sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

GRANDES  NAVEGAÇÕES


  De forma geral, podemos dizer que os europeus foram impelidos a empreender as Grandes Navegações por duas razões econômicas: as necessidades de expandir o comércio e de obter grandes quantidades de metais preciosos.


Entretanto, nem só de causas econômicas se faz a história. Havia também naquelas circunstâncias uma confluência de outros estímulos: ambições pessoais, espírito de aventura e fervor religioso. Na Península Ibérica, por exemplo, disseminou-se a ideia de que, uma vez expulsos os muçulmanos do território, seria preciso propagar a fé cristã por todas as regiões do mundo.
Reunidos esses anseios, o Estado moderno, com sua monarquia fortalecida e seu território unificado, surgiu como instrumento capaz de concretizá-los. Graças ao apoio da burguesia, aos impostos cobrados da população e aos empréstimos contraídos junto aos banqueiros, o rei pôde reunir o capital necessário para financiar as viagens marítimas.

O Atlântico como solução
O comércio, tendo ressurgido na Europa a partir do século XI, vinha crescendo rapidamente, estimulado em grande parte pela reabertura do Mar Mediterrâneo e pelo restabelecimento dos contatos com o Oriente após as Cruzadas. Esse crescimento, interrompido em virtude da crise do século XIV, foi retomado em seguida, com mais vigor ainda.
No início do século XV, era intenso o comércio de produtos vindos do Oriente: as chamadas especiarias – cravo, canela, pimenta –, seda e outros artigos. Esses produtos eram trazidos pelos árabes até os portos do Mediterrâneo, onde eram comprados, principalmente, pelos mercadores da Península Itálica, que os revendiam na Europa. Esse quase monopólio encarecia muito os artigos orientais. Impedidos de efetuar negócios mais lucrativos, os comerciantes de outras regiões começaram a procurar no Atlântico a saída para esse entrave.

A queda de Constantinopla
Por muito tempo, um grande número de historiadores considerou decisiva para a expansão marítima a tomada de Constantinopla pelos turcos, em 1453. Com a queda da cidade, acreditava-se que o comércio entre o Ocidente e o Oriente teria sido interrompido na região do Mediterrâneo.
Entretanto, é importante ressaltar que esse acontecimento, embora tenha dificultado o comércio das especiarias, não o impediu: ele passou a ser monopolizado ainda mais pelas cidades da Península Itálica. Além disso, quando os turcos tomaram Constantinopla, os portugueses já haviam dado início às suas viagens marítimas e à exploração da costa africana.

À procura de metais preciosos
Outro motivo que levou os europeus a realizar as navegações foi a busca de metais preciosos, pois a expansão do comércio acarretava uma necessidade crescente desses metais para a cunhagem de moedas. Ora, boa parte do ouro e da prata existentes na Europa era destinada ao pagamento de mercadorias no comércio com o Oriente. Por isso, os dois metais se tornaram escassos no continente, forçando a procura por novas fontes fora da Europa.

Progressos técnicos e científicos
As Grandes Navegações não teriam sido possíveis sem os avanços já alcançados nas técnicas de navegação em alto-mar e o aprofundamento dos conhecimentos científicos alcançados pelos europeus no século XV.
Entre os progressos técnicos estavam instrumentos como a bússola e o astrolábio, além, é claro, da caravela. Muitos desses equipamentos já eram utilizados por outros povos e foram aperfeiçoados e adaptados pelos portugueses à navegação marítima.
Duas outras novidades estavam no campo bélico e foram decisivas para o domínio europeu sobre outros povos: a pólvora e o canhão, trazidos do Oriente. De posse da bússola, do astrolábio e da caravela, os europeus puderam ir muito longe com suas expedições marítimas. Os canhões e a pólvora, por sua vez, possibilitaram a conquista de terras em outros continentes.

2. Portugal e o desafio do Atlântico
A que se deveu o papel pioneiro desempenhado por Portugal no processo das Grandes Navegações?
Por que foi possível a esse país tão pequeno lançar-se ao Atlântico e construir um império transoceânico muito antes que o fizessem reinos maiores e mais poderosos?
Até meados do século XV, a principal rota comercial do mundo europeu era a que ligava por terra as cidades da costa do Mediterrâneo às do norte da Europa. Com a Guerra dos Cem Anos (1337-1453), essa via entrou em decadência. O comércio passou a ser realizado por uma rota marítima que partia do Mar Báltico e do Mar do Norte e chegava ao Mediterrâneo e vice-versa. Essa troca de rotas foi possível graças aos progressos obtidos na arte de navegar e nas técnicas de construção naval.
Com a mudança, as regiões centrais do continente europeu acabaram perdendo importância comercial. As regiões costeiras ao Atlântico, ao contrário, foram beneficiadas, tornando-se passagem obrigatória dos mercadores que transitavam entre o norte e o sul do continente em busca de negócios lucrativos.
Assim, a nova rota marítima deu a Portugal, no século XIV, a oportunidade de integrar-se às atividades mercantis efetuadas entre as regiões mais prósperas do continente europeu. As consequências imediatas para os portugueses foram o crescimento de cidades portuárias, como Lisboa e Porto, e a realização de contatos comerciais regulares com as cidades da Península Itálica e com a França, a Inglaterra, Flandres e as cidades do Sacro Império.
Mas efetuar as navegações costeiras entre o norte da Europa e o Mediterrâneo constituía um empreendimento inteiramente diferente de enfrentar o Oceano Atlântico, desconhecido para além dos limites da costa.
A atividade pesqueira, prática largamente difundida no litoral português, sem dúvida contribuiu para que os portugueses se familiarizassem com o Oceano Atlântico e aprendessem a enfrentar o mar aberto.
Além disso, as cidades portuárias de Portugal funcionavam como uma espécie de entreposto para o abastecimento das embarcações que utilizavam a rota marítima do Atlântico. Como consequência, Portugal acabou transformando-se em um importante centro onde circulavam as ideias mais avançadas a respeito de navegação.
Nessa época, Dom Henrique, o Navegador – filho do rei Dom João I –, reuniu inúmeros cartógrafos, navegadores e astrônomos para desenvolver em Sagres estudos e experiências náuticas. Mais tarde, o conjunto de ideias ali gerado foi denominado Escola de Sagres.

A opção pelas navegações
Diversos setores da sociedade portuguesa estavam interessados nos benefícios propiciados pelas navegações. Os motivos eram os mais variados e compreendiam, entre outros, aspectos políticos, econômicos e religiosos.
A monarquia portuguesa desejava fortalecer seu poder e construir um império. Para isso, fazia-se necessário conquistar novas terras e controlar uma vasta rede comercial. Os motivos da nobreza não eram muito diferentes. Os nobres vislumbravam na expansão territorial uma oportunidade para conquistar terras, riqueza, títulos e, claro, mais prestígio. A Igreja, por sua vez, estava interessada em expandir a fé católica e aumentar o número de fiéis.
Para a burguesia, os motivos eram bastante evidentes: a expansão territorial e o contato com outros povos só fariam aumentar as atividades comerciais e os lucros. Finalmente, para o chamado “povo miúdo”, as navegações abriam possibilidades de trabalho, de ascensão social, de aventuras e de enriquecimento rápido.

Pela costa africana
A expansão portuguesa começou em 1415, com a tomada de Ceuta, importante centro comercial dominado pelos muçulmanos no norte da África.
Em seguida, Portugal ocupou as ilhas Madeira, Açores e Cabo Verde, no Oceano Atlântico. Ali, a Coroa portuguesa realizou uma experiência de colonização, implantando o cultivo de cana-de-açúcar. Essa experiência serviria mais tarde de modelo para a ocupação das terras americanas.
A expansão estendeu-se ao longo do litoral africano, onde os portugueses obtinham produtos como pimenta, ouro e marfim. Em 1434, venceram o desafio da ultrapassagem do Cabo Bojador, onde vários navegadores já haviam naufragado. Nessa mesma época, deram início ao tráfico de escravos africanos, levando-os para as colônias nas ilhas do Atlântico ou comercializando-os na Europa.
Somente várias décadas mais tarde, entre 1487 e 1488, Bartolomeu Dias alcançou o Cabo da Boa Esperança, no extremo sul da África.
Este último feito abriria caminho para a realização de um projeto mais ambicioso, esboçado após a conquista do Cabo Bojador: chegar às Índias contornando a África.
Em 1497, dez anos após a viagem de Bartolomeu Dias, o rei Dom Manuel, o Venturoso (entre 1495 e 1521), entregou a Vasco da Gama o comando de uma expedição que deveria estabelecer relações comerciais com as Índias. Ela contava com cerca de 170 homens, incluindo marinheiros, militares e religiosos, ocupando quatro navios. Dez meses depois da partida, em maio de 1498, Vasco da Gama chegava a Calicute, próspera cidade do litoral indiano. Seu retorno a Lisboa ocorreu em setembro de 1499. De sua expedição restaram apenas dois navios e 55 homens e a certeza de poder estabelecer uma rota comercial entre a Europa e o Oriente contornando o litoral da África.

Vera Cruz
Animado com as possibilidades de lucros que a rota recém-aberta oferecia, o rei Dom Manuel organizou uma nova expedição. Seu objetivo principal era impor o domínio português sobre o comércio dos produtos orientais.
Comandada por Pedro Álvares Cabral, a frota partiu em março de 1500, mas não tomou diretamente o rumo para as Índias. Provavelmente, tinha outro objetivo não declarado: tomar posse de uma enorme porção de terras no Atlântico sul. Assim, abandonou o litoral africano em direção ao mar aberto e, em 22 de abril, chegou às terras que denominou Ilha de Vera Cruz e que, mais tarde, passariam a se chamar Brasil.
Depois de formalizar a posse das terras em nome de Portugal, Cabral enviou a Lisboa um navio com informações sobre a conquista e prosseguiu viagem em direção ao Oriente.
Os europeus ainda não sabiam, mas a porção de terras encontrada nessa outra margem do Atlântico fazia parte de um enorme continente, mais tarde batizado com o nome de América e que desde 1492 era explorado, na porção norte, pelos espanhóis.

Portugal comanda o comércio
Com a descoberta do caminho marítimo para as Índias, intensificou-se o comércio de especiarias. O aumento da oferta desses produtos levou à queda dos preços no mercado. À medida que mais pessoas podiam comprá-los, ampliavam-se as atividades comerciais na Europa.
A partir desse momento, a rota do Mediterrâneo entraria lentamente em decadência, provocando o enfraquecimento das cidades mercantes da Península Itálica.
Portugal alçou-se ao primeiro plano entre os Estados mais poderosos da Europa. Essa condição, todavia, duraria pouco tempo, pois logo a rota das Índias começou a ser disputada por outras potências europeias. Portugal voltou-se então para a exploração das terras americanas.

3. Colombo chega à América
Embora os espanhóis já tivessem, no início do século XV, tomado posse das Ilhas Canárias, no Oceano Atlântico, a noroeste da África, sua expansão marítima e comercial só começou efetivamente no final do século XV, após a expulsão definitiva dos muçulmanos da Península Ibérica.
De fato, em 1492, uma expedição comandada pelo piloto genovês Cristóvão Colombo fez algo que até então parecia impossível: atravessou o Atlântico e tomou posse, em nome dos reis espanhóis, de terras localizadas na região central de um novo continente, que veio a se chamar América.
Colombo tinha a intenção de atingir o Oriente navegando em direção ao Ocidente. Naquele tempo, a maior parte da população acreditava que a Terra era plana. Mas entre as pessoas mais esclarecidas, entre elas Colombo, já era bastante difundida a ideia de que a Terra fosse redonda. Navegando conforme seus planos, Colombo encontrou a atual Ilha de São Domingos, na América Central. Imaginou ter chegado às Índias. Por essa razão, chamou de índios os habitantes do lugar.
O feito de Colombo criou um problema diplomático com Portugal. Motivo: em 1479, os dois países haviam firmado o Tratado de Alcáçovas. Esse tratado previa uma linha horizontal (um paralelo) passando na altura das Ilhas Canárias como divisória das terras descobertas ou por descobrir entre os dois países. Tudo o que ficasse acima dessa linha seria espanhol; o que estivesse ao sul seria português. Ao ser informado das descobertas de Colombo, o governo português alegou que elas estavam na área portuguesa prevista no Tratado de Alcáçovas.
Vários acordos foram feitos para tentar solucionar as disputas entre os dois reinos ibéricos. Contudo, somente em 1494 celebrou-se um acordo definitivo: o Tratado de Tordesilhas.
Nele ficava estabelecida uma divisão de territórios entre portugueses e espanhóis.


O Tratado de Tordesilhas

O estabelecimento dos domínios no Atlântico gerou uma longa batalha diplomática entre Espanha e Portugal.
Pouco depois da volta de Colombo para a Europa, o papa expediu, em maio de 1493, a bula Inter Coetera, que reconhecia ao Reino de Castela o domínio sobre todas as terras que se encontrassem a oeste de um meridiano localizado a 100 léguas a oeste das ilhas de Açores e Cabo Verde.
Portugal, sentindo-se prejudicado, não aceitou a bula papal e exigiu uma negociação direta. O resultado foi o Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494, em que os reinos ibéricos estabeleceram uma divisão do mundo.
Segundo esse tratado, terras e mares encontrados ou por encontrar (desde que não pertencentes a nenhum rei cristão) seriam divididos entre Espanha e Portugal. O meridiano que passa a 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde foi tomado como linha divisória. As terras localizadas a leste pertenceriam a Portugal. As restantes seriam da Espanha.

4. Inglaterra, França e Holanda
Descontentes com a divisão do mundo entre Espanha e Portugal pelo Tratado de Tordesilhas, Inglaterra, França e Holanda não reconheceram o acordo e atuaram por diversos meios contra as colônias e os navios ibéricos. Um desses meios foi a pirataria. Mais tarde, iniciaram a conquista de áreas não colonizadas pelos espanhóis na América do Norte e nas Antilhas. E foram, aos poucos, tomando pela força terras já ocupadas pelos dois reinos ibéricos.

5. Navegações e mercado mundial
As Grandes Navegações deram ao comércio europeu um impulso extraordinário. Para se ter uma ideia desse crescimento, basta lembrar que, em sua viagem às Índias, Vasco da Gama trouxe de lá especiarias que renderam a Portugal um lucro de 6 000%.
Além de colocar no mercado europeu quantidades inusitadas de mercadorias, o novo comércio estabeleceu um intercâmbio sem precedentes entre os diversos continentes. O mundo todo começava a ser unificado pelo comércio.
Essas mudanças operaram uma verdadeira revolução nas relações internacionais, nos hábitos de consumo, nas mentalidades, na organização das sociedades europeias e não europeias. Além disso, consolidaram o poder absolutista dos reis e fizeram da burguesia o grande agente das transformações sociais. Esse processo ficaria conhecido mais tarde como revolução Comercial




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