terça-feira, 13 de março de 2018


OS  ESTADOS  UNIDOS  NOS  TEMPOS  DA  GUERRA  FRIA



 Os Estados Unidos já eram, nos anos que se seguiram à Primeira Guerra Mundial, o país mais rico do mundo. Mas, no período entre as duas guerras mundiais, o governo estadunidense evitou envolver-se nos problemas mundiais. A situação mudou completamente depois de 1945. De fato, depois de sua participação decisiva na Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos começaram a adotar uma política agressiva no cenário internacional. A partir da década de 1940, o país encarnaria o papel de líder na construção de uma nova ordem mundial.
O marco inicial dessa política foi o lançamento de duas bombas atômicas sobre o Japão em 1945, uma demonstração de força desnecessária, mas que deu ao mundo a real dimensão do poder de destruição das armas estadunidenses.
Estados Unidos no século:
superpotência cultural, militar e econômica.
No final da Segunda Guerra, a conjuntura interna dos EUA deixava o país em uma situação confortável em relação às outras nações, o que lhe permitia exercer enorme influência sobre a política e a economia internacional. Segundo o historiador francês Maurice Crouzet, os Estados Unidos tinham 7% da população do globo e ocupavam 7% da superfície terrestre, mas detinham mais de um terço da riqueza mundial. Os EUA fabricavam 60% dos artigos industrializados consumidos no mundo e suas reservas em ouro representavam quase dois terços do total mundial.
O fim da guerra, porém, trouxe de volta o temor de uma nova crise econômica, semelhante à de 1929. E não era para menos: o término do conflito significou a diminuição dos efetivos militares e a inserção de milhares de jovens no mercado de trabalho.
Nos primeiros anos do pós-guerra, essas preocupações se revelaram infundadas. Ao contrário das previsões pessimistas, o que se viu foi uma espantosa expansão do poderio econômico dos Estados Unidos.

O crescimento da economia norte-americana após a Guerra

Várias razões concorreram para esse crescimento:
1. Em primeiro lugar, a capacidade produtiva do período de guerra praticamente se manteve, graças ao aumento da população e à crescente demanda de bens de consumo, reprimida durante os anos do conflito. Assim, se por um lado as indústrias que produziam para a guerra reduziram as atividades, por outro isso foi compensado pelo aquecimento de setores como o de fibras sintéticas e de eletrodomésticos.
2. Em segundo lugar, o comércio exterior também se expandiu. Os EUA se beneficiaram do fato de serem a única nação em condições de abastecer o mercado mundial com produtos industrializados de alta tecnologia. A partir de 1947, o Plano Marshall facilitaria ainda mais as exportações para países europeus.
Poucos anos depois, porém, com a reconstrução da Europa concluída, as nações europeias não só reduziram as importações dos EUA como voltaram a competir no mercado mundial. Com isso, inverteu-se a tendência de crescimento da economia estadunidense, e o fantasma da crise voltou a rondar o país. O declínio da atividade econômica elevou o número de desempregados de 670 mil, em 1944, para mais de 4,5 milhões no começo dos anos 1950.
Na tentativa de reativar a economia, o governo estadunidense tomou uma série de providências: reduziu os impostos, facilitou o crédito ao consumidor para manter a indústria de bens de consumo aquecida e favoreceu a construção de moradias.

1. Os sindicatos se mobilizam
As organizações sindicais surgiram cedo nos EUA. Desde 1886 já existia a American Federation of Labor (AFL), que foi por muito tempo a mais importante entidade sindical do país. Mais tarde, nos tempos do New Deal – década de 1930 –, formou-se o Congress of Industrial Organizations (CIO), fortalecido pelo apoio do governo de Franklin Roosevelt.
Assim organizados, pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial, os trabalhadores dos EUA promoveram uma onda de greves, reivindicando aumento salarial e melhores condições de trabalho. As paralisações atingiram diversos setores da economia, como o automobilístico, o elétrico e o siderúrgico, e chegaram a durar meses.
Em 1946, os EUA enfrentaram a crise trabalhista mais grave de sua história, quando quase dois milhões de operários entraram em greve. Em maio desse ano, os trabalhadores ferroviários suspenderam suas atividades e o país ficou à beira do caos. Foi preciso o presidente Harry Truman recorrer ao Congresso Nacional para poder intervir na situação e evitar a paralisação total dos transportes ferroviários.
Pressionados pelo governo, os empresários concederam ajustes salariais, mas logo em seguida repassaram as despesas para os consumidores, aumentando os preços. A elevação de preços acabou anulando os ganhos salariais, o que levou os operários a novos movimentos grevistas. Foi o que aconteceu de 1946 para 1947 e novamente no final de 1950.
Com o crescimento do movimento sindical, os políticos conservadores passaram a lutar por uma legislação que diminuísse o poder dos trabalhadores. Em junho de 1947, conseguiram a aprovação da lei Taft-Hartley pelo Congresso. Entre outras restrições, a lei limitava as greves em setores considerados de segurança nacional e a contribuição sindical aos partidos políticos, além de exigir dos sindicalistas o juramento de que não eram comunistas.
Em 1955, a AFL e o CIO se fundiram em uma única e gigantesca associação sindical, a AFL-CIO, que reunia 15 milhões de membros.

3. Guerra Fria e macarthismo
Em 1947, o presidente Harry Truman anunciou a intenção do governo dos Estados Unidos de combater a expansão do comunismo. Era o início de uma disputa mundial com a União Soviética, que ficou conhecida como Guerra Fria.
A Guerra Fria não determinou apenas os rumos da política externa dos EUA. Internamente, fez-se presente por meio de intensa campanha anticomunista que atingiu vários setores da sociedade estadunidense.
Teve início a investigação dos funcionários públicos federais para identificar aqueles que fossem comunistas. Mais de três milhões de funcionários tiveram sua vida esquadrinhada e mais de dois mil acabaram demitidos.
No início dos anos 1950, a histeria anticomunista se transformou em verdadeira caça às bruxas. Políticos ambiciosos se aproveitaram da situação para conquistar votos. O senador Joseph McCarthy, político do Partido Republicano, foi nesse período a principal voz anticomunista do país.
McCarthy anunciou (sem ter provas) que possuía uma lista de 205 comunistas infiltrados no Departamento de Estado. A partir dessa acusação, criou-se um comitê especial para investigar a denúncia e o Congresso aprovou uma lei segundo a qual todos os comunistas deveriam se registrar; a lei determinava ainda que, em caso de emergência, os comunistas poderiam até ser isolados em campos de concentração.
Milhares de cidadãos estadunidenses foram submetidos a investigação. Artistas e escritores passaram a ser perseguidos. Nem o Charles Chaplin foi poupado!
Para muitos, isso significou o fim da carreira profissional. O medo disseminado pelo país era tão forte que, muitas vezes, para se salvar, as pessoas delatavam os próprios colegas. Essa campanha persecutória ficou conhecida como macarthismo.

Estados Unidos nos anos 1950:
Crescimento econômico e contradições sociais

O historiador Robert Sean Purdy é especialista em história dos Estados Unidos. Ele trabalhou num projeto de comparação entre a periferia de São Paulo (Brasil) e as periferias de Chicago (EUA) e Toronto (Canadá). No texto a seguir, ele compara a memória coletiva dos estadunidenses com as contradições sociais do território nos anos 1950.
“A imagem dos anos 1950, na memória coletiva, centra-se na prosperidade econômica e na estabilidade familiar. Nessa visão, todo mundo na época tinha emprego estável e ampla oportunidade de mobilidade social. A televisão, o cinema e a literatura de grande público destacaram famílias harmoniosas: pai trabalhador, mãe dona de casa e alguns filhos morando nos crescentes subúrbios em casas com quintais próprios e suas indefectíveis cercas brancas.
Sem dúvida, essas imagens capturam aspectos da realidade da época. O PIB dos Estados Unidos saltou em 250% entre 1945 e 1960, com renda familiar crescente e baixas taxas de desemprego e inflação. A classe trabalhadora obteve acesso sem precedentes à economia de consumo de massa, sindicatos ganharam melhores salários e a expansão de benefícios, e o estado de bem-estar garantia em alguma medida a segurança econômica. Debaixo da superfície, porém, a sociedade afluente dos anos 1950 testemunhou contradições e desafios marcantes.
O crescimento econômico foi inegável, mas nem todo mundo compartilhou da prosperidade.
Em 1960, um quinto das famílias americanas vivia abaixo do nível oficial de pobreza estabelecido pelo governo e muitas outras sobreviveram apenas com a mínima segurança e conforto. A distribuição da renda não mudara muito: a população 20% mais rica continuou controlando 45% de toda renda, enquanto a 20% mais pobre controlava somente 5%.
Indígenas, relegados às reservas no interior dos Estados Unidos, eram as pessoas mais pobres no país.
Idosos e trabalhadores rurais de todas as etnias e as populações afro-americana e latino-americana estavam desproporcionalmente entre os indigentes.
Devido à discriminação e à falta de dinheiro, esses grupos raramente desfrutavam a ‘maravilhosa vida suburbana’, concentrando-se nos centros das cidades, onde empregos, comércios e serviços públicos tornavam-se cada vez menos acessíveis.” PURDY, Sean. O século americano. In: KARNAL, Leandro et al. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2008. p. 230.

4. Direitos civis para os negros
A Guerra Fria foi o tema central da campanha presidencial de 1952. O país estava envolvido na Guerra da Coreia e vivia sob o clima de denúncias criado pelo senador McCarthy. O general Dwight Eisenhower, do Partido Republicano, venceu as eleições e assumiu a Presidência, cargo que exerceu durante dois mandatos (1953-1961).
Ao longo desses anos, apesar da resistência de setores sociais conservadores, a questão racial começou a mobilizar a nação, pois os negros passaram a lutar de forma mais efetiva por seus direitos. A primeira grande vitória da população negra ocorreu em 1954, quando a Corte Suprema decretou a inconstitucionalidade das leis que previam escolas separadas para crianças brancas e negras. A decisão enfrentou a oposição dos estados sulistas, de forte tradição racista.
Em 1955, Martin Luther King, um pastor protestante negro do Alabama, deu início a um movimento para derrubar a proibição de negros viajarem sentados nos ônibus de sua cidade, Montgomery. O que o levou a iniciar o movimento foi o gesto de Rosa Parks, uma costureira de 42 anos, que no dia 1o de dezembro daquele ano se recusou a ceder seu lugar no ônibus a um passageiro branco, como mandava a lei. Foi presa e teve de pagar uma multa. Liderados por Luther King, os negros boicotaram, durante mais de um ano, a empresa de ônibus local. Os que não tinham carro iam a pé para a escola ou para o trabalho. Finalmente, um tribunal aboliu, em 1956, a segregação nos ônibus de Montgomery. Vitórias como essa foram conquistadas, depois, em outras cidades e em outros setores da sociedade estadunidense.
Luther King, ao propor o movimento, inspirava-se na doutrina da resistência pacífica preconizada com sucesso por Gandhi na luta contra o domínio britânico na Índia.
Nas eleições presidenciais de 1960, os estadunidenses deram uma apertada vitória ao democrata John Kennedy, o mais jovem presidente da história do país. Kennedy não chegou a cumprir todo o mandato. No dia 22 de novembro de 1963, foi morto em um atentado, quando desfilava em carro aberto na cidade de Dallas, no Texas. O vice-presidente, Lindon Johnson, concluiu o mandato e, depois, foi eleito para um novo período.
Durante a campanha presidencial, Kennedy havia prometido, no plano interno, reformas na legislação sobre direitos civis, habitação e assistência social. E, no plano externo, ações para melhorar a imagem dos Estados Unidos, abalada pelo avanço científico da União Soviética. A preocupação com o bem-estar social e a política externa teve continuidade no governo Johnson, que desenvolveu o próprio programa, conhecido como Grande Sociedade.
Nesse período, ganharam impulso os movimentos reivindicativos dos estudantes, das mulheres e de várias minorias. A luta contra o preconceito e a discriminação racial alcançou projeção internacional. Várias organizações estavam engajadas nesse movimento, que mobilizou milhares de militantes em todo o país.
Em 1963, Martin Luther King reuniu mais de 250 mil pessoas na Marcha sobre Washington, em apoio aos direitos civis dos negros. Como resultado das mobilizações, o Congresso acabou aprovando projetos de lei que proibiam oficialmente a discriminação racial, transformando-a em crime.
Em 1965, Luther King liderou outra manifestação, também no Alabama, pela extensão do direito de voto aos negros. Os manifestantes foram violentamente reprimidos. Para contornar o impasse, o governo federal, como já havia ocorrido antes, precisou intervir na questão. O Congresso aprovou a Lei dos Direitos Civis, garantindo proteção federal, em todo o país, para os negros poderem votar.
O movimento negro pela igualdade social enfrentou forte oposição, e muitos, como Malcom X (1965) e Martin Luther King (1968), foram assassinados ao longo dessa luta.

5. Vietnã, Cuba e outras crises
A penetração comunista na Ásia era uma das inquietações permanentes dos estadunidenses.
Depois da Segunda Guerra Mundial, os EUA investiram pesado na recuperação econômica do Japão, tentando conseguir um poderoso aliado no continente, capaz de fazer frente ao avanço comunista. Em 1949, porém, a China se tornou comunista, sob a liderança de Mao Tse-tung, e, um ano depois, a Coreia entrou numa guerra que acabou dividindo o país em duas partes, uma delas controlada pelos comunistas.
Por isso, quando os EUA perceberam que o Vietnã poderia seguir caminho semelhante, decidiram intervir diretamente no conflito que tomou conta do país.

Cuba, uma pedra no sapato
Na América Latina, como vimos, a situação começou a se complicar em 1959, com a Revolução Cubana. Até então, quando os governos latino-americanos confrontavam os EUA, eram coagidos a mudar de ideia sem dificuldade.
A vitória de Fidel Castro em Cuba, porém, abalou a hegemonia estadunidense no continente.
Além de se tornar parte do bloco soviético, Cuba deu ao mundo um exemplo de revolução bem-sucedida, o que acabou influenciando o restante da América Latina e do Terceiro Mundo.

6. Reagan: Guerra nas Estrelas e neoliberalismo
Foi nesse quadro que, em janeiro de 1981, Ronald Reagan, do Partido Republicano, assumiu o governo do país. No plano externo, Reagan abandonou a política dos direitos humanos e endureceu as relações com a URSS; financiou os opositores do governo sandinista na Nicarágua, e anunciou um gigantesco programa militar de defesa dos EUA, denominado Guerra nas Estrelas. O programa não chegou a ser implementado por ser muito caro.
No plano interno, Reagan implantou o neoliberalismo, realizando profundos cortes nos gastos públicos, reduzindo o papel do Estado na economia e combatendo o poder dos sindicatos, ao mesmo tempo que, na Inglaterra, Margareth Tatcher implantava o mesmo sistema. Em 1984, Reagan foi reeleito presidente. Um ano depois, Mikhail Gorbachev assumiu o poder na URSS, iniciando as reformas que levariam à desintegração do Estado soviético e pregando o diálogo com os EUA.
Em 1987, Reagan e Gorbachev assinaram o primeiro acordo de redução das armas nucleares.
O sucessor de Reagan foi seu vice, George Bush, eleito em 1988. Bush prosseguiu a reaproximação com os soviéticos até a dissolução do bloco comunista, em 1991. Nesse mesmo ano, os EUA comandaram uma aliança militar de 28 países contra o Iraque, que havia invadido o Kuwait seis meses antes. Mesmo obtendo êxito nas questões externas, Bush teve sua popularidade comprometida, pois, internamente, aumentou os impostos e reduziu os gastos a fim de diminuir o déficit público, porém sem sucesso.


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