domingo, 3 de janeiro de 2016

OPERAÇÃO   CARNE   MOÍDA   (MINCEMEAT)


 Como  os  ingleses  enganaram  Hitler


No  final  de  1942, os aliados (britânicos e estadunidenses) tinham conseguido conquistar todo o norte da África, expulsando de lá as tropas alemãs e italianas. O passo seguinte era a invasão do sul da Europa. A Sicília era um ponto por demais estratégico para a navegação no Mediterrâneo, de tal forma que a invasão daquela ilha era um fato dado como certo não só pelos aliados como também por seus inimigos. Portanto, sua conquista custaria um preço muito elevado em vidas humanas. Logo, era importante enganar as forças do países do Eixo, sobretudo as alemãs, e fazê-las crer que o ataque se daria em outro ponto qualquer, e não na Sicília. Mas como fazer isso?

Foi então que um seleto grupo de oficiais ingleses se pôs a pensar numa ação capaz de ludibriar os alemães. O plano que resultou do esforço desse grupo ficou conhecido pelo nome de operação Mincemeat (carne moída), e foi desenvolvido entre o final de 1942 e o início de 1943. Seu objetivo era enganar os alemães e fazê-los acreditarem que a invasão do sul da Europa pelas forças aliadas se daria em outro ponto que não a Sicília.

A ideia dessa operação tinha partido de ninguém menos que Ian Fleming, que durante a Segunda Guerra Mundial trabalhava na Inteligência Naval Britânica e que posteriormente seria o criador do agente James Bond. Ele havia criado para o governo inglês uma lista com 51 sugestões de truques para enganar os inimigos, sendo a operação Mincemeat a sugestão de número 28.



A ideia consistia em “arranjar um cadáver, disfarçá-lo como oficial do estado-maior e deixá-lo transportar documentos do Alto-Comando revelando que vamos atacar em algum outro lugar. Não precisamos lançá-lo sobre a terra, porque o avião pode cair no mar, em voo para a região do Mediterrâneo. O cadáver com os documentos poderá aparecer numa praia da França ou da Espanha, não importa qual delas. Provavelmente a Espanha será melhor, porque os alemães não terão muito tempo para examinar o cadáver, mas haverá certeza de que receberão cópias dos documentos." (1)

A sugestão foi aprovada e o grupo começou a trabalhar sigilosamente. Primeiramente, foi preciso conseguir o corpo de uma pessoa que tivesse falecido recentemente, e que convencesse os peritos alemães de que se tratava de uma pessoa que tivesse morrido em um desastre de avião no mar, e não por uma outra causa qualquer. Em seguida, o grupo decidiu que o corpo seria levado por um submarino e lançado ao mar nas imediações da cidade espanhola de Huelva, aproveitando um momento em que a correnteza arrastasse o corpo para a praia.

Mas antes que isso pudesse acontecer era preciso tomar uma série de providências. Por exemplo: era preciso vestir o corpo com a farda e acessórios adequados a um oficial de posto médio. E dar-lhe um nome. Foi assim que nasceu o “major Willian Martin”. Era preciso também redigir os documentos que, esperava-se, as autoridades espanholas repassassem para os alemães, pois, embora a Espanha fosse um país neutro, mantinha boas relações com a Alemanha.

Também era necessário providenciar os documentos pessoais do “major”, com direito a uma fotografia (tirada de uma pessoa parecida), e várias outras coisas que poderiam estar nos bolsos de uma pessoa normal qualquer, tais como bilhetes de teatro, recibo de hotel, carta e fotografia de uma suposta noiva, isqueiro, um maço de cigarros e algum. Por último, foi presa ao corpo uma pasta, a qual continha os tais documentos importantes. Eram basicamente cartas endereçadas aos generais Eisenhower (estadunidense) e Henry Wilson (inglês), baseados no norte da África.

Devidamente acondicionado num recipiente refrigerado, o “major” viajou para o Mediterrâneo num submarino e foi lançado ao mar no dia 30 de abril de 1943, às 4h30, a 1.600 metros da praia; as correntes marinhas se encarregaram do restante.

Relatórios capturados depois da guerra confirmaram o sucesso da operação: os documentos realmente chegaram às mãos do inimigo. Os chefes alemães, incluindo Hitler, foram induzidos a crer que os alvos dos aliados eram realmente a Grécia e a Sardenha, e não a Sicília, o que os levou a deslocaram forças para os pontos que seriam atacados. Ainda assim, permaneceu um grande número de soldados alemães e italianos na Sicília quando a invasão começou.

Quanto ao “major”, ele foi devidamente sepultado, na cidade de Huelva. [...] “Quando morreu, solitário e cercado pela névoa úmida da Inglaterra, no fim do outono de 1942, jamais pensou que descansaria para sempre sob o céu ensolarado da Espanha, depois de um funeral com todas as honras militares, nem que prestaria, após a morte, um serviço aos aliados, serviço que salvou várias centenas de vidas inglesas e americanas. Em vida, pouco fizera pela pátria; depois de morto, fez mais do que poderia fazer durante uma vida inteira dedicada à carreira das armas.” (2)
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(1) MONTAGU, Ewen. O homem que nunca existiu. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1978, p. 21.
(2) Idem, p. 13.

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