Depois
da separação, cessa a identidade entre as circulares das duas associações.
Seria
de se supor que a separação se deveu a um crescimento na atividade específica
de cada uma das duas entidades, o qual seria incompatível com a permanência da
mesma estrutura. Porém, indício de salto na solicitação pelos serviços da
Federação temos apenas três anos depois, em 1939, quando esta ampliou suas
instalações telefônicas.
. . .
Serviços
prestados e campanhas conduzidas pelo CIESP – ou FIESP – eram, como se percebe, muitas e muitas vezes os mesmos
que o CIFT – ou
SPITESP –
prestava e conduzia. Não quero dizer, como é óbvio, que serviços e campanhas
fossem duplicados, correndo
paralelamente em cada entidade. As duas associações funcionavam, na maior parte
do tempo, como uma só.
A
intercambialidade das circulares permitia atribuir ao CIESP (ou à FIESP) o que era obra do CIFT (ou do SPITESP). Foi assim,
por exemplo, no caso do confronto com o poder público a respeito do Código de
Menores, ou no da reforma da tarifa aduaneira sobre fios, tecidos e artefatos
de algodão. Em janeiro de 1929, comunicados idênticos de CIESP e CIFT diziam:
“(...)
Graças em grande parte aos esforços deste
Centro, o Governo reformou a Tarifa Aduaneira da Classe 15a,
destacando tal classe do projeto geral, que será estudado pelo Parlamento na
próxima legislatura (...)”[84]
Em
outro exemplo, entre inúmeros, circular do SPITESP diz, em junho de 1932, que,
“atendendo ao pedido deste Sindicato”,
o prefeito prorrogou o prazo para requerer alvarás de licença e para a
exigência de apresentar carteira de identidade de seus dirigentes para
obtê-los. Em circular da FIESP,
do mesmo dia, apenas aquele trecho é alterado, para: “atendendo ao pedido desta Federação”.[85]
É
de se duvidar que se buscasse divulgar todas as circulares do CIESP entre os
estabelecimentos associados ao CIFT. A não ser aquelas com inequívoca origem na primeira
entidade, a distribuição das outras entre os têxteis provocaria um
inconveniente sentimento de desnecessidade
do Centro das Indústrias, ou mesmo a sensação de que algo não estava bem
explicado. Devemos observar, a propósito, que não se nota, nas circulares,
preocupação em atribuir importância à entidade geral, no âmbito dos leitores
dos comunicados da entidade têxtil. Devido ao caráter intercambiável desses
textos, os atos que eram, nas circulares do CIESP (ou FIESP), imputados a esta associação,
passavam, inversamente, a ser postos à conta do CIFT (ou SPITESP), nas circulares deste.
A
indissociabilidade entre a estrutura das duas entidades explica também a
redação de documentos dirigidos aos poderes públicos, nos quais não há
referência explícita a uma ou outra. O sujeito é convenientemente colocado na
primeira pessoa, como no seguinte texto, enviado ao governador de S. Paulo em
abril de 1929, pedindo-lhe seu endosso a uma solicitação ao Congresso contra o
Código de Menores:
“Bondosamente
acolhidos por V. Excia. de cada vez
que tivemos a honra de pedir ao seu
inesquecível Governo amparo a justas reivindicações da nossa classe, vimos de novo à presença de V. Excia.
solicitando o seu valioso apoio a pedido que vamos fazer ao Congresso Nacional.”[86]
As
dificuldades de uma entidade eram também as da outra. O “caloroso apelo” de
Pupo Nogueira, em outubro de 1930, para “serem pontualmente pagas as nossas
mensalidades, aliás tão módicas”, é o mesmo nas circulares das duas associações[87].
É provável que a situação econômica do país influísse no estado da entidade,
mas o apelo do secretário-geral traz à mente suas palavras no relatório do SPITESP de 1931-1932,
que descreve a situação em que se encontrava o sindicato, com sua secretaria
“reduzida a três funcionários”. Pupo menciona outras causas para o problema.
Lamenta a inexistência do “espírito de cooperativismo” no Brasil, a
incompreensão das “vantagens da união entre fatores da mesma obra”, de onde
resultaria “o malogro de todas as tentativas de organização de ‘cartels’ e
‘trusts’, feitas entre nós”. No Brasil, “a luta de concorrência assume aspectos
de verdadeira ferocidade e (...) a organização de associações de classe
representa tarefa difícil”.
Apesar
dos esforços e sacrifícios dos dirigentes, “animados do que chamaríamos o fogo
sagrado”, diz Pupo no relatório,
“(...)
nem toda a classe têxtil está a nosso lado. É bem verdade que as grandes
empresas, sem discrepância, nos trouxeram o seu precioso concurso material e
moral, mas as pequenas ainda não compreenderam que, sem este Sindicato, a vida
lhes correrá difícil e precária.”
Para
propiciar a adesão geral, diz o secretário, “praticamos mensalidades exíguas,
que os tempos atuais não comportam nem justificam”, ocasionando um regime de
déficit permanente para “a maior organização patronal do país”. Conclui:
“É
lamentável que a indústria de tecidos do Estado de São Paulo tenha o seu
sindicato em condições econômicas de contínua precariedade, assistindo ao
sacrifício dos seus funcionários, mal remunerados e sem o incitamento de dias
melhores em futuro próximo ou remoto.”
Pupo
lembra também as condições físicas da sede, circunstância à qual ele,
especulamos, ali presente todos os dias, devia estar particularmente sensível:
“É um
lugar inadaptável à boa conservação da saúde daqueles que aqui labutam, mas
somos forçados a conservá-lo em virtude da utilização de um amplo salão para as
nossas reuniões.”
É
importante notar que as maiores oportunidades para a entidade geral se
apresentar diferenciada da entidade têxtil foram ocasionadas pelos poderes públicos. Foi assim em
1932, durante a insurreição, e foi assim a partir de 1931, quando, sob o
influxo da lei de sindicalização, foram constituídos diversos sindicatos por
ramos de indústria. Em 1933 e em 1935, quando ocorrem as eleições de
representantes classistas, respectivamente, para o Congresso Constituinte e
para a Câmara estadual, há nova oportunidade, já que é a FIESP que organiza a
escolha dos deputados patronais.
Contudo,
vale lembrar que, durante o movimento de 1932, a diferenciação só se dá quando,
pelo decreto 5.595, de 18 de julho, a Federação é encarregada do Serviço de
Cadastro Industrial. Até então, não se nota cuidado, no modo como se redigem as
circulares, em destacar a FIESP em relação ao sindicato têxtil. Só após a criação do
Cadastro é que a Federação aparece como centralizadora das atividades
industriais. Até aí, quem chama à ordem os industriais, conforme se leiam
circulares com timbre (e conteúdo idêntico) de uma ou outra entidade é,
alternativamente, tanto o sindicato como a Federação.
Apesar
desses momentos de diferenciação, na maior parte do tempo o padrão costumeiro
permanece e as circulares continuam intercambiáveis. A opção por esta forma de
redigir talvez levasse em conta a própria dificuldade material de separar uma entidade da outra: como convencer disso os
patrões têxteis, se era visível a identidade de localização, de estrutura e de
atos? A dificuldade em se diferenciar fez com que o CIESP (ou a FIESP) só se apresentasse como uma
associação com identidade própria aos olhos dos industriais de outros ramos que
não o têxtil.
Focalizamos
até agora aquilo que torna indissociável CIESP (OU FIESP) de CIFT (ou SPITESP). Mas é igualmente esclarecedor
constatar aquilo que se vê nos folhetos da entidade têxtil e não se vê nos da entidade geral.
Registre-se
inicialmente que todas as gestões com o interventor João Alberto em torno de
sua determinação de fixar a jornada de trabalho em quarenta horas e aumentar em
5 % os salários dos operários e da questão do cumprimento da lei de férias, em
1930, foram, para o leitor das circulares, postas à conta do CIFT. Não foram
emitidos comunicados do CIESP
a respeito.[88]
De
resto, podemos dizer que todos os assuntos que interessavam especificamente a
indústria têxtil eram abordados apenas pelas circulares de seu sindicato. Como
exemplo, entre muitos, podem-se mencionar um “anteprojeto de ‘cartel’” entre as
fábricas de tecidos paulistas assim como as de outros estados, proposto em maio
de 1930; a questão dos fretes para resíduos das fábricas de tecidos, em agosto
desse ano; a reivindicação, na mesma época, de restringir-se a importação de
máquinas têxteis; e o caso notório das listas de operários “indesejáveis”.
Ao
leitor das circulares da entidade têxtil – aquele que não participasse do
núcleo de seus organizadores, ou que não estivesse a par das iniciativas destes
– o Centro ou Federação das Indústrias devia aparecer como uma entidade algo
distante, talvez mesmo algo “elevada”, e para isto devia contribuir bastante a
prática da associação têxtil de assumir feitos e serviços que, nas circulares
da entidade “geral”, eram a esta atribuídos. Assim, tal prática,
paradoxalmente, podia ajudar a forjar uma identidade distinta para cada um dos
organismos. Isto é, para os leitores têxteis, o CIESP (OU FIESP) só aparecia de tempos a tempos, sem
nunca tratar de assuntos ligados mais diretamente ao dia a dia.
O CIFT e a fundação do CIESP
O
CIESP surgiu
poucos meses depois de uma cisão entre industriais e comerciantes na Associação
Comercial de S. Paulo. No fim de dezembro de 1928, haviam sido organizadas duas
chapas concorrentes para a diretoria da Associação, uma com predominância
massiva de industriais, encabeçada por Jorge Street, outra com presença mais
equilibrada de industriais e comerciantes. Ambas eram apoiadas por empresários
dos dois setores e por bancos. Porém, logo no fim de janeiro do ano seguinte,
foi organizada e em seguida eleita uma chapa de consenso.
O aparecimento
do Centro foi interpretado pela historiografia como desdobramento daquela
disputa: evocou-se o conflito de interesses econômicos, entre importadores de
fios e tecidos e industriais têxteis, e de interesses políticos, entre Partido
Republicano Paulista e Partido Democrático. De Decca, insatisfeito com essas
explicações, viu na disputa uma crise do próprio Estado, entendido este numa
concepção pela qual sociedade civil e sociedade política não se opõem (Decca,
1984, p. 136). A nosso ver, as relações entre um evento e outro ainda estão por
ser melhor explicadas. O fato é que a criação de uma entidade que abrangesse
todos os ramos industriais já existia como projeto desde pelo menos julho de
1927, quando uma circular do CIFT expõe a idéia. Disto se conclui que o episódio da cisão na
Associação Comercial não é o ponto inicial da história do CIESP, embora possa
ter apressado sua fundação.
A mencionada
circular[89]
dá notícia de articulações para formar-se uma entidade abrangendo vários ramos
industriais. Vale a pena focalizar de perto seus termos, que dizem muito sobre
o papel do CIFT
na construção da nova entidade. O texto, de autoria de Pupo, começa descrevendo
um movimento de ação conjunta dos
industriais de diversos ramos:
“Como VV. SS. sabem, o nosso
Centro teve a colaboração de outros grandes centros de classe, existentes em
São Paulo, durante o movimento feito no caso da lei das férias. Da nossa ação
conjunta, resultou o memorial que VV. SS. conhecem e os passos dados junto do
Conselho Nacional do Trabalho, passos que resultaram num grande benefício para
as indústrias nacionais, conforme saberão VV. SS. mais tarde, quando não
mais houver perigo de serem divulgados fatos que ainda devem ser cercados do
maior sigilo.” (Grifos no original.)
Observemos
como é descrita aquela ação. Primeiro, afirma-se que o Centro “teve a
colaboração” de outras entidades, isto é, que dele foi a iniciativa e que os
outros aderiram. Depois, diz-se que houve uma “ação conjunta”, expressão que
denota participação ativa dos outros centros. Por um lado, tencionava-se,
interpretamos, afirmar o papel de liderança assumido pelo CIFT; por outro,
tentava-se compensar o efeito da primeira afirmação, que é o de reduzir o papel
das outras entidades ao de mera adesão, ou seja, o de abrir espaço para se
desconfiar que o CIFT
estava fazendo senão todos, praticamente todos os esforços no “movimento”. Ou,
mesmo, que as outras nele faziam apenas figuração, assinando seus nomes no
documento.
Era
preciso, finalmente, mostrar que, de um forte movimento liderado pelo CIFT resultou uma
importante vitória – poucos dias depois de apresentado ao CNT o documento
mencionado. Não se apresenta esse resultado: misteriosas circunstâncias
desaconselham o alvitre (o “grande benefício” que, ao que se sabe, a associação
almejava no que concerne as férias era a exclusão dos operários do direito a
elas, aceitas apenas para os chamados empregados;
isso não foi obtido).
Um
primeiro cenário está montado: um amplo e ponderoso movimento liderado pelo
“nosso” forte e influente centro, produzindo espetaculares resultados. Está
tudo pronto para entrar em cena um novo personagem:
“De um dos grandes centros
industriais, que colaborou conosco nos últimos e importantes acontecimentos,
partiu a idéia de se fundirem todos os centros de classe paulistas num só
grande centro, que receberia a denominação de Federação dos Centros Industriais
de S. Paulo.”
Apesar
da liderança no movimento, não teria sido da entidade têxtil a idéia de criar o
“grande centro”. Este recurso de argumentação reforça a idéia de um movimento
amplo. Se a iniciativa fosse do CIFT, retornaria a desconfiança que, interpreto, se queria
afastar, isto é, de que o movimento talvez se reduzisse apenas às próprias
articulações do centro têxtil. Por outro lado, se o resultado da fusão dos
diversos centros será a formação de um “grande centro”, isso significa que
essas entidades também tinham peso considerável, portanto, que a entidade da
qual teria partido a “idéia”, cuja denominação não nos é revelada (e aqui a
necessidade de sigilo afirmada no caso das gestões contra a Lei de Férias é –
por um efeito de pura contigüidade discursiva – estendida para as gestões pela
formação da entidade), era, do mesmo modo, uma associação de peso.
Se
a organização iniciadora do novo movimento era consideravelmente forte, e se as
outras que para ele concorriam também o eram, então temos todos os motivos para
nele embarcar. Desse modo,
“Formaríamos
um bloco respeitabilíssimo e daríamos à Federação organização mais ou menos
idêntica à que tem o velho Centro Industrial do Brasil.”
Esse
padrão de convencimento, pelo qual se evocam precedentes, já nos é conhecido de
outras ocasiões. Para tornar a perspectiva mais visível – portanto, mais
plausível – é preciso apresentar um modelo, já existente. O “velho” CIB,
venerável por sua idade, fornece o modelo para a organização do
“respeitabilíssimo” bloco. “Respeitável” e “velho” são idéias que, adjetivando
um e outro termo da comparação, conferem-lhe verossimilhança, potenciando mútua
e positivamente sua carga semântica.
Fixada
a imagem dos outros centros como sólidas, ponderáveis organizações, é possível,
sem receio de outras interpretações, mostrar a “força” do centro têxtil e o
decorrente papel diretor que lhe caberá:
“Como
Centro mais forte do que os outros aqui existentes, dirigiríamos os trabalhos
de fusão.”
Desse
papel vem, como conseqüência lógica, a presença, em posições centrais, na nova
entidade, de figuras que ocupam posição análoga no centro têxtil:
“A Federação teria tantos
diretores especializados quantos forem os centros fundidos com o nosso, e o
organismo teria um Presidente, que seria o Dr. Street, com toda a evidência e
um Secretário Geral que, também segundo toda a evidência, seria o signatário do
presente.”
Os
outros centros ficariam dessa forma “fundidos com o nosso”, mas sua autonomia
seria respeitada:
“Manteríamos
uma secretaria ampla, não perturbaríamos os trabalhos que, no presente, são
feitos pelos outros centros com vantagem para as classes que eles representam
e, nos casos de interesse geral das indústrias, os centros todos colaborariam
numa obra comum.”
“Manteríamos uma secretaria ampla” e “não
perturbaríamos” os trabalhos dos outros centros. Apesar da admirável
coerência de Pupo no uso dos meios discursivos na tentativa de convencimento do
interlocutor, um lapso acaba por denunciar o caráter do projeto. No trecho
acima, desnudam-se os papéis atribuídos a “nós” e “eles”, o Centro têxtil e os
outros centros. O “nós” que manteria a ampla secretaria, se revela, quando se
apresenta como o mesmo que “não perturbaria” a vida dos outros centros,
deixados em seus cantos, a desenvolver seus trabalhos: é o centro têxtil.
Não
estamos aqui afirmando uma “hegemonia” dos industriais têxteis. Isso seria algo
absurdo, já que os maiores industriais do período, entre eles os que estavam à
frente do CIFT,
tinham, como se sabe, capitais em diversos ramos. O que o texto indica, ao
procurar uma consistência na atuação de “outros” centros, é que nem todos os
seus destinatários estariam confiantes na adesão a um centro ou “federação” de
indústrias que não contasse com forte respaldo em outros ramos industriais que
não o têxtil. Se assim era, é preciso considerar, como um dos propósitos do
texto, a busca de adesão daqueles industriais que concentravam seus interesses
basicamente nesse ramo – a nosso ver, principalmente os “pequenos” e “médios” –
e que, por isso, mais provavelmente, fixavam sua perspectiva a partir dele.
Não
encontramos dados que permitissem apurar se figuras de destaque, como Simonsen,
Lafer, Weizsflog, que não tinham capital investido fundamentalmente no setor
têxtil, tiveram papel impulsionador na constituição do CIESP ou aderiram a um projeto já
formulado ou em andamento. Não é nosso propósito afirmar nenhuma relação
estanque entre representantes de setores industriais diversos. Contudo, não há
margem para dúvida, a esta altura da exposição, de que o setor têxtil forneceu
o instrumento organizativo para a
formação do Centro.
Entre a
circular de julho de 1927, que citamos, e a “fundação” do CIESP, em março de
1928, as fontes que encontramos silenciam, abrindo um aparente hiato, em que
não se mostram seqüências da intenção de se criar uma entidade geral. Contudo,
parece-nos pouco plausível que o projeto expresso naquele documento não tivesse
relação com o surgimento do Centro.
. . .
Conclui-se
que o CIESP (ou
FIESP, depois)
permaneceu, após seu surgimento, como nada mais que um projeto durante considerável lapso de tempo. A entidade não
adquiriu movimentos próprios em relação ao CIFT (depois SPITESP) senão em data bastante distante de
sua fundação. Nessas condições, as suas dificuldades eram as da própria
associação têxtil. Seu poder de mobilização – ou mesmo de arregimentação – da
classe permaneceu, mesmo depois de tornar-se independente do SPITESP,
surpreendentemente limitado, assim como seu poder de intervenção na sociedade
de modo geral. Sua influência junto a círculos do governo não parece ter-se
devido tanto a seu poder como entidade
quanto à atividade de seus expoentes de maior projeção. Devemos observar que a
presença destes últimos na historiografia se confunde com os marcos (discursos
etc.) deixados pela intensa atividade de propaganda que – esta sim – parece ter
caracterizado sobremaneira a entidade, desde o espetáculo da inauguração do
Centro até as recepções de autoridades graúdas de todos os setores e reuniões
com estas em sua sede.
Conclusão
Dos
estudos aqui apresentados surge uma imagem do empresariado industrial ao mesmo
tempo mais delimitada e mais ampla do que o fariam supor as correntes
classificações de “taylorista”, “fordista” ou, ainda, certas representações,
preservadas no mundo acadêmico, de uma presença de dimensões titânicas de suas
entidades de classe na esfera da política. Contudo, não nos apressaríamos em
falar em “debilidades”, “defasagens”, “atraso” etc. O historiador, se quer
exercer de fato seu ofício, deve deixar a toga para os que têm por função fazer
julgamentos. O que nos importa é compreender os homens em suas ações no âmbito
social. Para isso é preciso conhecer tanto suas propostas como o debate em que
se colocaram e a partir do qual aqueles adquirem significado, como ainda os
elementos com que contaram para sua realização, entre os quais se destaca a
própria resposta que tiveram por parte daqueles aos quais tais projetos foram
dirigidos. Acreditamos ter fornecido aqui alguns dados que podem contribuir
para esse debate. O que podemos afirmar é que as propostas e atos dos
empresários no período estudado respondiam àquilo que viam como realidade.
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1976.
[1]
Marcos Lima já refutava, em trabalho de 1992, a caracterização dos industriais
brasileiros como fordistas. Lima, 1992, p. 26-44. Este autor chama atenção para
estratégias paternalistas utilizadas
pelos patrões.
[2]
Otávio Pupo Nogueira atribuiu-se a autoria desse texto em seu livro “A
indústria em face das leis do trabalho” (Nogueira, [1935?]). É muito provável
que assim o seja, uma vez que o autor redigiu quase todas as circulares e
outros documentos do CIFT e do CIESP, até pelo menos 1936, e que o memorial era
encabeçado pela primeira destas associações. Encontramos o texto que citamos,
encadernado junto às circulares da entidade, na sede do SIFTG ou Sinditêxtil
(Sindicato da Indústria de Fiação e Tecelagem em Geral, o atual sindicato
patronal têxtil de S. Paulo).
[3]
Deve-se registrar que Pupo Nogueira, na época, não era patrão; mas, na posição
de funcionário mais graduado do CIFT, atuou como seu porta-voz
[4] A
propósito de tal diferença, pode-se consultar Vargas, 2001. Na fala dos
empresários e seus representantes, os empregados
eram os trabalhadores de escritórios, vendedores etc., enquanto que os operários eram os trabalhadores manuais.
Nos textos patronais, a palavra empregado
só passou a ser usada para designar operários
a partir da década de 1930, devido às necessidades de referência à legislação
de trabalho produzida naquele tempo, a qual adotou essa nova terminologia. O
fato lingüístico que distinguia operários
de empregados denotava uma abissal
diferenciação no modo como os representantes patronais viam a possibilidade de
serem concedidos direitos a um e outro grupo de trabalhadores. A idéia de
conceder férias, por exemplo, só era admitida para os empregados.
[5] Pupo
Nogueira também se atribui a autoria deste texto.
[6]
Este e também outros dois textos de Simonsen, (Simonsen, 1928) e As crises no Brasil (Simonsen, [1930?])
são citados como fonte por De Decca (op. cit.).
[7] Boletim do Centro Industrial do Brasil.
1o vol., 1904-1905. Citado em Carone, 1978.
[8] Sobre
“psicotécnica”, ver Simonsen, [1931?], p. 32; sobre revolução industrial na
Inglaterra, ver idem, p. 9; sobre a imputada virtude da linha de montagem, ver
idem, p. 18-19.
*
Este texto retoma parte da dissertação de mestrado de um dos autores: Vargas,
1995. Negócios e representações: os
industriais paulistas entre os anos vinte e trinta. IFCH/Unicamp, Depto. de
História, 1995.
[9] A
mudança, de Centro das Indústrias do Estado de São Paulo, para Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo, representou apenas uma adaptação à chamada
lei de sindicalização (dec. 19.770/19.03.1931), baixada pelo Governo Provisório
em 1931. Veremos que o decreto deu ensejo a novas estratégias de arregimentação
da classe e propiciou formas específicas de relacionamento com esferas do poder
público. Mas a alteração de estatuto não foi encarada, de maneira nenhuma, como
uma ruptura, pelos industriais. O sentido de continuidade foi total. De 1942 em
diante, a entidade volta a se denominar CIESP, passando “FIESP” a designar o órgão
sindical de 2o grau, ao qual ficaram filiados os sindicatos
patronais, por força do decreto 1.402/05.07.1939. Contudo, todas as empresas ou
pessoas filiadas à FIESP até 1942 continuaram filiadas a essa organização,
quando retomou o nome anterior. Observo que, na época, não se usavam siglas
para designar as entidades de classe. Os nomes eram grafados por extenso.
[10] CIESP.
Circular n. 30, de 01.04.1929.
[11] CIESP.
Circular n. 115, de 18.11.1930. A reunião havia sido chamada para 22.11.1930.
[12] CIESP.
Circular n. 140, de 16.05.1931. A data do evento é a mesma da circular.
[13] CIESP.
Circular n. 32, de 02.04.1929.
[14] O
decreto 17.943, que criou o Código, é de 12.10.1927.
[15] CIESP.
Circular n. 47, de 04.06.1929.
[16] CIESP.
Circular n. 55, de 21.06.1929.
[17]
CIESP. Circular n. 61, de 30.07.1929. Deve-se observar que, no caso desta lei
social – e foi uma das poucas que, no âmbito federal, teve aplicação nesse
final da década de vinte – é o Centro, em cuja diretoria estavam representadas
as maiores empresas, que se põe a tentar convencer, com resultado duvidoso, o
conjunto da classe, formada em sua grande maioria por pequenos e médios
fabricantes. De Decca (Decca, 1984, p. 175) sugere que a posição do CIESP
contra as leis sociais tinha em vista propiciar a adesão das pequenas e médias
empresas a seu projeto de arregimentação: na opinião deste autor, apesar de a
grande indústria estar disposta a encarar os custos dessas leis, a entidade
teria que se apresentar contra elas, para que as pequenas e médias aderissem,
uma vez que estas não mostrariam a mesma disposição.
[18] CIESP.
Circular n. 85, de 11.03.1930. Há aqui uma transcrição da sentença, datada de
25.02.1930.
[19] CIESP.
Circular n. 62, de 01.08.1929.
[20] CIESP.
Circular de 04.09.1929.
[21] CIESP.
Circular n. 91, de 17.05.1930, que traz o relatório do exercício de 1929-1930.
[22] CIESP.
Circular s. n., de 09.10.1930.
[23] FIESP.
Circular n. 157, de 13.07.1931.
[24] FIESP.
Circular s. n., de 23.06.1931, dirigida ao ramo de calçados.
[25] FIESP.
Circular s. n., de 27.06.1931, dirigida ao ramo de balas, bombons e chocolates.
[26] Idem.
[27] FIESP.
Circular n. 150-A, de 17.06.1931, dirigida ao ramo de balas, bombons e
chocolates.
[28] FIESP.
Circular n. 149-A, de 16.06.1931, já mencionada.
[29] FIESP.
Circular s. n., dirigida em 23.06.1931 ao ramo de calçados. Grifos no original.
[30] FIESP.
Circular s. n., de 19.06.1931.
[31] FIESP.
Circular s. n., de 19.06.1931.
[32] FIESP.
Circular n. 162, de 20.07.1931.
[33] FIESP.
Circular n. 156-A, de 13.06.1931. A lei mencionada é a de sindicalização.
[34] FIESP.
Circular n. 150-A, de 17.06.1931
[35]
FIESP. Circular n. 149-A, de 16.06.1931, do comitê provisório das indústrias de
alimentação. Maiúsculas no original.
[36] FIESP.
“Circular do comitê n. 3”, de 19.08.1931.
[37] FIESP.
Circular n. 198, de 12.10.1931.
[38] FIESP.
Circular n. 204, de 17.10.1931.
[39] FIESP.
Circular s. n., de 09.11.1931.
[40] FIESP.
Circular n. 231, de 24.12.1931.
[41]
FIESP. Circular n. 234, de 04.01.1932. Os comitês correspondiam aos seguintes
ramos: calçados; amidos; bebidas; óleos; produtos químicos; tintas e vernizes;
chapéus; cimento; louças; chocolates; bombons etc.; balanças; caixas de
papelão; artefatos de borracha; cerâmica de construção; metalurgia; e camas de
ferro.
[42]
FIESP. Circular s. n., de 09.05.1932.
[43]
Vejam-se os memoriais apresentados em 1927 ao Conselho Nacional do Trabalho,
contra a lei de férias; ao presidente do estado de S. Paulo, Júlio Prestes, e
ao presidente da Câmara dos Deputados, ambos contra o Código de Menores; e ao
presidente da Comissão de Legislação Social da Câmara, contra o projeto de
Agamenon Magalhães, que propunha as Caixas de Assistência e Seguro Social
(contra doenças). São assinados pelos presidentes do Centro dos Industriais de
Fiação e Tecelagem, Associação dos Industriais e Comerciantes Gráficos, Centro
dos Industriais Metalúrgicos, Centro dos Industriais de Calçados, Liga dos
Industriais e Comerciantes de Couros e Centro da Indústria de Madeiras. O
último é subscrito, também, pelo Centro dos Industriais de Fiação e Tecelagem
de Algodão, e pelo Centro Industrial do Brasil, ambos do Rio. Os textos
encontram-se encadernados na coleção de circulares do CIFT, arquivada na
biblioteca do Sinditêxtil.
[44]
FIESP. Circular n. 279, de 06.06.1932. Grifos no original. Onde está o negrito,
havia grifos triplos, que não pude
reproduzir nesta edição.
[45] FIESP.
Relatório do exercício 1932-1933. Anexo à circular n. 410, de 08.05.1933.
[46]
FIESP. Circular n. 157, de 13.07.1931, já citada. A mensalidade correspondia
aproximadamente ao valor de cinco quilos de café “extra fino” ou pouco mais de
dez quilos de açúcar.
[47] FIESP.
Circular n. 489, de 20.02.1934.
[48]
FIESP. Relatório do exercício 1933-1934, anexo à circular n. 505, de
23.04.1934. A dificuldade em se obter dados já vinha sendo experimentada desde
as primeiras tentativas do Centro dos Industriais de Fiação e Tecelagem, de S.
Paulo, de compilar uma estatística sobre a produção têxtil, nos anos vinte.
[49] FIESP.
Circular n. 596, de 15.02.1935.
[50]
Devemos observar que, em outros momentos, os responsáveis pela entidade já
haviam feito o mesmo juízo a respeito das tarifas alfandegárias.
[51] FIESP.
Circular n. 603, de 09.03.1935
[52]
FIESP. Circular n. 301, de 20.07.1932. Pelo decreto, de 18.07.1932, o Serviço
foi “confiado à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a qual, para
tal fim, fica investida de plenos poderes para requisitar e obter toda e
qualquer informação, bem como tomar as medidas que se tornarem necessárias ao
perfeito cumprimento do seu mandato”.
[53]
FIESP. Circular n. 309, de 24.07.1932. Grifos no original. No lugar do negrito,
havia duplos grifos, que não pude reproduzir nesta edição. [DÁ PRA FAZER ISSO,
AÍ NESSE COMPUTADOR? SE DER, POR FAVOR, COMUNIQUE-SE COM O AUTOR DESTE LIVRO,
PARA MUDAR ESTA NOTA.]
[54] FIESP.
Circular n. 319, de 03.08.1932.
[55]
Cabe lembrar que, como vimos anteriormente, quando diziam empregados, os textos patronais não se referiam a operários, mas apenas aos trabalhadores
não-manuais, como os de escritório ou balcão.
[56]
Veja-se o relatório anual de diretoria referente ao exercício 1933-1934, da
FIESP, anexo à circular n. 505, de 23.04.1934: “(...) graças à desnaturação do café, as nossas
condições financeiras melhoraram consideravelmente, passando a Federação do
antigo e angustioso regime de déficits para um regime de saldos (...).”
[57] FIESP.
Circular n. 327, de 05.09.1932.
[58] FIESP.
Circular n. 328, de 14.09.1932.
[59] FIESP.
Circular n. 330, de 20.09.1932.
[60] FIESP.
Circular n. 333, de 07.10.1932.
[61] FIESP.
Circular n. 343, de 03.11.1932.
[62] FIESP.
Circular n. 514, de 03.05.1934.
[63] FIESP.
Circular n. 518, de 28.05.1934.
[64]
FIESP. Circular n. 551, de 20.08.1934. A proposta havia sido feita já em 1929
pelo CIFT e provavelmente também pelo CIESP: a circular da primeira entidade,
que faz uma consulta a respeito, traz seu número datilografado diretamente, não
mimeografado. A propósito do significado dessa numeração, veja-se trecho do
presente trabalho, mais adiante.
[65] FIESP.
Circular n. 564, de 25.09.1934. Grifos e disposição estética, do original.
[66] FIESP.
Circular n. 567, de 28.09.1934.
[67] FIESP.
Circular n. 632, de 18.05.1935.
[68] Idem.
Grifos e maiúsculas, no original.
[69]
SPITESP (Sindicato Patronal das Indústrias Têxteis do Estado de S. Paulo).
Relatório do exercício 1931-1932.
[70]
SCARTEZINI, Cássio. CIESP/FIESP (Dados
históricos das entidades da indústria). Texto datilografado, datado de
20.04.1967, elaborado para o DECAD – Depto. de Documentação, Cadastro e
Informações. Encontra-se na Biblioteca Roberto Simonsen.
[71]
Ver nota 42.
[72]
Paulo Álvaro de Assunção, presidente da FIESP, descreve da seguinte maneira o
processo de produção no ramo:
“As fábricas de calçados à mão, que abundam entre
nós, confiam a confecção das diferentes peças que entram na composição de um
calçado a operários especializados. No geral, são operários que trabalham por
tarefa, fora ou dentro do recinto da fábrica. Estes operários armam o
calçado, e a fabrica termina-o, monta-o (...).” Carta dirigida ao
Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Comerciários, datada de 19.09.1935,
anexa à circular n. 660, de 27.09.1935, da FIESP.
[73]
Ver, a respeito, FERRARI, Terezinha. Ensaio de classe: o Centro dos Industriais
de Fiação e Tecelagem de São Paulo (1919-1931)/ estudo sobre a organização do
empresariado têxtil durante os anos vinte. Dissertação de mestrado, PUC-SP,
1988.
[74] O
comunicado consta da circular n. 849, sem data, mas provavelmente de setembro
de 1937 (já que a n. 848 é de 04.09.1937), de conteúdo quase idêntico à
circular n. 721, também sem data, porém provavelmente de março de 1936 (a n.
720 é de 10.03.1936). Entre um e outro texto, transcorre exatamente um ano e
meio.
[75]
Circular n. 657, de 25.11.1926, do CIFT; ata da assembléia geral realizada em
05.11.26, transcrita na circular n. 654, desse mesmo dia, também do CIFT; e
relatório do exercício de 1926-1927, de 15.02.1927, da mesma entidade.
[76]
Ver, como exemplo, a circular n. 796, de 15.10.1928, do CIFT, que menciona
assembléia nesse local.
[77] CIFT.
Circular n. 808, de 12.01.1929.
[78] CIFT.
Circular n. 796, de 15.10.1928.
[79] CIESP.
Circular n. 18, de 15.01.1929 (numeração mimeografada).
[80] CIESP.
Circular n. 21-B, de 05.02.1929.
[81] CIFT.
Circular n. 814, de 05.02.1929.
[82]
Circular n. 373, de 21.01.1933, da FIESP e s. n., com mesma data, do SPITESP. É
provável que a mudança tenha ocorrido entre o segundo semestre de 1932 e
janeiro de 1933: o balanço geral da FIESP referente ao período entre 1o
de junho de 1932 e 31 de abril de 1933 menciona, entre as despesas, os “móveis
e utensílios”, “deixados na rua de São Bento, 47, por força do contrato”.
FIESP. Relatório do exercício 1932-1933, datado de 05.05.1933 e encadernado na
coleção de circulares da entidade, a partir da p. 1425.
[83]
Foi a primeira vez que um patrão ocupou o cargo; mas só ficou até junho de
1938. Deve-se lembrar que o cargo
ocupado por patrões era o de 1o ou 2o secretário. O secretário-geral, que dirigia os trabalhos da secretaria da
entidade, era um funcionário.
[84]
Circulares n. 21, da FIESP, e n. 813, do SPITESP, ambas de 28.01.1929. Grifos
nossos.
[85]
Circulares de 30.06.1932, n. 1.203, do SPITESP, e n. 286, da FIESP. Grifos
nossos.
[86]
Circulares n. 42, do CIESP, e n. 838, do CIFT, ambas de 15.05.1929. Grifos
nossos. O memorial aí transcrito, do qual se extraiu o trecho acima, é datado
de 27.04.1929.
[87]
Circulares s. n. , do CIESP, e n. 923-a do CIFT, datadas ambas de 09.10.1930.
[88]
Ver circulares do CIFT n. 933-A e 935, de novembro, e 936, 939, 940, 941, 942 e
947, de dezembro, sobre o primeiro tópico, e n. 948, 952, 954, 956, 957 e 962,
também de dezembro desse ano, sobre férias. Enquanto, em dezembro de 1930, doze
circulares sobre as questões mencionadas, além de diversas outras tratando de
outros assuntos, eram distribuídas em nome do CIFT, apenas dois impressos saíam
em nome do CIESP. O primeiro, uma circular (n.116, de 06.12.1930), transcreve
telegrama de Lindolfo Collor ao CIESP e se refere a uma reunião entre ele e
industriais de tecidos do Rio e à sua intenção de conversar com representantes
dos industriais paulistas, sobre assunto não declarado. O segundo, apenas um
convite para “assistir e receber” um “ilustre visitante”, o embaixador
italiano, Vittorio Cerruti.
[89] CIFT.
Circular n. 704, de 04.07.1927.
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