terça-feira, 2 de setembro de 2014

GETÚLIO VARGAS 


Nas memórias de infância de de um escritor



A  figura onipresente do ditador, leis trabalhistas, o Brasil na Segunda Guerra, reportagem sobre torturasa história do Brasil em um turbilhão de lembranças da infância do escritor Ivan Ângelo.

“– Trabalhadores do Brasil!”
Getúlio Vargas era apenas uma voz no rádio. Aquela saudação, com o “l” alongado do final, acompanhava-me desde antes de eu aprender a falar. Em casa, crescemos com ela. O sentido do que a voz dizia nos escapava, era coisa de adultos [...]. Trabalhadores do Brasil! E Getúlio mudou o dinheiro, um mil-réis valia um cruzeiro. O perfil de Getúlio na moeda de dez centavos. No nosso mundinho, um tostão, ou cem réis, valia um getulinho. Duzentos réis, o duzentão, dois getulinhos. No rádio, a música como ele queria: “Quem trabalha é que tem razão,/eu digo e não tenho medo de errar;/O bonde de São Januário/leva mais um operário/sou eu que vou trabalhar”.
A propaganda procurava mostrar Getulio como o "pai dos pobres".
Leis novas para o trabalhador e um lema se espalha: é o pai dos pobres. Trabalhadores do Brasil! O “Brasilllll” vai entrar na guerra. A cobra vai fumar (...). Nosso mundinho ampliava-se, e o Getúlio que era só voz ia ganhando cara e corpo nas revistas do barbeiro (baixinho gordinho de charuto entre os dedos nas caricaturas da revista Careta) e nos jornais entrevistos nas bancas, até que um dia apareceu na minha primeira matinê de cinema maravilha! no jornal da tela. A imagem mais marcante ficou sendo a da escola pública, foto oficial vista todo o dia, três anos seguidos. [...] Voltavam os soldados da guerra, ia-se embora o Getúlio. Ia mesmo? Trabalhadores do Brasil! “Queremos Getúlio! Queremos Getúlio!” gritavam eles nas ruas. Foi. O retrato oficial sumiu da parede da escola. Eleições [...] Os carrascos nazistas são julgados em Nuremberg horrores! e condenados à forca. “Falta alguém em Nuremberg”, acusa a reportagem em O Cruzeiro: horrores brasileiros sob a ditadura: testículos esmagados, afogamentos, espetos sob as unhas, arames em brasa na uretra, estupros. Uma paródia da marchinha de carnaval Pirata da perna de pau virou o maior sucesso: “Eu sou o Getúlio, já fui ditador,/com o voto dos trouxas/eu sou senador./Minha galera/em quinze anos de navegação/trouxe a miséria/o câmbio negro e a inflação”. 
Ângelo, Ivan. Lembranças de Getúlio.In: Caldeira, Jorge.
Brasil: a História contada por quem viu. São Paulo: Mameluco, 2008..


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