quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

RENASCIMENTO  E  HUMANISMO


 Uma das mudanças mais importantes na passagem da Idade Média para os Tempos Modernos foi representada pelo Renascimento. As origens desse movimento podem ser encontradas ainda na Baixa Idade Média, quando, a partir do século XI, o comércio e as cidades voltaram a florescer em diversas regiões da Europa.

O crescimento das cidades criava um ambiente social que favorecia o desenvolvimento de atividades intelectuais e artísticas. Não por coincidência, foram justamente as cidades mais ricas, localizadas no norte da Península Itálica, que se tornaram os primeiros e principais centros de difusão do movimento renascentista.
Com o Renascimento, surgiu a figura do mecenas, um indivíduo rico que patrocinava os artistas. Em geral, os mecenas eram elementos da nobreza, do clero e da burguesia. Financiar os artistas era uma forma de atraí-los para seu círculo de influência e isso rendia prestígio social.
O termo “mecenas” se origina do nome de Caio Mecenas, que viveu em Roma no século I a.C. e foi amigo do imperador Otávio Augusto. Sendo muito rico, deu-se ao luxo de patrocinar o trabalho de artistas e poetas da época.
Entre os principais mecenas da Península Itálica, destacaram-se a família Sforza (do ducado de Milão), os Médicis (família de banqueiros que exercia o controle político da República de Florença) e os papas Júlio II e Leão X.


O humanismo renascentista
No âmbito do pensamento, o Renascimento caracterizou-se pelo destaque dado ao individualismo, ao racionalismo e ao humanismo.
O individualismo, crença de que o ser humano poderia tudo, desde que tivesse vontade, talento e capacidade de ação.
O racionalismo enfatizava a razão como principal instrumento para compreender o Universo e a natureza, colocando-a acima das outras faculdades humanas, o fundamento de todo conhecimento.
O humanismo, por sua vez, colocava o ser humano como centro das preocupações e indagações dos pensadores, considerando-o a obra suprema de Deus. Essa orientação é denominada antropocentrismo e representava uma forte oposição ao teocentrismo (theós vem do grego e significa “deus”) da Igreja Católica.
Em 1455, o germânico Johannes Gutenberg (c. 1398-1468) inventou a imprensa, sistema de impressão com tipos móveis que revolucionou o processo de produção dos livros, até então feitos à mão. Com o novo invento, foi possível propagar as ideias humanistas a um número cada vez maior de pessoas.
Deve-se observar que os tipos móveis para impressão já eram conhecidos no Oriente desde muitos séculos antes, mas por várias razões (inclusive a complexidade dos sistemas de escrita) a imprensa não prosperou no local. Na Europa aconteceu o contrário: quando Gutenberg apresentou seu sistema de impressão (que incluía os tipos móveis reutilizáveis de chumbo, a prensa e um novo tipo de tinta), sua invenção teve sucesso instantâneo.

2. Onde tudo começou
Embora tenha sido um movimento de ampla repercussão, a Renascença teve origem na Península Itálica e foi nela que alcançou sua maior expressão. Ali, esse grande movimento cultural costuma ser dividido em três períodos: o pré-Renascimento (ou trecento), o Quattrocento e o Cinquecento.

Trecento, o pré-Renascimento
Os anos 1300 (trecento) são considerados, por alguns estudiosos, o momento inicial do movimento. Os representantes dessa época, embora ainda carregassem traços medievais muito fortes, já apontavam para uma nova forma de expressão artística.
Ao contrário dos autores medievais, que escreviam em latim, alguns escritores e poetas do Trecento expressavam-se no idioma toscano, do qual surgiria o italiano moderno.
Além disso, criticavam a visão restrita da Igreja, enalteciam o espírito de investigação e revelavam intensa paixão pelos autores da Antiguidade clássica.
O Trecento teve seu principal centro em Florença, onde havia uma concentração de ricos mercadores e banqueiros.
Na literatura, o período é representado por Francesco Petrarca (1304-1374), precursor do humanismo renascentista, e Giovanni Boccaccio (1313-1375), autor de Decameron.
Na pintura, destacou-se principalmente Giotto di Bondone (1267-1337), que explorou a técnica do afresco, um tipo de pintura realizada em paredes. Em vez dos personagens rígidos da arte medieval, Giotto esforçou-se para dar vida, movimento e expressão às figuras e às cenas que pintou.

O Quattrocento
Durante o Quattrocento (anos 1400), os artistas procuraram aperfeiçoar suas técnicas aproximando-se da ciência. Os pintores passaram a fazer uso da geometria e criaram a perspectiva, recurso que lhes permitia reproduzir na tela cenas tridimensionais.
Se durante o Trecento predominaram o afresco e a pintura em madeira, agora os artistas preferiam pintar em telas de tecido resistente apoiadas em cavaletes. O novo suporte deu mais independência à pintura: a tela podia, simplesmente, ser enrolada e levada de um lugar para outro.
Entre os grandes artistas do período, vale citar o arquiteto Fillippo Brunelleschi (1377-1446), cuja obra mais expressiva foi a gigantesca cúpula da Catedral de Florença. Entre os escultores, destacou-se Donatello (1386-1446). Na pintura, despontaram Masaccio (1401-1428), Sandro Botticelli (1445-1510); autor de O nascimento de Vênus), Paolo Uccello (1397-1475), Fra Angelico (1387-1455) e Andrea Mantegna (c. 1431-1506).

O Cinquecento e o apogeu da Renascença
Período de plena maturidade do Renascimento, no Cinquecento (anos 1500) destacaram-se Leonardo da Vinci (1452-1519), Michelangelo Buonarroti (1475-1564) e Rafael Sanzio (1483-1520).
Os dois últimos trabalharam sobretudo em Roma, que substituiu Florença como o mais destacado centro artístico nesse período.
Leonardo da Vinci distinguiu-se em muitos campos do conhecimento, como a engenharia, a arquitetura, a matemática e a física, mas notabilizou-se sobretudo como pintor. É conhecido pelo tratamento psicológico que dava aos personagens e pelo domínio da técnica que ele mesmo chamou de chiaroscuro (claro-escuro), que consiste no jogo de luz e sombra. Suas obras mais famosas são Sant’Ana, Monalisa e A última ceia.
Escultor e pintor, Michelangelo foi o autor dos afrescos da Capela Sistina, em Roma. Como escultor, suas obras inspiraram artistas de todas as épocas. Entre as mais importantes, destacam-se Pietà, Moisés e Davi.
Rafael trabalhou em Roma sob os auspícios dos papas Júlio II e Leão X. Reproduzia temas religiosos – fez numerosas representações de Nossa Senhora (Madona) – e também pagãos, como é o caso de A Escola de Atenas, em que resume a história da filosofia grega.
No âmbito da literatura e do pensamento político, o Cinquecento produziu autores de importância universal, como Ludovico Ariosto, Torquato Tasso e, principalmente, Nicolau Maquiavel (1469-1527).
Escritor, historiador e pensador político, Maquiavel é autor da obra O príncipe, tratado no qual faz uma reflexão sobre a natureza do poder político e dá conselhos aos soberanos quanto à melhor forma de constituir um governo centralizado e unifi car a Península Itálica.

3 O movimento se expande
Da Península Itálica o movimento renascentista difundiu-se pela Europa, alcançando maior expressão nos países em que o desenvolvimento urbano e mercantil era mais intenso.
Flandres – Por esse nome era conhecida a rica região que hoje corresponde à Bélgica e à Holanda. Além de centro comercial, Flandres apresentava grande expansão das atividades manufatureiras e bancárias. A pintura assumiu ali características próprias, diferentes das tendências dominantes na Península Itálica, onde era maior a influência da arte greco-romana. Seu maior representante foi Jan van Eyck (1390-1441), autor de retratos e cenas religiosas.
Entre os pensadores, a mais notável figura do Renascimento flamengo foi Desidério Erasmo (1466-1536), ou Erasmo de Roterdã. Seu trabalho mais conhecido é Elogio da loucura, de 1511, obra que ele dedicou ao inglês Thomas Morus.
Erasmo foi um crítico do pensamento dogmático: defendia o retorno da Igreja à simplicidade proposta nos Evangelhos.
Sacro Império – Nas cidades mais ricas – localizadas justamente nas rotas de comércio que ligavam o norte ao sul da Europa –,sobressaíram dois dos principais artistas do Sacro Império: os pintores Albrecht Dürer (1471-1528) e Hans Holbein, o Moço (1497-1543), ambos familiarizados com a pintura da Península Itálica. Holbein notabilizou-se como retratista, sendo muito conhecidos os retratos que pintou de Erasmo e do rei inglês Henrique VIII.
O Renascimento no Sacro Império caracterizou-se, mais do que na pintura, pelos notáveis estudos humanistas realizados nas universidades, em fins do século XV.
Seguindo a trilha aberta por Erasmo, os humanistas insistiam nas críticas à Igreja. Foi por esse caminho que seguiu Martinho Lutero, dando início à Reforma Protestante. Após sua morte, seu colaborador, Philip Melanchthon, tornou-se o principal líder do luteranismo.
Inglaterra – O desenvolvimento da cultura renascentista ocorreu tardiamente na Inglaterra, e seus principais representantes são escritores.
Um deles foi o humanista Thomas More, ou Morus (1478-1535). Sua obra mais conhecida é Utopia, palavra grega que significa “nenhum lugar”, na qual descreve uma sociedade ideal. Para escrevê-la, inspirou-se no relato de Américo Vespúcio sobre a América.
O mais conhecido representante do Renascimento inglês foi William Shakespeare (1564-1616), autor de Romeu e Julieta, Hamlet, Rei Lear, Macbeth e inúmeras outras obras que se colocam entre as mais importantes do teatro universal.
França – O Renascimento foi um movimento principalmente literário e filosófico na França. Na literatura, o nome de maior expressão foi François Rabelais (1495?-1553?), autor de Gargântua e Pantagruel, sátiras que criticavam os costumes da época, particularmente a tirania, o dogmatismo da Igreja e a guerra.
No âmbito da filosofia, Michel de Montaigne (1533-1592) escreveu os Ensaios, reflexões filosóficas   feitas a partir da leitura dos autores clássicos.
Espanha – O Renascimento teve início bem cedo na Espanha, quase ao mesmo tempo em que na Península Itálica, em virtude dos frequentes contatos entre as duas regiões. Apesar disso, a cultura renascentista enfrentou problemas em terras espanholas, por causa da intolerância da Igreja Católica, manifestada por meio da Inquisição.
O grande nome do Renascimento espanhol foi o escritor Miguel de Cervantes Saavedra (1547-1616), autor de Dom Quixote, sátira que narra as desventuras de um nobre (fidalgo) espanhol influenciado pela leitura de novelas de cavalaria.
Portugal – Dois autores se destacaram na cultura renascentista portuguesa: Francisco Sá de Miranda (1481-1558), que se notabilizou em vários campos da literatura, e especialmente Luís de Camões (1524-1580), considerado um dos maiores poetas da língua portuguesa. A mais conhecida de suas obras é Os lusíadas, poema épico que narra as conquistas marítimas lusitanas.

4. Avanços científicos
A época renascentista também apresentou importante desenvolvimento no campo das ciências. Assistiu-se ao impulso do conhecimento nas áreas da astronomia, da matemática, da física e da medicina.
Veja alguns dos principais cientistas desse período:
Miguel de Servet (1511-1553) – médico e humanista, descobriu a chamada “pequena circulação” do sangue ou circulação pulmonar.
Willian Harvey (1578-1657) – fisiologista e anatomista, desvendou a circulação do sangue.
Nicolau Copérnico (1473-1543) – notabilizou-se como astrônomo. Em seu livro Sobre as revoluções dos corpos celestes, desenvolveu a teoria heliocêntrica, segundo a qual a Terra e os outros planetas giram em torno do Sol (hélio, em grego). Derrubou, assim, a velha teoria geocêntrica, formulada na Antiguidade por Cláudio Ptolomeu e adotada pela Igreja Católica. De acordo com o geocentrismo, a Terra seria o centro do Universo e o Sol giraria em torno dela.
Johannes Kepler (1571-1630) – demonstrou que os planetas descrevem uma órbita elíptica, e não circular, como pensava Copérnico.
Galileu Galilei (1564-1642) – considerado o fundador da física moderna, investigou as leis do movimento dos corpos. Com um telescópio por ele mesmo construído, observou o céu e chegou a conclusões semelhantes às de Copérnico.
Francis Bacon (1561-1626) – divulgou o método indutivo de conhecimento, pelo qual se deve partir da observação das coisas concretas para se chegar à compreensão das leis e processos gerais ou universais. Para ele, o conhecimento científico só poderia ser alcançado por meio da observação e da experimentação.
A Igreja Católica reagiu de modo intolerante a muitas dessas ideias e avanços científicos porque questionavam dogmas religiosos. Assim, para não perder o controle nem o poder sobre o conhecimento e os fiéis, não hesitou em recorrer à Inquisição e punir aqueles que discordavam de seus ensinamentos.

Galileu Galilei, por exemplo, esteve preso e só não foi para a fogueira porque renegou suas descobertas. Já Miguel Servet, quando de passagem por Genebra, cidade então governada por Calvino, foi preso, acusado de heresia (entre outras coisas, ele defendia o batismo na idade adulta) e morreu na fogueira em 1553.

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