sexta-feira, 23 de outubro de 2015

GOVERNO  DE  ERNESTO  GEISEL  
(1974-1979)

 Ernesto Geisel (pronuncia-se “Gaisel”) tomou posse no dia 15 de março de 1974. O novo presidente tinha um perfil muito diferente de seu antecessor. Era centralizador, tinha um estilo autoritário e fazia questão exercer pessoalmente o controle da administração. Havia adquirido grande experiência nos cargos públicos que ocupara nos governos militares anteriores, inclusive como presidente da Petrobrás. Geisel pertencia ao grupo castelista, e sua eleição significava o retorno ao poder da linha mais moderada entre os militares. Era de esperar que o regime adotasse o caminho da abertura política.

1. A abertura política

De fato, o novo presidente anunciou que pretendia avançar na direção de um regime democrático, mas iria fazê-lo aos poucos, segundo um processo que ficou conhecido pela expressão abertura lenta, gradual e segura. Na sua concepção, era preciso manter a linha-dura afastada do poder e, ao mesmo tempo, retardar o máximo possível o retorno da oposição ao governo.

Não ia ser uma tarefa fácil, pois a oposição estava se fortalecendo mais rapidamente do que Geisel imaginava e a linha-dura ainda ocupava importantes posições nos órgãos de repressão.

O primeiro teste para a política de abertura do presidente foram as eleições parlamentares de novembro de 1974, em que os candidatos oposicionistas obtiveram uma expressiva votação. Esse resultado foi mais flagrante no Senado, onde a oposição preencheu 16 das 22 vagas que estavam sendo disputadas. Um dos novos campeões de voto foi Orestes Quércia, ex-prefeito de Campinas, que, na disputa por uma vaga no Senado, derrotou o candidato do governo, o veterano Carvalho Pinto.

O crescimento da oposição era um evidente sinal de que o descontentamento com o regime militar estava aumentando. Isso vinha acontecendo justamente nos estados mais desenvolvidos e mais populosos, localizados no Sul-Sudeste, e nas maiores cidades. O reduto eleitoral do governo ia restringindo-se aos estados mais atrasados e às cidades menores. O beneficiado foi o MDB, que havia se convertido numa frente que reunia os diversos setores políticos da oposição.

Outro teste difícil para o processo de abertura política, que Geisel vinha conduzindo, deu-se quando o jornalista Vladimir Herzog, diretor de jornalismo da TV Cultura, apareceu morto nas dependências do DOI/Codi, vinculado ao II Exército, em São Paulo, no dia 25 de outubro de 1975 (Foto). As autoridades alegaram que ele cometera suicídio com o cinto do macacão, mas na verdade – e isso seria confirmado depois - ele havia sido morto durante uma sessão de tortura.




Poucos meses depois, no mesmo local, registrou-se a morte do operário José Manuel Fiel Filho. Novamente, a polícia divulgou a versão do suicídio. Ele teria se enforcado com a própria... meia! A repercussão internacional desses assassinatos foi muito grande, pois não havia mais como negar que no Brasil havia tortura e morte de prisioneiros políticos. Diante desses fatos, o presidente Geisel agiu com firmeza e determinou o afastamento do comandante do poderoso II Exército, sediado em São Paulo. A linha-dura havia sofrido uma derrota, mas ainda iria continuar dificultando o processo de abertura.

2. O “Pacote de Abril”

Nas eleições municipais de 1976, novamente os resultados apontaram para um forte crescimento do MDB. Se as coisas continuassem assim, chegaria o dia em que a oposição teria maioria no Congresso Nacional. Para evitar que isso acontecesse, o governo mudou as regras do jogo. Recorrendo aos poderes arbitrários que lhe dava o AI-5, Geisel decretou o fechamento do Congresso e promulgou, em abril de 1977, o chamado “Pacote de Abril”, que alterava a Constituição em vários pontos:

  • Um terço do Senado seria preenchido pelos “senadores biônicos”, isto é, senadores que passavam a ser eleitos, indiretamente, pelas Assembleias Legislativas estaduais, que podiam mais facilmente ser controladas pelo partido do governo.
  • Foi alterado o critério da proporcionalidade entre os estados quanto à representação na Câmara dos Deputados, aumentando-se a representação dos pequenos estados, justamente os mais atrasados, onde a ARENA era mais forte.
  • O mandato do presidente da República foi ampliado, passando de 5 para 6 anos.

Graças a esses artifícios - chamados de “casuísmos” -, nas eleições parlamentares de 1978, apesar de a oposição ter tido mais votos, o governo manteve a maioria do Congresso Nacional.

Nesse momento, o presidente Geisel deu um passo importante no processo de abertura. Fez aprovar no Congresso Nacional a emenda constitucional no. 11, que revogava o AI-5, e entrou em vigor em janeiro de 1979. A partir dessa data, o governo já não poderia decretar o fechamento do Congresso, nem cassar mandatos, nem suspender os direitos políticos dos cidadãos. O Habeas-Corpus foi restaurado em sua plenitude e a imprensa ficou livre dos controles da censura.

Eram passos importantes no rumo da democratização do regime. Mas o governo havia mantido as condições que lhe garantiam o controle da eleição do novo presidente, e não havia dúvida de que este seria um general.

3. A evolução econômica no governo Geisel

Ao iniciar-se o mandato de Geisel, o país começava a sofrer os primeiros efeitos da elevação dos preços internacionais do petróleo, que começara em outubro do ano anterior (1973). Para o Brasil, que importava 80 % do petróleo que consumia, foi um duro golpe. Bruscamente, a conta do petróleo importado duplicou.

O choque do petróleo A brusca elevação dos preços do petróleo, que ficou conhecido como o choque do petróleo, resultou de uma decisão OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo), de diminuir a produção de petróleo, provocando a elevação dos preços do produto. Os preços saltaram de US$ 1,50, o barril, em 1972, para US$ 3,50, em 1973, e para US$ 10,00, em 1974.

Esforço pela industrialização. Era hora de reduzir o ritmo de crescimento da economia, para diminuir as importações de petróleo. Mas em vez disso, o governo preferiu insistir no avanço da industrialização, levando o PIB a apresentar, entre 1974 e 1978, a uma taxa média anual de 6,7% de crescimento, uma taxa considerada alta.

Recorrendo a empréstimos externos, contando com recursos das empresas privadas (nacionais e estrangeiras) e principalmente das empresas estatais, lançou o II Plano Nacional de Desenvolvimento (O I PND fora lançado no governo anterior). O plano previa grandes investimentos, em vários setores básicos da economia. Os objetivos eram alcançar a autonomia na produção dos chamados bens de capital (máquinas e ferramentas) e de insumos básicos (tais como petróleo, fertilizante, alumínio, aço).

Esse enorme esforço para industrializar o país exigia igualmente um crescimento na produção de eletricidade, o que levou à construção da usina hidrelétrica de Ipaipu (PR) e ao início das obras das usinas nucleares, em Angra dos Reis (RJ). Alguns projetos de grande porte, entre eles a Ferrovia do Aço, resultaram em fracasso, após consumir muito dinheiro, em parte tomado emprestado no Exterior. Investimentos também foram feitos na produção de álcool para substituir a gasolina, visando a tornar o país menos dependente do petróleo importado.

Surgem problemas na economia. Havia, porém, alguns indicadores preocupantes. Um deles era o crescimento da inflação, que chegou a 40%, em 1978. O outro, e mais grave, era o extraordinário crescimento da dívida externa, que se devia a empréstimos novos, ao aumento da conta de petróleo importado e à elevação das taxas internacionais de juros. Era preciso fazer sempre mais dívidas, e assim o endividamento externo não parava de crescer, como uma bola de neve.

A substituição de importações não era mais um bom caminho (se é que em elbum  momento tenha sido). É interessante registrar que o antigo modelo de desenvolvimento por meio da substituição de importações estava sendo conduzido a um estágio mais adiantado do processo. Mas o que ficou claro é que por mais que o país avançasse por esse caminho - a substituição de importações -, ele sempre estaria caminhando atrás dos países mais avançados tecnologicamente. Por isso, o prolongamento do modelo teve como consequência inevitável a desatualização tecnológica da indústria brasileira.

Por quê? Porque o fechamento da economia, para proteger a indústria nacional da concorrência dos produtos estrangeiros, levava a uma constante acomodação do empresariado brasileiro, que não se sentia pressionado a investir no desenvolvimento tecnológico (e, portanto, no aumento da produtividade), para alcançar os países que estavam na frente.

4. O nascimento de um novo sindicalismo

O movimento sindical, que estivera amordaçado durante muitos anos, começou a ressurgir no final do governo Geisel. O crescimento da industrialização, puxado pela indústria automobilística, havia criado grandes concentrações de trabalhadores, em vários pontos do país, principalmente na Grande São Paulo.  Apenas a região do ABC reunia 125 mil operários. Essa concentração possibilitou o aparecimento, no final de 1978, de um novo sindicalismo, diferente daquele criado nos tempos do getulismo que se mantinha subordinado ao Ministério do Trabalho. O novo sindicalismo adotou uma postura independente e atuou com grande combatividade.

Com base em dados do DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sociais e Econômicos), que comprovavam a manipulação dos dados da inflação nos anos de 1973 e 1974, os sindicalistas iniciaram uma campanha para recuperar as perdas salariais. Essa campanha conduziu a grandes greves em 1978 e 1979, contando com a participação efetiva de milhares de trabalhadores. Os sindicalistas inauguraram um novo estilo de negociação entre patrões e empregados, marcando uma ruptura com o sindicalismo getulista, atrelado ao Ministério do Trabalho.

Essas lutas permitiram o aparecimento de novas lideranças sindicais, com destaque para a figura de Luís Inácio da Silva, o Lula, que era o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema.

5. A eleição do sucessor

No final de 1978, já se desenvolviam os preparativos para a eleição do novo presidente. Nos meios militares, surgiram os nomes de alguns pretendentes. O mais forte era o ministro da Guerra, o general Silvio Frota. Mas Geisel, demonstrando total controle da sucessão, conseguiu afastar Frota da disputa e obteve o apoio militar para o nome de sua preferência, o general João Baptista Figueiredo, que ficou sendo o candidato do governo, e, portanto da ARENA, tendo um civil como candidato a vice-presidente, o mineiro Aureliano Chaves.

O MDB também lançou seus candidatos, embora não tivessem nenhuma chance, pois a eleição continuava sendo feita de forma indireta. Eram eles: o general Euler Bentes Monteiro, para a presidência, e o senador gaúcho Paulo Brossard, para a vice-presidência. Como era previsível, Figueiredo foi formalmente eleito e tomou posse em março de 1979.


Nenhum comentário:

Postar um comentário